Capítulo 51.

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- Em uma guerra, Arthur, nunca aja compulsivamente.

Eu costumava achar o charuto de vovô fedido. Cheirava a uma erva repugnante. No entanto, inúmeras vezes em meus dezesseis anos, vindo até a casa dele, fez com que eu me acostumasse com o cheiro. Não era mais tão ruim assim. Suportável.

Gostava da sensação de sair de casa, de sentir o cheiro do charuto assim que eu pisava aqui. De ver vovô em sua poltrona, com o inseparável charuto e uísque. De ouvir seus ensinamentos, que misturavam a máfia e a vida. A importância do raciocínio; a necessidade de se deixar ser impulsivo, às vezes. A importância da insensibilidade...

O amor que devemos proteger como nossas vidas.

- O inimigo quer que estejamos putos da vida. Quer que sejamos filhos da puta descontrolados, que não querem nada além de ver balas rolando soltas. Americanos são deste jeito. Seu pai é deste jeito. Nunca reflita as ações dele para si. - o olhar dele se tornou distante.

Me perguntava para onde os conselhos de vovô haviam ido parar, na mente doentia de meu pai.

- O descontrole nos faz agir compulsivamente. Sem que pensemos em algo. A calma é nossa maior arma. Transmita controle. Tranquilidade. Parece fácil reproduzir, mas é um exercício interno. Você ainda irá se descontrolar em determinados momentos, Arthur... ainda mais quando uma pessoa que ama está em jogo. Sua avó precisou de anos para aquietar o rabo em uma cadeira e parar de querer se meter em situações perigosas, porque se preocupava comigo. - ele riu.

Riu e tossiu. Precisou de alguns segundos para se recobrar.

- Logo, viu que era mais fácil não se envolver. Ela era... sempre foi meu ponto fraco. Por isso, obtenha controle da situação. Analise o inimigo. Não transmita pressa ao iniciar uma guerra. Isso faz com que eles temam, justamente por nos verem com o controle sob o que pode acontecer. Uma dica? Tire-os do controle, de maneira cordial. É importante não agir de maneira impul...

- Cadê ela?

O prédio está cercado por homens de preto.

Não consigo olhar para o rosto de Billie. Faz-me ter vontade de baleá-lo.

Faz-me arrepender de não ter saído do carro com um fuzil na mão. Mirado em sua cabeça e o matado. Seria rápido. Embora quase tenha o feito, estou lutando contra instintos impulsivos. Outro deles, o de enfiar uma faca entre o sorrisinho que Billie abre. Já andei rápido demais até ele. Passos largos, que certamente transmitiram meu desespero.

Embora não esteja transmitindo pânico na expressão, e meu tom tenha soado sereno, parei próximo demais a ele, em um ato ameaçador.

Meu avô não se orgulharia.

- Ramos... então de fato veio?

- Cadê... - aperto os dentes. Para conter a impaciência. -.. ela. - estou maquinando. O pânico projeta em minha cabeça outra dezena de cenas. Torço a cabeça de Billie, até quase arrancá-la. Atravesso a porta, matando quem quer que apareça em minha frente. Não paro de subir as escadas, até vê-la em minha frente... volto apenas para matá-lo de vez.

- Se soubesse que sua garota seria tão prestativa, teria a sequestrado muito antes. Não pensei nesta parte. - estou a um passo de separar seus órgãos no chão. Estou esperando que diga o que de fato quer. Se não a matou até agora, há um motivo. No entanto, não perguntarei. Transmitirá mais desespero ainda. Nunca tive um ponto fraco. Nunca, em anos de máfia. E agora, ele acaba de descobrir o que me desestabiliza.

Ela. Mio dolce. Fixo o olhar na porta atrás de Billie. Ele capta meu blefe. Ergue um rádio comunicador. Sorri levemente, e seu dedão pressiona um botão antes que pronuncie:

- Jules, pode me dizer onde está a loirinha?

Meu corpo enrijece.

- Claro, chefe. Está aqui com a gente. Bonitinha. Mas devo dizer que é extremamente desobediente. Já ameaçamos até mesmo cortar o cabelo dela, mas ela não se aquieta. Já tentou cortar a corda, cuspiu em nosso pé e nos mandou ir se foder. Mal sabe ela que quase estamos fazendo isso, mas ela irá fazer um boa parte da nossa foda...

- Mande-a falar com o parzinho dela.

A transmissão é entrecortada por movimentos. Vozes abafadas, e por fim uma respiração que sei que é a dela... não sei como, mas sei. Meu peito se aperta.

- Crusher? - meu coração se parte. Nunca vou me perdoar. Nunca. - Crusher, não entra aqui! Por favor, eles... - a voz dela é cortada por um baque, e nunca fiz tanta força em minha vida. Nunca fiz tanto esforço para suportar a onda de fúria que inunda meu corpo. Nunca fiz tanta força para não arrancar os órgãos de alguém.

- Sabe que não quero dinheiro, não sabe, Ramos? Isso já possuo. - ele ri, abafado. - O que quero é muito maior, mas não acredito que vá abrir mão disto apenas por uma putinha como a que amarramos lá dentro. - meu olhar se fixa em seu pescoço. Quero enforcá-lo. - O quê? Está preocupado com ela? Fique tranquilo, não fizemos nada... ruim com ela. Não no sentido de machucar, ao menos. Ou talvez tenha machucado um pouquinho, quem sabe? - ele abre um sorriso nojento. Entreolha os homens que cercam a porta. Eles soltam risos.

É um desprazer pensar em crueldades semelhantes as que meus pai fez em suas sessões de fotos. É um prazer ver cada um deles desviando o olhar, temendo o olhar psicopatio que não consigo evitar ao encarar cada um.

Billie desfaz o sorriso.

- O que quero é sua máfia. Sua máfia inteirinha. Não somente dinheiro, mas todos os títulos que ela guarda... acredito que por seu pai ter matado o meu, eu tenha direito a ter um pedaço do que ele destruiu à anos atrás: nossa honra. Nosso legado. Jogou tudo isto fora apenas porque sua mamãe não conseguiu manter as pernas fechadas e deu para os outros.

O nó em minha garganta impede-me de engolir seco. Tento concentrar-me.

- Nunca vai superar? - baixo o tom de voz.

- O quê? - Billie franze o cenho.

Medicine | Volsher.Onde histórias criam vida. Descubra agora