Capítulo 19.

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Victor entra ao escritório, a expressão cansada. Deixa um bolo de papéis acima da mesa.

- Já estou dispensado? Não aguento mais saber quem é Craid e o legado da máfia de Nicolau. Se é que eles são líderes mesmo, até esqueci. - ele se apoia na ponta da mesa.

Analisa o quadro que estou montando. As pequenas fotos que fixo, os barbantes indicando as ligações. Parece procurar palavras.

- Seu pai... ele... ele tinha algum prazer por matar pessoas de maneira tão... cruel? Estou acostumado a ver tiros em testas ou cortes profundos, mas... não crânios esmagados ou mortes tão trágicas desse jeito. Parece que se satisfazia ao inventar cada maneira com que mataria todas estas pessoas. Fico me perguntando se realmente somos os inocentes da história, porque... talvez haja muita gente querendo acabar com a nossa raça, porque acabamos com as deles, sem motivo nenhum.

- Não acabamos com as deles. Meu pai acabou.

- Mas é claro que não vão saber diferenciar. Devem te achar o segundo Frederic da história. E se você realmente for e pendurar mãos em prendedores quando for matar alguém, eu mesmo lhe coloco em um manicômio. - ele murmura. - Mas todos estamos pagando pelos erros dele. Será que tinham medo dele o suficiente para terem esperado que morressem e buscassem vingança? - provavelmente, sim.

Meu pai era... muitas coisas, mas piedoso não estava entre elas. Meus avós reprovavam suas atitudes. Não sabiam de onde havia vindo tamanha crueldade. Sua criação fora como a de qualquer homem dentro da máfia. Talvez seu poder houvesse subido à cabeça. O suficiente para carregar a cabeça da mulher que gerou seu filho nas mãos.

- Está dispensado, se é o que quer saber.

Victor se afasta da mesa.

- Valeu. Ah, e você está ciente de que, se souberem que vai ao cassino, está correndo risco, não está? Dependendo da situação, pode virar alvo.

- Sei.

- Certo. Bárbara virá aqui hoje, espero que não se importe.

Perco o ar.

- E Carolina?

Victor se vira.

- Ela não. Bárbara me disse que ela não quer mais trazer perturbações a nós. O que me fez perguntar a ela que tipo de perturbação ela andou recebendo, mas nem Babi soube me dizer.

O canivete ainda é uma opção. Poderia rasgar meus órgãos com ele. Quem sabe a boca. Assim, não correria o risco de que lhe dissesse mais atrocidades. A fizesse chorar outra vez.

Mas, a princípio, nem incomodado eu deveria estar. Volto minha atenção ao quadro. Inúmeras fotos e suas ligações com as informações, que descobrimos no dia anterior. É com isto que devo me preocupar. Tempo depois da saída de Victor ao escritório, ouço uma movimentação na entrada. Aproximo-me da janela, vendo Bárbara sair do carro.

Sozinha. Meu peito se comprime. Pingos de chuva batem contra o vidro. Ela de fato não veio. Não veio por minha causa. Pelo que disse a ela. A maneira como me afastei, como se fosse nojenta.

Sinto nojo de mim mesmo. Algo afiado rasga meu peito.

Meus olhos pousam no sofá à minha frente, onde Carolina estava debruçada a tempos atrás. Como lia como um anjo. Adormecia como um, bem como sorria como outro. Meus avós ensinaram-me a assumir erros. A importância de corrigi-los, se possível. No entanto, nunca assumi-lo a outros. Apenas a mim mesmo. A responsabilidade por corrigi-los seria minha, bem como a consciência de que os cometi.

E talvez, eu tenha consciência de que fui repulsivo. De que a magoei. Foi só o que pensei o dia todo.

Sem pensar, estou deixando as coisas acima mesa. Estou andando. Estou na entrada, e falando com Jonas outra vez. Pingos de chuva batem contra meu rosto. Ele estaciona o carro, o freando lentamente. Já sabe para onde quero ir, portanto, não chega a me questionar. O caminho até seu apartamento é lento. Desta vez, estou ciente. Não sei o que direi. Certamente, desculpas, mas não peço desculpas. Ao menos, não pedia. Não peço a muito tempo.

Guardo meus erros dentro de mim. Mas meu erro custou suas lágrimas. As lágrimas de Carolina. E minha reação a isto, ao que parece, me corrói.

O erro que cometi a ela... não posso guardar este.

Medicine | Volsher.Onde histórias criam vida. Descubra agora