Estamos do lado de fora do restaurante. Terminamos de comer em silêncio. Carolina vai me dizer algo, até que um ruído agudo interrompe o lado de fora.
Olho para trás de uma lixeira, a origem do som. Carolina ainda está tentando identificar de onde o ruído veio enquanto chego perto. Observo por trás do latão. Há uma criatura preta se remexendo abaixo dela. Inclino a lixeira. Assim que sai, trêmula, com pequenas e magras patas cambaleando, identifico-o como a cria de um gato. O pego em uma mão. Carolina ofega.
- Ah meu Deus! É um gatinho abandonado... ele estava debaixo da lata de lixo? - sua voz se torna chorosa. - Ah, meu Deus... está todo machucadinho... deve ter ido procurar comida e alguém não o viu quando foi mexer na lixeira, então acabou o esmagando... - ela chega perto do animal. Está lambendo minha mão, uma língua minúscula melando meu dedo. Seu pelo encontra-se imundo. Sujo e mal cheiroso. Seu corpo, coberto de cortes abertos. Está molhado, ainda por cima. O que piora. Um de seus olhos está machucado. Sua pele treme, e ele ergue o focinho para tentar me cheirar. - Tadinho, como alguém poderia ter tão pouco coração ao deixar uma coisinha inofensiva dessas na rua? Só por que é preto? Dizem que trazem azar.
Ela usa o dedo indicador para acariciá-lo. Sua cabeça cai, recebendo a carícia de olhos fechados. A criatura ronrona.
- Algumas culturas o consideram sagrados. Como uma turmalina.
Carolina volta os olhos para mim. Curiosa.
- Uma turmalina?
- Uma pedra. É preta. Usada para equilibrar energias, afastar negatividades, embora seja escura e assemelhada a coisas ruins. Em algumas culturas, o gato preto é visto como um animal sagrado. Como uma proteção contra energias negativas, sombrias. É como se guardasse em si vibrações ruins, mas as dissolvesse. As purificasse. - a criatura mordisca o dedo dela. Lambe o meu, e então volta a morder o dela. Carolina está me observando de olhos brilhantes, quase encantados.
- Que lindo. Eu nunca tinha escutado isso antes. - diz. Ela olha para o animal. O coloco no chão outra vez. No entanto, o animal retorna. Sobe em meu tênis, seu miado baixo direcionado a mim. Seus olhos machucados me suplicam. Carolina o pega nas mãos. - Ai, meu Deus... ele não pode ficar aqui, Crusher. Eu sinto muito por eu ser tão mole assim, mas ele está tão machucadinho... será que não tem como a gente levar ele para um centro de adoção ou coisa assim? - não conheço centro algum, em Los Angeles. - Eu até podia levar ele, mas... além de não ter casa, eu não tenho tempo de cuidar dele. Seria uma dona irresponsável. - diz, seus olhos tristes. O gato se encolhe em suas mãos.
- Não existem centros de adoção em Los Angeles. E gatos conseguem se virar nas ruas. - pronuncio. Ela olha para ele, piscando por cima dos olhos tristes. Começa a se agachar. E então deixa o animal no chão. O gatinho tenta saltar para ela outra vez, mas Carolina se levanta. Ele tenta ficar acima de suas botas, mas ela volta a se agachar. - Ei, gatinho. Você vai encontrar alguém de bom coração para ficar com você, tudo bem? Vai encontrar alguém como nós, mas que realmente vai estar disposto a ficar com você. - diz.
O gatinho ainda tenta lutar. Gruda no sapato de Carolina. Quando ela tenta o afastar, ele volta ao meu. Recolho o pacote da mão dela. Retiro um sushi. O deixo no chão. O gatinho vai até o alimento, sua boca pequena o mastigando. Andamos até o carro. Jonas ainda está no mesmo lugar. Entramos, e quando o carro passa pela calçada outra vez, o gato ainda está lá. Sentado, seus olhos pequenos machucados esperando Carolina. Sinto algo dolorido fincar meu peito.
- Meu coração está doendo. - ela suspira. - Jonas, você não aceitaria um gatinho?
Jonas sorri, tristonho.
- Eu tenho um pitbull em casa. Ele provavelmente infernizaria a vida de um gato. É filho único, sabe. Mimado e tudo o mais. - diz, fazendo Carolina sorrir, sem-graça.
- Bom, uma pena. Se parássemos para pegar todos os animaizinhos que nem ele na rua, já teríamos uns dez mil em casa, né.
- Pois é. - conrcorda Jonas.
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Medicine | Volsher.
Romance"Ela não é uma droga. É minha medicina. Drogas te fazem esquecer dos seus problemas, mas medicina... cura. Ela me cura. Mas sem esquecer do que eu vivi."