Pov: Monara
Cansaço, areia e mar. É o que eu tenho na memória de Maressa, tão perfeita, agora olho pelos olhos dela uma memória do que um dia ela viveu. Não de um ponto de vista ou vista de fora, em sua memória, sou ela, vejo o mundo pelos olhos dela, sinto o mundo pela pele dela.
Na memória, estou sentada na areia quente e fina de uma ilha pequena, minúscula, com meus joelhos contra o peito e fraca, muito fraca de fome. O céu é claro e as águas são tão transparentes que é como se não houvesse cor azul no mar. Consigo contar as conchas a metros dali. Por isso, quando ela aparece, a enxergo mesmo sem que ela se erga para fora.
Nirvana coloca a cabeça pra fora, abre a boca surpresa e mergulha no mar. Estou tão cansada que nem mesmo consigo ir atrás, nem mesmo seu rosto captei, a memória de Maressa só sabe que não é Anis. A memória de Maressa, não se importa com quer que apareça.
Quando ela volta, corre, com um imenso peixe numa mão e um polvo que se agarra em seu braço noutro. Nirvana se ajoelha na minha frente, me encara e corta o peixe pra me oferecer, mas eu não quero, não quero conversar, não estou curiosa e mesmo com fome não quero comer. Eu só desejo ficar parada, imóvel, até desaparecer.
Nirvana suspirou. Ela não era muito alta, se parecia mais comigo, Monara, do que com Maressa. Seu rosto era oval, seus olhos grandes e castanhos, seus cabelos longos e ondulados... Como seu nome, me lembra as mulheres indianas.
—Não pode morrer, irmã. Temos um encontro.
Desejei ter forças para quebrar aquele belo rosto à minha frente. Ela parecia uma maluca com seus peixes e polvos. A memória é tão perfeita que leio os pensamentos daquela Maressa.
—Já sou casada. — Disse. Ela disse, eu digo.
—Não... — Nirvana sorriu — Um encontro de irmãs. Na virada do próximo século, na ilha em frente a Oki. Vou reunir todas as nossas irmãs de mar para conversarmos, você não quer perder, quer?
—Você é maluca?
Nirvana riu e distraída, se sentou na minha frente, menor pelo declive da água, teve a piedade de matar o polvo e o comeu. Meu estômago doía.
Maressa disse que não controlava sua Pérola a usou naquele dia mesmo com pouca Energia. O rosto de Nirvana se aproximou do meu e mais e mais e então mergulhei em suas memórias. Primeiro vi o mar em que ela nadou e a última sereia que ela conversou. Assíria. Ela disse que estaria lá.
—O que está fazendo? — Mesmo em sua memória, fui capaz de ouvir a voz de Nirvana.
Como num filme, a memória passou pra frente, vi de novo ela nadando, pegando os peixes e voltei pra vida real, com seu rosto se afastando do meu.
O raciocínio foi simples. Se alguém como Assíria topou aquela loucura, eu precisava escutar a mulher à minha frente.
—Vai comer? — Ela ofereceu o polvo.
—Que coisa é essa de encontro? Sereias não tem povo nem reuniões.
—É e isso é triste pra caramba. É isso o que eu quero mudar, disso que vou falar na virada do próximo século.
—Quer fazer cidades debaixo da água?
—Eu só não quero mais ver isso de novo. — Nirvana mastigava o polvo como chiclete.
—Ver o que?
—Uma irmã tão triste que não sente mais prazer nem mesmo na água.
Me perguntei como ela sabia disso.
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O Retorno das Alfas
FantasíaHeli foi infectada, Anis foi liberta e o relacionamento entre Heli e Monara parece ter desmoranado enquanto o destino de Heli e Anis parece cada vez mais próximo. No último livro da trilogia, segredos serão revelados e a guerra que parecia ser apena...