*Capítulo 74*

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Júlia

Júlia: Eu ainda não sei o porquê vocês continuam assistindo isso. - Falei apontando pra TV que estava no jornal noticiando toda a invasão que fizeram no morro do Alemão.

Minha mãe, minhas tias, Amanda, Bianca, Tio KL e o Caio estavam sentados no sofá desde cedo, quando começou a invasão. Tá tudo passando em todos os jornais, em todo o momento passa alguma coisa na televisão noticiando o que tá acontecendo e eu sinceramente não sei porque eles estão fazendo isso.

Quando meu pai saia pra uma guerra, eu preferia ficar o mais longe possível de qualquer televisão ou alguma coisa que pudesse me mostrar o que realmente tava acontecendo. Preferia fingir que era um dia normal, no trabalho normal do meu pai e que logo ele voltaria pra casa pra vivermos nossa vida normal. Era uma válvula de escape, uma coisa que eu criei na minha cabeça pra controlar minha ansiedade e o medo de perder meu pai.

Mas no fundo eu sabia que "normal" era uma coisa que nunca coube a nossa família.

KL: Pra saber de primeira mão o que tá acontecendo, pô.

Júlia: É, mas vocês estão nisso desde manhã e só conseguem ficar com medo cada vez mais. É melhor não assistir.

Ninguém me deu ouvidos e eu revirei os olhos. Fui até a bancada da cozinha e comecei a fazer alguma besteira pra eu comer enquanto ainda escutava o jornal.

"Os helicópteros estão rondando o complexo do Alemão atrás dos criminosos que estão em uma fuga intensa e agora a pouco, nos foi avisado que teve troca de tiros com a polícia. O BOPE já foi acionado e está subindo a favela atrás dos bandidos. A suspeita é de que, os criminosos do Vidigal invadiram o Alemão em busca do comandante do morro, conhecido como Barão. O suspeito de armar toda essa operação é conhecido como VH do Vidigal, ele era filho do ex comandante Matheus, vulgo MT, que foi morto a tiros a alguns meses atrás pelo Barão. Tivemos a confirmação de que os bandidos estão em busca de vingança e por isso, querem matar o comandante do Alemão. Já nos chegou a confirmação de que os bandidos do Vidigal já estão com o Barão, e até o momento não sabemos ao certo seu paradeiro ou o que vai acontecer com ele."

Não consegui evitar olhar pra televisão, e bem na hora que eu olhei, apareceu a foto do Henrique. Respirei fundo já sabendo o que aquilo significava: o Henrique já tá marcado pelos policiais, e agora, depois de tanto tempo, ele pode finalmente dizer que tem uma ficha criminal.

"O comparsa do VH é um cara chamado Henrique, conhecido como RK que também é do Vidigal. O criminoso é suspeito de homicídio qualificado, tráfico de drogas e assalto a mão armada. Esse cara entrou pra lista da polícia agora, não se sabe ao certo quanto tempo ele ficou fora do radar da polícia."

Lorena: Aí meu Deus! - Ela tapou os olhos e balançou a cabeça negando. Minha mãe a abraçou e a consolou.

A Lorena ainda tava toda machucada e reclamava de dor em qualquer movimento que fazia. Mas, mesmo assim ela ainda optou por ver o noticiário, e isso sinceramente não entra na minha cabeça.

Mirella: Uma hora isso ia acontecer, Lorena. Não tem como ficar nessa vida e viver longe do rastro da polícia.

Lorena; Ele queria sair... - Ouvi a voz chorosa dela e senti meu coração apertar. Não aceitei ficar mais um segundo sequer naquela sala e subi as escadas correndo até o quarto aonde eu tava ficando.

Quando cheguei no quarto, fechei a porta e a tranquei. Me joguei em cima daquela cama e fiquei olhando pro teto. Eu não ia chorar. Eu me recusava a chorar. Depois de tudo que eu passei, eu não aguento mais me sentir triste e impotente, não consigo mais passar horas e horas chorando por coisas que fogem do meu controle.

Mas eu não consegui, de novo. De novo eu comecei a chorar, a minha vontade era a de gritar pro mundo inteiro me ouvir e conseguir sentir o que eu tava sentindo. No fundo, eu tava com medo. Medo de perder os dois homens que sobraram na minha vida igual eu perdi meu pai.

Tava chorando também pelo meu pai. Porque, mesmo que o Victor e o Henrique matassem e vingassem o meu pai, isso não ia trazer ele de volta pra mim. Não ia amenizar a saudade que eu sinto todos os dias e definitivamente não ia me dar sensação de justiça.

...

Por Nós [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora