Não sei quanto tempo fiquei ali esquecida, mas a cada barulho do outro lado da porta me encolhia temendo que entrassem e me fizessem algum mal. Até mesmo o silêncio ali dentro era torturante, mas agora uma moça que pelos sons que emitia deveria ter algum tipo de problema na fala, veio me auxiliar. Ela me ajudou com a higiene e alimentação, penteou meu cabelo entoando uma melodia triste em forma de lamuria enquanto eu chorava silenciosamente a espera de um milagre.
— Terminou aqui? — Perguntou uma voz feminina desconhecida. — Tudo bem, vá até a ala nove, tem uma garota sangrando. Aqueles imbecis não têm limites.
Eu não queria entender o que ela disse para a outra, mas infelizmente criei uma história de terror em minha cabeça, e apavorada, apenas consegui chorar...
— Beba isso, te fará dormir, e vai por mim, é melhor assim.
— Moça, por favor, me ajuda — arrisquei a pedir, mas foi em vão, ela não me respondeu, e mais uma vez fui deixada naquele quarto abafado aonde ecos do sofrimento pareciam atravessar paredes.
Aquela rotina perdurou por pelo menos dois dias. A mesma garota me ajudava a tomar banho, alimentar e depois sumia me deixando sozinha naquele lugar sombrio aonde gritos de garotas ecoavam a noite pelos corredores, pedido de socorro, e gemidos grotescos de homens que transitavam por ali no turno da madrugada. Eu chorava em desespero temendo ser a próxima vítima, mas por algum motivo passavam reto pela minha porta, só ouvia as vozes indo e vindo enquanto ficava fechada na solidão da minha cela mofada.
— Moça acorda! — Fui sacudida por mãos vacilantes. —Acorda logo!
— Por favor, não me machuque — murmurei apavorada.
— Não chora, eu não queria te assustar — o garoto passou a mão pelo meu rosto, me fazendo encolher. — Sou o Nil, eu não machuco as meninas.
— Me deixe ir embora, por favor! — Implorei aos prantos.
— Você não pode ir embora, vai ser minha agora.
— Sua? — Perguntei ainda encolhida no canto da parede sobre a cama. — Eu nem te conheço.
— Eu sou o Nil, você é meu presente de aniversário — sussurrou animado.
Não entendia sobre o assunto, mas seu comportamento infantil era evidente, o que me fez entender que estava diante de um rapaz com algum tipo de atraso mental...
— Eu quero ir para minha casa — falei entre soluços.
— Agora aqui é a sua casa, eu queria que ficasse feliz, mas está triste e não quero que fique triste.
— Eu já tenho um namorado, e ele deve estar preocupado comigo.
— Mas se não for a minha namorada, vão te levar para longe, não entende? — Insistiu contrariado. — Eu tinha a Sheila e ela era boazinha, mas sumiram com ela.
— Sumiram para onde?
— Ela chorava, meu irmão batia nela e fazia ela fazer coisas ruins para ele.
— Que tipo de coisas ruins? — Perguntei tentando não me apavorar em vão.
De todas as aflições que passei na vida, nada era mais agonizante do que imaginar o tipo de tortura que poderiam me submeter naquele lugar sombrio.
— Fica calma, eu sou bonzinho. Minha Sheila foi embora, mas você não vai.
— Mas eu não quero ficar aqui! Não posso, eu quero meu irmão! — Repetia agoniada enquanto as lágrimas molhavam meu rosto.
— Não chora eu não fiz nada — ele pedia me chaqualhando pelos ombros. — Para de chorar!
O garoto se apavorou comigo e saiu do quarto fechando a porta. Não consegui me controlar, estava muito assustada, e quando me acalmei novamente, fui engolida por aquele silêncio que ao invés de transmitir paz, transmitia era medo...
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Pela Força do Destino - A Magia do Olhar
RomanceMinha vida mudou radicalmente nos últimos anos, e digo com propriedade que quando vivia no escuro as coisas pareciam ser bem mais fáceis. Já parou para pensar em como seria complicado fechar os olhos e tentar se movimentar em um local estranho e che...