22. Cilada

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 Eu subi a escada e esqueci de perguntar qual era o quarto dela. Não queria interromper a conversa dos dois, então continuei a subir. Eu iria ter que sortear uma porta e entrar.
 Dei de cara com um corredor e quatro portas. Uma tinha que ser o quarto dela. Uma das portas eu já sabia que era o banheiro, pois eu já tinha passado por uma situação um tanto constrangedora e difícil de esquecer. Então restavam três.
 Bati na primeira porta e ninguém respondeu. Ela podia estar concentrada no livro e não escutar; bati de novo e não respondeu. Abri a porta devagar, era o quarto da Veronika, pois estava vazio e com uma cama de solteiro.
 Pensei que como Kate só tinha duas filhas, o quarto dela seria no meio do quarto das filhas. Mas isso era só uma hipótese. Eu não tinha nem o óbvio para apostar, então apostei na sorte. Bati naquele mesmo, ninguém respondeu, eu bati de novo, escutei alguém se mexendo em cima da cama. Pensei que ela soubesse que era eu atrás da porta e não respondesse de propósito. Mas isso também era uma hipótese. Apostei na sorte de novo e abri a porta. Era o quarto de Kate, estava muito escuro, mas eu conseguia enxergar ela dormindo na cama, por sorte ela tinha o sono pesado, essa foi a única vez que a sorte me favoreceu até àquela hora. Fechei devagar, torcendo pra não abusar da sorte.
Agora só restava uma porta, então bati nela com pressa, afim de não perder mais tempo.
— Entre — ela disse. Eu entrei antes que ela perguntasse quem era. Ela estava sentada na cama, lendo um livro. — James?! — ela suspirou. — Você não vai desistir não é?
— Desistir da sua amizade? Espere sentada.
— Por que está aqui?
— Você disse para eu entrar... Então entrei.
— Fala logo o que tem para dizer, James.
— Tudo bem, mas você vai pensar que sou louco.
— Você no meu quarto essas horas? Não vou pensar, imagine...
Eu não tinha pensado em nada tão suasivo pra dizer a ela, tudo isso podia ter sido em vão se eu não fosse convincente.
— Eu preciso que você confie em mim.
— Confiar?
— Preciso te levar a um lugar.
— James, já é quase meia noite!
— Preciso te mostrar uma coisa, é importante.
— James, nada que você me diga ou mostre agora vai fazer eu mudar de idéia. Por favor, não torne tudo mais complicado, vai ser melhor pra nós dois.

— Me diga como isso pode ser melhor pra mim! Nem sei ao certo o que mais posso perder.
— Não quero te envolver em problemas meus, James. Pode parecer mentira, mas não é pensando só em mim que eu decidi me afastar.
— Problemas? Você percebe como você se refere ao seu namorado?
— Por favor, James. É melhor você ir embora.
— Não. Eu não vou embora enquanto você não for comigo.
— Eu não vou a lugar algum! Por favor, entenda que eu só quero um tempo pra nós dois.
— Tempo? Eu não consigo entender você. Estávamos bem, não estávamos? Tínhamos uma amizade bonita, isso estava fazendo bem pra nós dois, por que acabar com tudo agora?
—  Você mentiu pra mim! 
— Desculpe, Dakota! Quantas vezes vou precisar me desculpar?  Você nunca mentiu na vida? Vai dizer que é perfeita? Nunca mentiu nem como proteção?
Ela não sabia o que dizer.
— Eu sei que eu devia aceitar quando você disse que não queria mais me ver. Talvez fosse melhor eu desistir.
— Sim... — ela disse, de cabeça baixa.
— Eu só te peço a última coisa...
— Não, James... Vai embora, por favor.
— Dakota, eu é que te peço por favor... Só isso que eu te peço, mais nada; por favor, me deixa te mostrar.
— Não estou entendendo aonde você quer chegar.
— Por favor, depois se você quiser, não precisa nunca mais olhar pra mim, e eu prometo nunca mais te importunar.
Ela pareceu pensativa.
— É importante, por favor.
— Sei que vou me arrepender disso, mas ok... Vai descendo, só vou trocar de roupa.
 Sai do quarto e parei na escada, para a Dakota me alcançar antes que eu estivesse na sala.
 Roy e Veronika estavam se beijando.
— Isso aí, garoto — eu disse baixinho.
— O que disse? — Dakota já estava ao meu lado, descendo a escada também.
— Nada, estava pensando alto.
— Pode me dizer aonde vamos?
— Chegando você vai saber.
— Não diga... — Ela olhou para o sofá e viu Roy e Veronika abraçados. — Minha irmã e o Roy estão...
— Sim, estão — eu respondi antes dela terminar a pergunta.
— Bom, então não quero atrapalhar.
 Saímos da casa sem que os dois percebessem; a noite era fria, pelo o tremor de Dakota, percebi que a blusa que ela pegara era fina demais. Entramos em meu carro, liguei o ar quente para aquecê-la.
 A Music Time era na estrada, ao km 7. Não conversamos na ida, Dakota estava quieta demais e eu fiquei com receio de dizer algo e ela desistisse de ir.
Chegamos, na frente do local tinha algumas pessoas entrando ainda.
— Uma balada? — perguntou, descendo do carro.
— Você vai entender.
— Não quer que eu entre, né?
— Confia em mim.
Ela continuou parada. Peguei em sua mão, na intenção de puxá-la.
— Por favor — pedi olhando em seus olhos.
Ela pestanejou. Por algum motivo, ela confiou.
Não precisamos pegar fila; haviam poucas pessoas entrando, a maioria já estavam lá dentro. O local  era grande e estava lotado, Dakota não entendia nada, mas continuava comigo. Havia muitas pessoas bêbadas, então a abracei para que alguns meninos alterados não pensassem que ela estava sozinha, ela olhou desconfiada para mim.
— É só para ninguém mexer com você — expliquei. Levei-a até uma mesa. Olhei ao redor da balada e não conseguia avistar Alex, torci para que Ben não estivesse errado, ou melhor, torci para que eu não tivesse entendido errado o que Ben quis dizer.
— Vou buscar algo pra você beber — eu disse, afinal, precisava distraí-la até Alex aparecer. — Não demoro. 
— Não estou com sede — ela disse. Fingi não ter escutado, e fui até o bar.
 Chegando no balcão onde serviam as bebidas, havia uma garota cheia de tatuagens e piercings pelo corpo, pedi um coquetel sem álcool.
Enquanto preparava a bebida, me encarou dos pés a cabeça, sem dizer nada. Franzi o cenho, mas peguei a bebida calado, e entrei no meio das pessoas para voltar à mesa.Todos dançavam sem parar, soadas e pulando, algumas caindo em cima de mim. Avistei um pouco de longe um garoto beijando uma garota loira, parecia o Alex, mas eu não tinha certeza. Tentei chegar mais perto, e fiquei olhando parado no meio da multidão, eles pararam o beijo e eu pude ver o rosto, era ele.
Até eu chegar à mesa que Dakota estava, iria demorar um pouco. Então tentei ir pelos cantos, para eu chegar mais rápido. Uma garota me cutucou por trás e disse algo que não entendi.
— O que disse? — perguntei.
Ela tentou dizer novamente, mas eu não escutava o que ela dizia, a música era alta e havia muitas pessoas falando no local. Tentei me concentrar só nela.
— A garota que estava com você... Um garoto puxou ela de lá!
— Dakota! — gritei. Andei disparado para a multidão de pessoas.
— Espera! — ela gritou pra mim. Eu parei e me virei para ouvir o que ela iria dizer.
— Ele levou ela para o estacionamento!
— Qual deles?
— Vem, eu te levo! — ela me puxou.
Chegando, não havia muitas pessoas. Olhei a todo o redor e não avistava Dakota, nem Alex.
— Eles foram por aqui. — Ela começou a me levar para o meio dos carros.
— Eles não estão aqui — eu disse.
— Mas nós estamos — ela disse. Me pegou pela blusa e me jogou contra a lateral de um carro.
— Está louca? — perguntei assustado.
— Por você — ela disse com uma voz maliciosa e me beijou fervorosamente.
— O que esta fazendo? — eu disse parando o beijo.
— Te beijando — ela disse sorrindo. Ignorei a ironia.
— Me dê licença; não quero te machucar. — Eu tentei sair sem machucá-la, mas ela não estava a fim de parar. Ela me puxou de volta com força.
— Não vou deixar você sair.
— Ah, vai sim — eu disse, a peguei pelos braços e tirei do meu caminho, a colocando onde eu estava, contra o carro. Mas ela pegou o meu rosto com as duas mãos e me beijou a força de novo.
— Eu disse que ele não valia nada — disse uma voz masculina atrás de mim.
Eu parei o beijo rapidamente; soltei seus braços, que eu ainda segurava. Olhei para trás e vi Dakota ao lado de Alex. Fiquei sem reação.
— Provavelmente ele queria fazer o mesmo com você — ele disse olhando para a Dakota. O olhar dela era de desprezo e decepção.
— Seu maluco! — A garota disse me empurrando e saindo de lá.
— Ela me beijou a força! — tentei explicar. 
— Essa menina não tem forças para fazer isso; olhe o seu tamanho rapaz! — disse Alex.
— Eu apenas não quis machucá-la.
— Pelo o que parece; você que a beijou a força. Quem esta contra o carro é ela e não você.
 Eu estava nervoso, eu acabara de perder todas as minhas chances com Dakota. Alex dizia em seu pensamento que aquilo saiu melhor que a encomenda.
Foi ele quem planejou aquilo tudo.
— Dakota, você não vê? Isso tudo é armação — eu dizia em desespero. Ela estava muda, mas o seu olhar me entristecia.
— Você não tem vergonha de beijar uma garota à força? — Alex me provocava.
— Você me enoja — eu disse franzindo o cenho.
— Vamos, Dakota. Você já viu quem ele é.
— E você, Alex? O que fazia numa balada? — perguntei.
— Vim buscar um amigo que estava passando mal, então me deparei com a minha namorada sozinha numa mesa.
Ele tinha todas as respostas na ponta da língua, era um ótimo mentiroso.
— Eu podia te dar uma surra por trazer minha namorada num lugar desses, por sorte achei ela antes que tentasse embebedá-la.
— O que? Não! Eu não ia te embebedar, Dakota!
— Eu disse para você não confiar em estranhos, Dakota. Agora você pode ver como eu sempre tive razão. Seu amiguinho ai é um canalha que pega as meninas à força, e sabe lá o que faz depois — Alex dizia com uma certa zombaria cruel.
— Sabe que eu não sou assim, Dakota.
— Não sei mais nada, James — ela me corrigiu com o mesmo olhar desprezado. — E eu não tenho mais nada para fazer aqui.
 Eles saíram de lá, e eu me debrucei no carro.
 O que mais eu tinha para fazer naquele lugar, se o jogo tinha virado contra mim? Fui até o meu carro e me direcionei direto para casa. Só quando cheguei e casa eu me lembrei de Roy, voltei para buscá-lo.
 Bati na porta. Eles ainda deviam estar na sala. Veronika abriu a porta, mas por um momento eu me assustei pensando que era Dakota, fiquei sem graça no momento, mas me recompus rápido.
— James? — Ela olhou para os lados. — Cadê a minha irmã?
— Ela já deve estar vindo. Na verdade achei que já estivesse aqui.
— Largou ela no caminho?
— Não! É claro que não. Ela esta com o Alex.
— Não acredito que você a deixou com ele.
— Bom... Eu não a deixei, foi ela que me deixou.
— Não estou entendendo mais nada.
— Se não se importa, pode chamar o Roy?
— Tudo bem, vou chamá-lo — ela disse e entrou para dentro da casa. Fiquei esperando fora, logo após Roy apareceu na porta.
— Vamos, Roy. Já está muito tarde.
Ele viu que Dakota não estava comigo, e viu minha cara de fracasso, logo deduziu que algo havia dado errado
— Ok, já vou — disse.
 Entrei no meu carro, debrucei no volante e fiquei esperando impacientemente os pombinhos se despedirem. Eu não queria pensar, mas era inevitável não remoer tudo o que tinha acontecido naquele estacionamento.
Escutei a porta do passageiro abrindo, Roy sentou no banco e ficou olhando para o meu rosto, esperando eu dizer algo. Ignorei-o, fingi que não percebi que ele ficara olhando para mim com uma expressão curiosa. Coloquei a chave no painel e virei. Corri com o carro mais do que o normal, para acalmar os meus nervos. Eu não queria ficar ouvindo como era o modo que a Veronika beijava, e os efeitos que ela causava ao Roy.
Chegamos a casa e não dissemos nada o caminho todo. Roy tinha medo da minha expressão, então não disse e nem perguntou nada, até por que ele tinha muito com o que se recordar naquela noite. E eu estava muito nervoso para ficar contando o que tinha acontecido.
— Posso saber onde os dois estavam? — Robert perguntou quando entramos pela porta da sala.
— Fomos resolver uns problemas... — disse Roy ao subir pela escada.
— Não mintam para mim — disse Robert se levantando do sofá. — E Roy, eu não disse que já podia ir para o quarto.
— Qual é pai... Nós já voltamos e estamos bem — Roy disse descendo a escada.
— Eu exijo que vocês me dêem explicações. Está tarde e vocês sabem, eu fico preocupado.
— Não tem por que ficar preocupado pai, sabemos nos cuidar — eu disse ainda parado na porta.
— Onde vocês estavam? — ele tornou a perguntar. — A verdade.
— Fomos à casa de Dakota, Roy ficou conversando com Veronika e eu fui para a balada com a Dakota. Essa é a verdade — eu disse sem citar os detalhes, que por sinal eram importantes.
— Que falta de respeito com a Kate, meninos! — Ele reprovou nossa atitude.
— Por quê? — perguntou Roy um pouco confuso.
— Essas são horas de ir fazer visitinhas?
— Ela nem nos viu.
— E você ficou sozinho com a Veronika?
— Pai. Eu a respeito.
— James, você foi para a balada com uma menina comprometida?
— Se você soubesse mesmo o que aconteceu, não estaria pensando essas coisas de mim — eu disse enquanto escutava ele pensar que eu xavecava a namorada de outro.
— Você esta proibido de ler os meus pensamentos.
— Não leio por que quero.
— E o que aconteceu realmente?
— Esta bem, vou colocar as cartas na mesa. Como sabe, gosto da Dakota, mas ela tem namorado. A questão é que o namorado dela é um canalha; eu quis mostrar isso a ela; mas como o Ben disse, ele é muito esperto, armou uma cilada e eu cai como um patinho. Agora Dakota me odeia.
Roy estava surpreso com minha sinceridade naquela noite.
— Ben esta envolvido nisso também?
— Não.
— Ok, podem ir para o quarto agora.
 Eu e Roy subimos a escada em silêncio, fui para o meu quarto e ele para o dele. Não vimos Ben e nem Liz, talvez eles tivessem se entendidos, aliás, talvez Ben resolvesse se declarar a ela.
 Fiquei o resto da noite deitado em minha cama, ainda nervoso por tudo que tinha acontecido. Como eu pude ser tão idiota em não pensar antes que aquilo tivesse sido uma armadilha? Como eu pude não pensar que Alex tinha amigos na balada que pudesse o ajudar?
 Imerso em tantos pensamentos, me veio em mente; o motivo por eu ter levado Dakota até aquela balada, foi por que Ben me deu a dica; de repente, ele estava sendo amigo demais. E se Ben tivesse colaborado com a cilada de Alex? 

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