Meses passaram e eu tive que me acostumar a ficar sem ir à faculdade; aliás, tive que me acostumar a ser um prisioneiro, e tive que me esconder até do sol. Algumas pessoas chegaram a perceber o meu desaparecimento, mas Robert mandou uma carta de satisfação para a faculdade, dizendo que eu tinha ido à Nova York tratar da minha doença do coração; aquele que não batia mais.
"Se algum passageiro não tiver realmente a intenção de ir à Ketchikan, Juneau ou Anchorage, sugerimos que desembarque imediatamente." Com estas palavras super encorajadoras, a comissária de bordo da Alaskan Airlines começou seu discurso de boas-vindas ao voo que tomamos em Prince George com destino ao Alasca.
Juneau, com 26.000 habitantes, é a mais bela capital nos Estados Unidos. Fica dentro da Floresta Nacional de Tongass, parte da maior floresta temperada do mundo. Antigos bosques e geleiras ficam dentro dos limites municipais, e muitas montanhas cobertas de neve.
Fizemos uma casa nas proximidades do Monte Roberts, fora da reserva. Robert comprou todo o material, e a mão de obra ficou por nossa conta. A casa que construímos não ficou tão simples e pequena quanto a de Prince George; sendo assim, se tornou um grande e luxuoso sobrado... Liz colocou seu toque de perfeição.
Praticamente ninguém sabe que moramos no local, imigramos para cá sem pedir permissão para nada, ninguém nunca reclamou por construirmos uma casa num lugar que a vista é perfeita, mas se alguém falar algo, Rob está disposto a oferecer uma grande quantia em dinheiro para que fique de boca fechada. Dar uma boa desculpa de que ele não gosta de mexerico quando ele resolve fazer algo não é tão convincente, mas só o dinheiro basta. Tive de me acostumar com o hábito de suborno desta família. De início achei bem estranho, até por que tive outro tipo de educação, mas com o tempo vi ser necessário em alguns casos, entretanto em outros, era mero luxo.
Em Juneau é muito frio, e quase sempre está chovendo, algumas vezes nevando. Eu nunca sinto frio, mas posso perceber pelas roupas que as pessoas estão sempre usando e por aqueles termômetros de rua; a temperatura estava sempre marcando 5ºC. Mudamo-nos quando era inverno, que por sinal a temperatura era 0ºC, mas eu ouvia dizer que no verão a temperatura podia atingir 15ºC.
Compramos dois carros; um Jaguar xf prata e um BMW x5 preto. Não os usamos muito, pois estamos sempre dentro da floresta; usamos somente quando queremos ir a algum lugar onde tenha pessoas por perto. Ninguém precisa saber que corremos como um puma.
Com o tempo eu fui conhecendo melhor a minha família. Cada um com seus devidos defeitos e qualidades; e eu não ficava de fora.
Robert não conseguia superar a perca de sua mulher Marie. Mesmo com o passar dos anos; não gostava de falar sobre ela. Ele é rígido como pai, e devido a sua preocupação exagerada, temos que dar explicação para quase tudo. Porém, ele é justo, solidário e muito generoso. É extremamente altruísta e está sempre disposto a ajudar.
Ben Adquire um temperamento forte. É intolerante, compulsivo e calculista. Perde a paciência rapidamente; age e reage sem refletir. Porém, Ben é leal, defende sua família com unhas e dentes, e chega ao ponto de oferecer sua vida a não deixar sua família em perigo.
Roy é imprudente, não tem noção do perigo e enfrenta qualquer coisa, podendo matá-lo ou não. É muito teimoso e orgulhoso. Roy também é honesto, perseverante, dinâmico, seguro e brincalhão.
Liz praticamente não tem defeitos, ela é do tipo perfeitinha. É muito sensível, perfeccionista e crédula; acredita facilmente nas pessoas e no que elas dizem. Ela é dedicada e prestativa, responsável, simpática, entusiasmada, ditosa, e está sempre de bem com a vida.
E eu... Bom, eu ainda estava me conhecendo. Muitas vezes me assustei com os meus próprios pensamentos. Porém eu ainda era o mesmo em alguns aspectos como a franqueza, se tivesse que dizer algo, é na cara. Sou ponderado, solícito e consciencioso. Ganhei uma característica a mais depois que me transformei, insegurança.
Nós todos temos dons. Não revelamos isso a ninguém, quanto menos a um humano. Dependendo da situação cada um dos dons que adquirimos pode nos beneficiar ou não. Cada um de nós ganha um único poder na hora da transformação.
Nenhum de nós conseguimos dormir, exceto Liz. Ela foi a única que teve essa sorte. Quando Liz dorme, ela sonha, e alguns de seus sonhos podem se transformar em realidade.
Ben consegue manipular uma pessoa com as palavras. Isso é meio assustador para mim, já que ele não foi muito com a minha cara.
Roy consegue fazer com que alguém esqueça algo. E se ele quiser, consegue fazer com que uma pessoa esqueça tudo que já se passou em sua vida toda. Isso sim é assustador, mas ele é do bem, e só usa seu poder se houver muita necessidade.
Robert consegue abrandar uma pessoa ou a ele mesmo. Ele consegue tranquilizar qualquer pessoa como se tivesse dado um sedativo.
E eu consigo ler mentes. Porém não é quando quero; consigo ler em alguns casos, como quando eu estou nervoso ou quando uma pessoa perto de mim está nervosa.
O único que trabalha em casa é Robert. Ele é chefe de cozinha e já trabalhou nos melhores restaurantes da França, Itália e Estados Unidos.
Ben, Liz e Roy fazem faculdade de medicina. Eu estou esperando a me habitar e acostumar com a aptidão dos vampiros para começar a trabalhar ou fazer faculdade.
Eu pretendia fazer faculdade de biologia; talvez futuramente até dar aulas em alguma faculdade. Talvez isso fosse sonhar alto demais, mas quem sabe...
Às vezes eu e minha família saíamos nas ruas onde tinha poucas pessoas para eu poder me acostumar com o cheiro de humanos. Eu ficava longe delas, e me esforçava muito para não machucá-las. Tive as minhas recaídas, mas toda vez Robert me acalmava. Apesar das recaídas eu achei que fui bem, todos acharam o mesmo, - menos Ben, que a propósito nunca foi junto. - Ben nunca disse que fui mal, pois ele nunca viu; mas em conversas nunca me elogiou também.
O período de tempo em que eu ficava sem me alimentar estava aumentando cada vez mais. Mas quando eu saía com a minha família para ver os humanos, sempre tive que me alimentar antes. Com o tempo, esse treinamento foi se tornando cada vez mais difícil... Eu me alimentava um dia antes para ver os humanos; e na próxima vez, dois dias antes e assim sucessivamente. Obviamente eu tinha mais vontade de mordê-los, mas Robert estava lá para não me deixar fazer isso.
Passaram-se cinco anos e eu não tinha mordido nenhum humano fora o meu melhor amigo. Eu estava orgulhoso de mim mesmo, mas ainda não podia chegar tão perto como os outros ficavam. Ben sempre usava isso contra mim, ele saía, se divertia e eu tinha sempre que ficar em casa. Toda vez que ele voltava, dizia em minha cara que eu não era bom o suficiente para aguentar ficar perto dos humanos sem mordê-los. Eu apenas escutava e não respondia. Mas esta não é a pior parte.
Todos os dias às 06:30 da manhã eu sentava numa pedra no alto da montanha, e de lá de cima eu via uma garota caminhando com foninhos nos ouvidos. Eu observava todos os seus movimentos e apreciava todos os seus gestos. Ela desfilava com sua beleza divina sobre as árvores. Cabelos lisos castanhos, com franja cobrindo quase toda a sua testa, a pele branquinha e os olhos cor de safira, - tal qual fiquei fascinado. - Mas eu podia perceber que ela caminhava triste, angustiada por algo que eu não sabia. Eu não sabia de onde ela vinha e pra onde ela ia; eu queria saber o seu nome, mas não ousaria chegar perto dela. Talvez Ben tivesse razão; eu não era bom o suficiente para chegar perto de quem eu queria.
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Entre Nossas Diferenças
Vampire"Uma metamorfose. Mudança de forma e estrutura, pela qual passam certos animais, como a borboleta. De certa forma, já passei por uma também." James, um jovem rapaz alto e de longos cabelos loiros, ao se ver numa situação em que sua vida é mudada r...