Quando chegamos na frente da boca de fumo, o Rato saiu primeiro do carro e me olhou entediado através do para-brisa por eu ainda estar sentada lá dentro, então eu logo abri a porta para evitar estresses com ele. O ar da noite estava frio, o cheiro de fumaça e lixo era forte, invadindo minhas narinas.
Fiz questão de olhar aos arredores para ter certeza de que ninguém me viu e entrei no casebre praticamente correndo. O chão de terra batida e as paredes manchadas de umidade davam um ar sombrio ao lugar. Bati meu rosto nas costas do Rato, que havia parado de repente no meio do caminho, o impacto me fez cambalear um pouco.
— O que tu tá fazendo aqui? — Escutei o Rato perguntando com a voz alterada. Joguei a minha cabeça para o lado para ver quem era a pessoa com quem ele estava falando e arregalei os meus olhos ao perceber que era o Chorão.
Como assim esse doido foi solto e não me avisou? Meu coração começou a bater mais rápido, uma mistura de alívio e medo tomando conta de mim.
Chorão estava sentado em uma cadeira, olhando para uma pequena televisão que transmitia um jogo de futebol. Ele não me viu.
— Ué, eu ainda sou o dono dessa porra, Rato — ele respondeu com ironia. — É impressão minha ou tu tá decepcionado em me ver livre? Eu te avisei que seu posto de chefe era passageiro até eu voltar.
Assim que o Chorão faz menção de se virar, eu me escondo atrás do Rato.
Meu Deus, ele vai me matar?
Não deveria ter vindo.
Que merda que eu fiz da minha vida?
— Me diz que tu não fugiu, Chorão. A gente tem um trato com o pai do Lucas. — A voz do Rato estava carregada de tensão.
— Tu queria que eu ficasse preso enquanto tu e a Helena tão tramando pra matar até a minha galinha?
— Quem disse que eu quero matar a Emília? — Rato perguntou, confuso, virando ligeiramente a cabeça para me olhar.
— Tô falando da Dandara, seu palhaço! Não fala assim da Emília que eu nunca desrespeitei a Cláudia — Chorão respondeu, sua voz firme, mas cheia de uma indignação velada.
Me segurei para não rir, porque deveria estar me sentindo ofendida por ser chamada de galinha pelo Rato e não achando fofo o fato do Chorão estar me defendendo. Meu estômago estava revirado, e eu sentia o gosto amargo do medo na boca.
— Nunca desrespeitou a minha ex-mulher, mas, em compensação, nunca tratou o próprio irmão com lealdade. — A dor na voz do Rato era palpável, ecoando na sala silenciosa.
Senti um aperto no peito. Não sabia o que sentir em relação a essa briga dos dois. A lealdade era uma linha tênue nesse mundo.
— Quem é a mina que vai contigo já que a Gabriela deu para trás? — Chorão questionou, seus olhos cravados no Rato.
É isso, a minha hora chegou, já posso até ver a luz no fim do túnel.
— É a tua amante — Rato respondeu, saindo da minha frente e revelando minha presença.
A fisionomia do Chorão mudou na mesma hora, de raivosa para feliz.
Certo, ele não vai me matar.
— Por que tu tá te envolvendo com isso, cora... Emília? — O moreno franziu o cenho. — Eu expulsei uma moradora da favela pra te dar uma casa com segurança e tu vai pra linha de frente, porra?
— Você fez o que, Chorão? — Minha voz saiu fraca, incrédula. Sinto o meu coração tão acelerado que parece que eu ia ter um infarto ali mesmo.
— Eu vou fazer esse corre, Rato. Pode deixar comigo.
— Quê? Não! Essa missão é minha, eu já tenho tudo planejado — Rato se emputece ainda mais e vai para cima do Chorão, ficando cara a cara com o seu irmão. O ar estava pesado com a tensão.
— Já disse que vou.
— Não fode tudo agora, seu filho da puta. — A voz do Rato era um sussurro raivoso.
— O que acontece é que eu sou o líder da FDM e se eu digo que eu vou fazer esse corre não é um merdinha qualquer que vai me impedir — Chorão retrucou, seu tom gélido.
Não tive tempo nem para piscar os meus olhos. No segundo seguinte, os dois irmãos estavam no chão, brigando aos socos. O som dos golpes ecoava pelo casebre, misturado com os gritos e palavrões, criando uma cacofonia de violência que parecia aumentar a cada segundo.
Os punhos do Rato se chocavam contra o rosto do Chorão com força, enquanto o Chorão retribuía com igual intensidade, seus olhos fervendo de raiva. Cada golpe era acompanhado por grunhidos de dor e ódio, o som abafado pelo impacto da carne contra a carne. O cheiro de suor e sangue se misturava no ar, tornando a atmosfera quase irrespirável.
GV saiu da salinha ao ouvir os gritos e tentou separar a briga. Ele puxou o Rato pelos ombros, mas foi empurrado de volta com tanta força que quase caiu. A luta continuava, selvagem e incontrolável, com os dois irmãos rolando pelo chão, chutando e socando como se suas vidas dependessem disso.
— Parem com essa merda! — GV gritou, tentando de novo intervir. Ele se lançou entre os dois, usando toda sua força para tentar afastá-los, mas era como tentar separar dois cães de briga. A fúria dos irmãos era uma força da natureza, avassaladora e implacável.
A confusão só aumentava, com outros homens entrando na sala, tentando ajudar GV a separar a briga. Um empurrão aqui, um soco ali, e logo a sala estava cheia de corpos se debatendo, um turbilhão de violência e caos. O chão de terra batida começou a manchar de sangue, o líquido escorrendo e se misturando com a sujeira do lugar.
De repente, ouço um tiro sendo disparado. O som reverberou pelo casebre, trazendo um silêncio abrupto e chocante. O Rato e o Chorão se levantaram lentamente, os rostos e corpos cobertos de arranhões e hematomas, mas seus olhos estavam fixos em algo mais terrível.
GV estava no chão, seu corpo inerte enquanto uma poça de sangue se formava ao redor dele. O cheiro metálico do sangue invadiu minhas narinas, me fazendo sentir náuseas. A cor vermelha brilhante contrastava com a escuridão do casebre, uma visão que parecia irreal.
Nenhuma palavra saiu da minha boca. Parecia que eu estava petrificada no chão, porque eu não conseguia me mexer. Respirar parecia pesar uma tonelada. Meu peito subia e descia em respirações rápidas e curtas, enquanto minha mente tentava processar o que tinha acabado de acontecer. O horror da situação me paralisava.
Fui ficando tonta e senti minhas pernas ficarem bambas. Tudo ao redor parecia girar, as luzes e sons se misturando em um turbilhão confuso. A última coisa que me lembro foi a voz do Chorão gritando pelo GV, seu tom desesperado ecoando na minha mente enquanto eu caía na escuridão do inconsciente.
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ATRAÍDA PELO TRÁFICO
Literatura Feminina[Este livro não retrata a realidade nua e crua das favelas, é apenas uma história fictícia com o intuito de entreter] "Uma conexão obscena entre um sequestrador e sua refém" Após passar 72 horas como refém do temido líder da facção, Chorão, Emília l...