XIV Capítulo

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Blue

= Assuntos Familiares =

Comida de hospital.

O que poderia ser mais sem sabor ou triste do que comida de hospital?

Talvez se a comida tivesse um pouco mais de açúcar, o meu sofrimento não estaria no extremo e com a ela a minha paciência. Certamente, nada é pior que… Quero dizer, claro que poderia ter sido pior, afinal, a Mandy podia ter acertado um órgão vital meu ou poderia ter passado por uma cirurgia ou levar mais pontos do que levei. No final, O Senhor foi Gracioso comigo e protegeu-me de algo pior e tenho que ser agradecido, apesar de sentir-me terrivelmente desanimado.

— Está assim tão horrível? — Russel pergunta ao fazer uma expressão descontente da sua cadeira, como se ele mesmo tivesse que comer o meu jantar.

— Deve estar. Algumas pessoas, nunca se contentam com nada. — Bianca responde sem tirar os olhos das agulhas de crochê em suas mãos. Faz muito tempo que não a vejo pegar nesse quite, mas parece que ela vai aproveitar seu tempo fora do Meet para isso ou ainda o facto de passar um tempo aqui no hospital por minha causa.

— Na verdade, poderia estar pior. — Mexo mais uma vez na papa com a colher e finalmente desisto de comê-la. Só aqui estou há um dia e já estou terrivelmente desanimado.

— E é por isso que vais deixar as coisas como estão? — Bianca ainda não me dirige um único olhar, mas seu tom é cortante. Não posso deixar de reparar que seus fios estão soltos, como quase nunca estão e seu semblante pálido.

Quer eu queira ou não — e eu quero, às vezes — não consigo ver Bianca Thomas como tia, mas sim como uma irmã mais velha. Não é apenas por causa da pouca diferença de idade, mas porque crescemos juntos e sempre partilhámos a vida como irmãos e por isso mesmo, ela deveria saber que os assuntos envolvendo a minha mãe são complicados e são, praticamente, intocáveis. Sobretudo, quando estou em agonia numa cama de hospital.

— Ainda estamos a falar sobre a comida?

— Ainda estamos. — Seu tom de voz é contido, mas posso claramente ver os seus olhos cheio de ressentimento puro. Temo ser uma pedra de tropeço em sua vida, mas não posso fazer muito. Nem mesmo quando Russel pede-me para que eu fique calado. — Sabes o que o meu pai falou sobre o que aconteceu? Ele disse-me que a culpa é minha por estares deitado neste quarto, Blue. Que ele logo voltaria para cuidar de tudo, pois, sou fraca demais para manter-te longe de problemas.

— Sabes que não podes levar tão a sério o velho Heitor, Bianca.

— Como não? Ele é teu avô, mas é meu pai, Blue. Ele é mais duro comigo e com razão. Eu deveria ser responsável por ti. — Temo que ela comece a chorar e sinto-me sufocado com isso. Bianca não é uma mulher que chora facilmente. Pelo menos, não na presença de outra pessoa que não ela mesma.

— Isso não foi culpa tua ou do Blue, Bianca. Foi minha, eu marquei o encontro. Deveria ter sido eu a encontrá-la. Eu deveria ter levado a facada. — Russel tenta intervir, mas praticamente se encolhe quando lhe dirijo um olhar descontente e a Bianca bate na sua cabeça, adornada pelo seu chapéu preferido.

— Claro que não, seu Pazzo! Nenhum dos dois deveria estar lá. Eu vos disse para não se encontrarem com ela, mas vocês nunca me escutam. Eu também quero descobrir a verdade, mas desta maneira não vale a pena. Além disso, já disse que a culpa é minha.

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