As luzes da cidade já haviam sumido há quilômetros, e tudo o que restava era a estrada coberta de neve à frente. O vento frio da Rússia parecia atravessar até o vidro do carro, mesmo com o aquecedor ligado. Eu estava longe de casa, longe de Giulia, e o vazio que isso causava só aumentava.
O pior era saber que a culpada por tudo isso era Giovanna. Separou Giulia de mim, acabou com qualquer chance que eu tinha de ser feliz com ela. Agora eu estava aqui, no meio do nada, com o peito doendo como se alguém tivesse arrancado algo de dentro de mim.
Segurei o volante com força, tentando afastar os pensamentos. Mas era impossível. Tudo o que eu conseguia pensar era em Giulia. No sorriso dela, no jeito como fazia tudo parecer mais leve. E no quanto aquilo tinha ido embora. O vazio dentro de mim parecia crescer, engolindo tudo, e eu não sabia o que ainda me segurava.
Talvez fosse o ódio por Giovanna. Ou talvez fosse a vontade de não deixar tudo acabar assim. Só que, naquele momento, o frio lá fora parecia pequeno comparado ao que eu estava sentindo por dentro.
As rodas do SUV derraparam um pouco no terreno de cascalho antes de parar nos portões de aço enferrujados do complexo da Bratva. Não era o tipo de lugar que você vê em filmes glamourosos sobre máfia — era o tipo de lugar que fede a violência e desespero.
Ao sair do carro, o vento gelado da Rússia me acertou de novo, mas foi logo abafado pelo som metálico das portas de ferro se abrindo. Aquele rangido pesado não veio sozinho — o clique de pelo menos dez armas sendo apontadas pra mim seguiu logo atrás. Os capangas da Bratva estavam em posição.
Um deles, que parecia ser o chefe da guarda, deu um passo à frente. O desgraçado tinha um cigarro pendurado no canto da boca, encarando como se tivesse chance.
— Sério? — sorri de canto, abrindo os braços, como quem convida para um tiroteio. — Vocês vão apontar essas merdinhas pra mim? Logo pra mim?
O imbecil nem piscou. O cigarro caiu da boca dele e se apagou no gelo. Deu outro passo, encarando meus olhos, cheio de confiança. Mas então, de repente, o reconhecimento bateu na cara dele. Aqueles olhos estúpidos se arregalaram, e o que antes era ameaça virou puro medo. O idiota parecia prestes a se ajoelhar.
— O... Fruto Cruel... — a voz dele vacilou enquanto levantava a mão esquerda, mandando os outros baixarem as armas. — Mil desculpas, eu... eu não sabia que era você.
— Claro que não sabia — rebati, passando por ele com desprezo. — Agora, me leve pra dentro antes que eu congele as minhas bolas aqui fora.
Acenou freneticamente, quase tremendo, e os portões se abriram com aquele som pesado de metal se arrastando. Os guardas, que segundos antes estavam prontos para me fuzilar, se afastaram como cães acuados, abaixando as armas e me observando como se eu fosse algum tipo de lenda viva. Talvez eu fosse.
Enquanto me guiava pelos corredores frios do complexo, eu absorvia cada detalhe. As paredes de concreto eram mal pintadas, e o cheiro de mofo, óleo de arma e cigarros impregnava o lugar. Clássico Bratva. Você podia sentir o cheiro de pólvora e sangue seco, como se o passado sangrento daquele lugar fosse algo que nunca se apagaria.
A cada passo que eu dava, o som das minhas botas ecoava pelo corredor estreito e úmido. Cada batida parecia pontuar o peso que eu carregava, não só no corpo, mas na porra da alma também. O guarda à minha frente, que conduzia o caminho, mantinha a postura rígida, mas lançava olhares desconfiados de canto de olho. Parecia querer entender o que o chefe dos Ristrettos, estava fazendo na Rússia. Já vi muitos caras como ele: durão, marcado pela vida, provavelmente já levou umas boas porradas e riu de volta. Cabelo castanho bagunçado, jaqueta de couro preta, e aquele olhar que não confia em nada, nem no próprio reflexo no espelho.
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FRUTO CRUEL
Romance"Novos capítulos toda sexta-feira!" Nossa mente é um labirinto complexo, muitas vezes difícil de compreender. Qualquer gatilho pode desencadear consequências terríveis, especialmente na mente de um dependente químico, onde o medo se torna ainda mai...