19 - Será que valeu pena?

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Dormir sozinho em uma cama kingsize enorme no quarto que deveria ser de casal é uma experiência triste. Mas, dadas as circunstâncias e o estado frágil de Giulia, decido suportar a solidão. Eu sabia que estava escolhendo esse caminho quando permaneci em silêncio, quando não expliquei a situação. Estendo-me na cama, sentindo-me pequeno e perdido em meio à vastidão do colchão vazio.

Ao me espreguiçar, permito que o lençol deslize suavemente por meu corpo. Levanto-me com relutância e sigo até o banheiro, onde o reflexo cansado que me encara no espelho é uma cruel lembrança das noites mal dormidas. A falta do perfume de Giulia pairando no ar torna ainda mais difícil encontrar o sono, como se sua presença ausente deixasse um vazio.

Desfaço-me da calça do pijama com um suspiro resignado, deixando-a cair desajeitadamente no cesto de roupas sujas. Talvez um banho me ajude a clarear a mente e aliviar um pouco do que sinto. O chuveiro se torna meu refúgio temporário, onde as gotas d'água quente caem sobre minha pele, com os olhos fechados, permito-me absorver a sensação , pelo menos por alguns momentos.

Após o banho, visto-me com uma camiseta preta que parece refletir o humor sombrio que me cerca, enquanto a calça jeans escura se ajusta ao meu corpo de forma confortável. Dou uma olhada no closet e decido adicionar meus acessórios para completar o visual. Coloco minha corrente dourada no pescoço e o relógio que ganhei do meu pai no meu aniversário de 19 anos.

Antes de sair, fecho os olhos por alguns instantes, buscando reunir forças para enfrentar mais um dia. Respiro profundamente, tentando afastar a sensação sufocante de isolamento. À medida que sigo pelo corredor, iluminado por uma luz fria e impessoal, a ausência de vida e cor na sala de estar parece intensificar o vazio do local.

Solto um longo suspiro, deixando escapar toda a tensão que me dominava, e me encaminho até a cozinha.

O espaço é tão luxuoso, tão sofisticado, repleto de utensílios de última geração, mas tudo isso parece ter escapado à minha percepção na noite anterior. Naquele momento, eu estava mergulhado nas fotos, segurando-as por horas a fio, tentando desvendar o porquê de não ter falado nada para Giulia, por que não lhe expliquei que não fui ao encontro de Lívia e, muito menos, que não fiquei com ela.

Um gosto amargo sobe pela minha garganta ao perceber a mesa posta, o café passado pronto. Caminho até a máquina, as xícaras de porcelana brancas alinhadas ao lado, e sirvo o café, observando o vapor subir suavemente.

Ao retomar meu trajeto pelo apartamento, rumo à sala, não posso deixar de notar a elegância do ambiente, mas é como se toda essa pompa apenas servisse para destacar a imensidão do vazio que sinto dentro de mim neste momento.

Meus olhos se voltam para a enorme janela de vidro, através da qual posso vislumbrar o frenesi da rua lá fora, um constante movimento, uma corrida desenfreada, enquanto aqui estou eu, parado, sem rumo, sem saber para onde ir, sem ter ideia de como será minha vida daqui para frente.

Por um instante, fecho os olhos, deixando-me envolver pelas lembranças das palavras de minha mãe: "Você é capaz de tudo, Allan, e tudo que você quiser será seu se persistir."

O calor da xícara de café aquece minhas mãos enquanto a levo aos lábios, sentindo o líquido quente queimar suavemente. É então que o sabor de Giulia volta à minha mente, trazendo consigo a lembrança do quanto ela se entregava a mim. Começo a cogitar que sua resposta teria sido um sim, se não tivesse recebido aquelas fotos falsas. Por que não me expliquei? Por que não contei tudo para ela quando ficamos trancados? Como vou me acertar com ela agora?

Caminho novamente até a cozinha, uma inquietação latente me empurrando para não permanecer parado no lugar. Deixo a xícara na pia, e meus olhos são capturados pelo símbolo dos Ristrettos, gravado em minha mão.

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