3 - Me desculpa, por favor?

5K 276 102
                                    

Hoje é um daqueles dias ruins, onde me sinto fora de mim, em um estado de torpor que me consome. Não sei se é o peso do meu próprio estado mental que me prende na cama ou se é algo mais.

Ultimamente, parece que vivo num estado intermediário entre sonho e realidade, incapaz de distinguir onde um termina e o outro começa.

Enquanto encaro o branco sem vida do teto, uma sensação de vazio me envolve. Horas se passam, e eu permaneço imerso nesse branco puro e hipnotizante, quando algo muda no ar, tornando-o mais leve, impregnado com um aroma familiar que me faz lembrar de casa.

Aos poucos, percebo uma leve pressão em minhas mãos, como se alguém estivesse tentando me trazer de volta à consciência.

Então, a voz de Anthony ecoa ao longe, distorcida e distante, como se viesse de um túnel longínquo, mas ao mesmo tempo próxima, uma contradição que confunde meus sentidos já entorpecidos. Faço um esforço para captar suas palavras, tentando decifrar sua mensagem através da confusão mental em que me encontro.

Ele implora para que eu me recupere, e eu estou tentando, Anthony, estou usando todas as minhas forças, juro.

Em seguida, ele compartilha a conquista da mulher dos seus sonhos, minha doce prima Isabelly. Eu queria poder parabenizá-lo, abraçá-lo e compartilhar sua alegria. Só eu sei o tormento que ele suportou ao ficar longe dela, a dor que o consumiu quando teve que se afastar. E tudo por minha culpa.

Eu me esforço tanto para ouvi-lo, e sua voz, embora distante, me alcança. "Eu vou esperar por você", ele diz com tanta esperança, "e eu te prometo, irmão, eu vou voltar por você".

Mesmo que minha voz não saia, eu prometo. Mesmo que eu questione minha própria existência, sei que meu melhor amigo precisa de mim, e essa constatação transforma a minha perspectiva. Talvez eu não mereça viver, mas, para Anthony, sou essencial.

E por ele, prometo a mim mesmo fazer o possível para retornar, para retribuir a confiança que depositou em mim e os anos em que me apoiou incondicionalmente. Ouvir suas palavras sinceras, me faz perceber que há pessoas que se importam comigo, que acreditam em mim, que esperam pelo meu retorno.

Verdade seja dita, a tentativa fracassada de tirar minha própria vida agora parece um ato de covardia, um momento de fraqueza.

Ao olhar para trás, vejo uma linha frágil de esperança estendendo-se diante de mim, uma oportunidade de recomeçar. Será que isso seria possível para alguém como eu?

Não sei bem como acontece, mas logo uma sensação de esgotamento me engole. Pego-me em um estado de dormência, uma transição suave para a sonolência. Nesse momento, deixo-me envolver fechando os olhos lentamente.


"Observo meu pai ao lado de minha mãe, segurando sua mão com firmeza, como se fossem metades um do outro. O comprometimento mútuo deles é algo que admiro profundamente, mesmo que, ano após ano, eu me esquive do amor e da companhia de minha mãe, incapaz de encará-la nos olhos.

Ainda assim, o amor persiste dentro de mim. Meu pai sofre com minha distância, e já fui punido por isso em diversas ocasiões. Perder o posto de líder dos Ristrettos é apenas mais um dos castigos que Steve Moretti vai me impor, e isso me enche de raiva.

Não que eu o culpe, mas eu evito minha mãe, fujo de casa sempre que posso e, principalmente, ignoro o fato de que minhas ações a machucam.

Entretanto, Anthony está ali, aguardando a nomeação, e tenho certeza de que ele merece. Ele é mais digno que eu.

— Antes de prosseguir, tio, eu gostaria de dizer algumas palavras — Anthony interrompe, e todos os olhares se voltam para ele, especialmente o de Alysson, sua irmã gêmea, que parece furiosa.

FRUTO CRUELOnde histórias criam vida. Descubra agora