A mala estava aberta no centro do quarto, assim como meu peito. Tudo parecia espalhado, vazio. Eu dobrava as roupas em silêncio, como se cada dobra trouxesse uma memória dolorosa.
O cheiro dele estava em todo lugar, impregnado nos lençóis, no travesseiro que eu abraçava todas as noites desde que ele me deixou no altar. Não precisava procurar muito. O perfume amadeirado dele estava ali, me cercando. Fechei os olhos, sentindo o cheiro invadir meus sentidos, e, antes que eu pudesse me conter, as lágrimas começaram a cair.
Me sinto tão pequena, tão insignificante. Fui abandonada no altar, no momento em que pensei que nossas vidas se uniriam para sempre. Como alguém que dizia me amar tanto pôde ir embora assim? Sem explicação, sem aviso. Isso me corroía por dentro.
As lágrimas continuavam a escorrer silenciosamente pelo meu rosto, enquanto eu segurava uma camiseta dele. Eu ainda não conseguia soltá-la, como se aquele pedaço de pano que encontrei no chão fosse a única coisa que me mantinha conectada a ele.
Cinco dias se passaram, e os pesadelos voltaram com tudo. Eu já tinha esquecido como era, porque de alguma forma, Allan sempre conseguia afastá-los. Mas agora, sem ele, as noites pareciam intermináveis. Acordava várias vezes, suando frio, com o coração disparado.
Desde então, comecei a me recordar dos homens que passaram pela minha vida, e a dor voltou com força total.
O falecido Christopher, que sim é o pai de Alyce, mas também o responsável por traumas que jamais vou superar. Me deixava insegura, me comparava com as mulheres com quem passava as noites, prostitutas que achava mais atraentes que eu. Dizia que eu era "frígida", "sem graça". Aquilo me feriu de uma forma que palavras não conseguem descrever. Cada vez que chegava em casa depois de uma noite de festas e bebedeiras, eu me encolhia um pouco mais. A dor de não ser suficiente para alguém que deveria me amar era insuportável.
E então, veio Tomás. A maior decepção. Meu melhor amigo me marcou com a noite mais dolorosa que já vivi. Achei que poderia confiar nele, afinal, já tínhamos estado juntos em várias situações antes. Mas quando se jogou sobre mim, cheirando a bebida, todos os meus traumas voltaram à tona. Ele me lembrava Christopher, sempre voltando para casa embriagado, ignorando meus pedidos para parar.
Eu pedi para Tomás parar. Implorei. Mas ele não parou. Sentia me marcando com beijos forçados, sugando meu pescoço com força, e eu comecei a me sentir suja de novo. Foi como reviver o pior momento da minha vida. Eu me senti culpada, por tudo. Pelo vestido que usei, pela forma como tinha me comportado, achando que talvez tivesse dado algum sinal errado.
E quando colocou a mão na minha calcinha, eu desmoronei. Me senti impotente, e o nojo tomou conta de mim. Não dele, mas de mim mesma. Me culpava por tudo. Foi aí que vi a garrafa de vinho, e a minha única saída foi agarrá-la e bater nele. Aquele momento me libertou fisicamente, mas a sensação de estar suja, quebrada, continuava.
Saí daquele lugar sentindo um nojo profundo de mim mesma. Voltei para casa, e o olhar de Allan quando me viu, a maneira como falou comigo... Ele achou que eu o tinha traído. Isso, mais do que qualquer outra coisa, me destruiu.
A campainha tocou, me puxando de volta para a realidade. Soltei a camiseta que estava segurando, como se o simples ato de largá-la fosse um esforço tremendo. Respirei fundo, tentando empurrar o choro para longe, mas ele estava lá, teimoso, preso na garganta. O coração pesava como chumbo, e a dor se espalhava por cada parte do meu corpo. Mesmo assim, eu tinha que continuar. Caminhei em direção à porta, os pés se arrastando pelo chão. A casa, que um dia fora o nosso refúgio, agora me sufocava. Cada canto estava impregnado de memórias que doíam só de olhar.
Abri a porta, e lá estava Giovanna, a única pessoa no mundo que conseguia me entender sem precisar de palavras. Ela segurava uma pasta nas mãos, mas antes de qualquer coisa, se aproximou e me envolveu em um abraço firme, daquele tipo que só irmãs conseguem dar. Senti o calor dela me acolhendo, mas também a tensão no corpo dela, como se estivesse tentando absorver um pouco da minha dor. Eu sabia que minha irmã queria me ver bem, mas era difícil até para mim acreditar que isso fosse possível naquele momento.
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FRUTO CRUEL
Storie d'amore"Novos capítulos toda sexta-feira!" Nossa mente é um labirinto complexo, muitas vezes difícil de compreender. Qualquer gatilho pode desencadear consequências terríveis, especialmente na mente de um dependente químico, onde o medo se torna ainda mai...