A luz da manhã escapa pelas frestas das cortinas, pintando o quarto com um tom dourado suave. Bom, suave para quem não passou a noite em claro. Giulia ainda dorme ao meu lado, afundada no travesseiro como se o mundo tivesse sumido. Depois de uma noite inteira lidando com os efeitos colaterais da vodka, finalmente conseguiu cair num sono tão pesado que nem a brisa que entra parece incomodá-la.
Estou acordado há um tempo, só observando. É engraçado como, mesmo no caos, ela consegue ficar assim... serena. Eu poderia rir disso, mas sei que a ressaca vai cobrá-la mais tarde, e ela não vai estar tão serena assim quando acordar.
Minha mão desliza naturalmente para a mecha de cabelo que cobre seu rosto. Ao puxá-la gentilmente para trás de sua orelha, a visão de sua bochecha macia e arredondada me faz sorrir. Sem resistir, deixo meu polegar acariciar suavemente sua pele, sentindo o calor de seu corpo sob o toque. Ela é tão linda, tão perfeita em sua vulnerabilidade e em cada detalhe sutil de sua expressão relaxada.
O quarto está silencioso, apenas o som distante da cidade começando a acordar lá fora. O relógio ao lado da cama marca quase 10:00 da manhã. Temos tempo ainda, mas o voo está marcado para as 13:00. Não quero acordá-la tão cedo, mas também sei que vai precisar de um bom tempo para se arrastar para fora da cama com a ressaca que está carregando.
Levanto-me devagar, cuidando para não perturbá-la, sem fazer muito barulho, retiro minha camisa e a deixo sobre a cadeira ao lado. As calças seguem logo depois, junto com a cueca. A sensação do piso frio de mármore sob meus pés me desperta ainda mais enquanto me movo em direção ao banheiro. O ambiente de cerâmicas brancas brilha com a luz suave que entra pelas janelas estreitas, criando um contraste com o vapor que já começa a se formar ao ligar o chuveiro. O box fosco se enche de vapor, e o som da água caindo ecoa pelo espaço vazio.
A água quente escorre pelos meus ombros, deslizando sobre as cicatrizes antigas. A dor é uma velha conhecida, mas hoje... hoje tem algo diferente. Uma leveza que não me pertence, mas que eu aceito. Aquela sensação de esperança, a que dizem ser rara, resolveu aparecer. Como se, finalmente, depois de tanto tempo, os dias melhores tivessem me alcançado. Giulia e eu... estamos limpos. Sem segredos.
E agora, mais do que nunca, estou louco para ver Alyce. A pequena está à nossa espera, e só de imaginar a carinha dela, já sinto o coração acelerar. Quem diria que uma criança teria tanto poder sobre mim?
Anthony e Isabelly também estão bem, o que é outro milagre. E até aquele peso constante que eu carregava por conta da minha mãe parece mais leve. Sempre pensei que ela ainda estivesse presa ao passado, apesar do que me contou sobre meu pai ter sido fundamental para sua recuperação. Talvez eu nunca tenha realmente acreditado nisso... até agora.
A conversa que teve com Giulia foi o que realmente me trouxe a paz. Saber que a mulher que amo esteve com minha mãe, duas pessoas tão importantes na minha vida, é reconfortante. Giulia tem esse dom de curar e entender as pessoas de um jeito que ninguém mais consegue. E se elas conversaram, sei que, de alguma forma, minha mãe foi acalmada. Isso é tudo que preciso saber.
Além de ser a mulher da minha vida, Giulia é brilhante no que faz. E olha que eu sei do que estou falando. Já fui rotulado de todas as formas por profissionais que mal conseguiam me olhar nos olhos. Passei anos acreditando que era um lixo humano. Até que ela apareceu e tudo mudou. Preciso admitir, aquele louco que a sequestrou estava certo em uma coisa: ela é única.
Desligo o chuveiro, sentindo o frescor do ar frio encontrar minha pele quente. Passo a mão pelos cabelos molhados, sem me preocupar em arrumá-los. Me seco devagar, tomando meu tempo. Hoje, posso respirar. E isso já é mais do que eu esperava.
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FRUTO CRUEL
Romance"Novos capítulos toda sexta-feira!" Nossa mente é um labirinto complexo, muitas vezes difícil de compreender. Qualquer gatilho pode desencadear consequências terríveis, especialmente na mente de um dependente químico, onde o medo se torna ainda mai...