Lis Alcantra pov's
Eu conhecia bem aquele olhar. Gabriel não precisava dizer nada, e, na verdade, raramente o fazia. Ele carregava o peso do mundo nos ombros, e sempre que o vi encarar o vazio, como fez esta noite, eu sabia o que viria a seguir. O silêncio. A maneira como ele se fechava em si mesmo, como se estivesse construindo uma barreira intransponível, me excluindo mais uma vez.
Era um ciclo. Ele ficava abalado, vulnerável, mas incapaz de lidar com isso de forma saudável. E então ele me procurava, não com palavras, mas com gestos. Seu toque era tanto um pedido quanto uma fuga. Era assim que ele tentava se consolar, e também se esconder. E eu? Eu cedia. Sempre cedia, porque, de alguma forma, eu também precisava dele. Precisava daquele contato para me sentir importante, para acreditar que, de alguma maneira, eu estava ajudando, mesmo que soubesse que aquilo não resolvia nada.
Eu o amava. Sabia disso, embora tentasse negar, porque o amor que eu sentia por Gabriel não era fácil. Não era bonito, nem simples. Era tumultuado, complicado, cheio de silêncios que diziam mais do que qualquer palavra. Talvez eu o amasse porque, de certa forma, eu sabia como era ser destruída por dentro e fingir que estava tudo bem. Eu também tinha meus próprios fantasmas, e ele... bem, ele era o maior deles agora.
Quando Gabriel se levantou do sofá e veio até mim, seus olhos diziam o que sua boca nunca diria: ele estava quebrado, e isso o aterrorizava. Eu sentia a energia densa no ar, aquela mistura de raiva e desejo, de dor e necessidade. Ele não pediu, e eu não recusei. Sabíamos o que viria a seguir. Acontecia sempre da mesma forma.
Ele me puxou com certa urgência, suas mãos firmes, como se estivesse tentando encontrar algum tipo de estabilidade no caos que ele mesmo criava. Seus lábios encontraram os meus, e o beijo foi intenso, quase desesperado. Não era carinho, não era afeto. Era algo mais sombrio, mais profundo. Era a tentativa de preencher o vazio que crescia dentro dele, e eu era o meio para isso.
Sem dizer uma palavra, fomos até o quarto. Cada passo era pesado, cada movimento carregava o peso de tudo que nunca éramos capazes de dizer um ao outro. Quando chegamos à cama, ele me deitou com a mesma intensidade que guiava seus beijos, seus toques. Não era a primeira vez que fazíamos isso — não seria a última. Mas sempre parecia a mesma coisa: uma tentativa de consertar o que estava quebrado dentro dele, sem perceber que, talvez, ele estivesse me quebrando no processo.
Seu corpo pressionava o meu com uma força que quase me sufocava, e, ao mesmo tempo, me fazia sentir viva. Os toques eram precisos, familiares, como se ele soubesse exatamente como me fazer esquecer por um momento o quanto tudo estava errado. Eu me entreguei a ele, não por obrigação, mas porque, no fundo, eu também estava buscando algo. Algo que eu não conseguia nomear.
Nossos corpos se moviam juntos, mas não havia suavidade. Não havia delicadeza. Era tudo sobre necessidade, sobre aliviar uma dor que nenhum de nós sabia lidar. Ele segurava meu rosto, os olhos fechados como se estivesse tentando apagar o mundo ao nosso redor. E talvez estivesse.
Era sempre assim. Após a tensão, vinha o consolo físico, momentâneo. Ele procurava refúgio no meu corpo, e eu dava, porque não sabia de outra forma de ajudá-lo. Quando seus movimentos se tornaram mais intensos, quando o calor entre nós atingiu seu pico, eu sabia que aquele momento logo acabaria. E, como sempre, o vazio retornaria.
Minutos depois, deitados lado a lado, o quarto estava mergulhado em silêncio. O que acontecia entre nós sempre deixava essa sensação de incompletude, como se algo essencial estivesse faltando. Gabriel se virou para o outro lado, respirando fundo, provavelmente se perdendo em seus pensamentos sombrios.
— Você acha que isso resolve as coisas? — minha voz quebrou o silêncio, embora eu soubesse a resposta.
Ele não respondeu de imediato. Eu não esperava que ele respondesse. Era sempre assim. Eu o deixava entrar na minha vida, no meu corpo, esperando que, de alguma forma, isso fosse o suficiente. Mas nunca era.
Finalmente, ele falou, a voz baixa, quase um sussurro.
— Eu não sei... — disse ele, e o peso das palavras pairou no ar, como uma confissão involuntária.
Eu virei o rosto para o teto, sentindo o suor esfriar na minha pele e o vazio familiar preencher o espaço entre nós. Eu sabia que ele estava se afastando de novo, mesmo estando ali, ao meu lado. O toque físico não significava proximidade. Às vezes, me parecia que, quanto mais ele me tinha, mais distante ele ficava.
Eu queria que ele me visse. Não só o corpo, não só o consolo temporário. Queria que ele entendesse que eu estava aqui, que poderia ser mais do que isso. Mas talvez fosse pedir demais. Talvez, no fundo, ele nunca seria capaz de me ver além das próprias dores e inseguranças. E talvez eu nunca tivesse coragem de ir embora.
— Gabriel — chamei, minha voz saindo mais suave do que eu pretendia.
— O quê? — ele respondeu sem se virar.
Eu queria dizer tantas coisas. Que eu estava cansada de ser só um escape, que eu precisava de algo mais, que eu estava me destruindo junto com ele. Mas as palavras não vieram. Ao invés disso, eu apenas balancei a cabeça, mesmo sabendo que ele não me veria.
— Nada — sussurrei.
E, no fundo, eu sabia que era isso o que nós éramos: um grande nada envolto em silêncios e toques.
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Entre Cicatrizes e Silêncios-Gabigol
FanfictionSinopse: "Você não vê que está me destruindo?" "Então, por que não me deixa aqui de uma vez?" "Porque eu me importo com você, mais do que deveria." Gabriel Barbosa, ex-camisa 10 do Flamengo, agora carrega o número 99, que simboliza o infinito - assi...