Lis Alcantra pov's
O som da porta se fechando ainda ecoava pela casa, mas eu sabia o que aquilo significava. Gabriel estava celebrando de novo. Não que eu não quisesse que ele comemorasse — longe disso. Ele tinha marcado o gol, carregado o Flamengo nas costas mais uma vez, e sabia o quanto isso era importante para ele. Eu mesma havia gritado de felicidade quando vi a bola balançar a rede pela TV. Mas a verdade, aquela que me corroía por dentro, era que o "nós" nunca parecia ser parte dessa comemoração.
Ele entrou em casa com o sorriso que eu não via há muito tempo. Era raro vê-lo assim ultimamente. Ele chegou até mim com pressa, seu corpo ainda exalava a adrenalina do jogo, e seus olhos estavam famintos, mas não era um desejo por mim que eu reconhecia. Era a fome de alguém que precisava se livrar de toda a tensão, alguém que procurava uma válvula de escape.
Ele me puxou antes que eu pudesse dizer qualquer coisa. Suas mãos encontraram meu corpo com urgência, e eu cedi. Como sempre cedia. O beijo veio forte, quase possessivo, e em segundos estávamos no quarto. A maneira como ele me tocava era familiar, mas distante. Não havia doçura, não havia aquele carinho que eu sonhava em ter algum dia. Era Gabriel, o jogador, o homem em busca de um refúgio temporário, e eu... eu era apenas o lugar onde ele encontrava esse alívio.
Nós transamos como já tínhamos feito tantas vezes antes, com uma pressa que ignorava qualquer tentativa de conexão mais profunda. Os movimentos eram rápidos, intensos, e, por um momento, eu tentei me perder nisso também. Eu tentei fingir que, de alguma forma, esse era o jeito dele de me mostrar que se importava, que me queria, que eu era importante. Mas, no fundo, eu sabia. Quando tudo acabasse, o vazio retornaria.
E eu não estava errada.
Assim que terminamos, Gabriel deitou ao meu lado por poucos minutos, respirando fundo, o suor ainda escorrendo pelo seu rosto. Eu o observei, desejando dizer algo. Qualquer coisa que o fizesse ficar, que o fizesse perceber que eu precisava dele de um jeito diferente. Eu não queria mais ser só o consolo, só o escape.
— Bom jogo hoje... — minha voz saiu mais baixa do que eu esperava, quase como se eu tivesse medo de quebrar o momento.
Ele virou o rosto para mim, um sorriso leve nos lábios.
— É, foi sim. Precisávamos desse gol.
Eu esperei por mais. Um gesto de carinho, um abraço, algo que me fizesse sentir que havia algo além dessa euforia passageira. Mas o que veio foi o contrário. Ele se levantou da cama sem dizer mais nada, vestindo as roupas com pressa.
— Vou encontrar os caras — disse ele, de costas para mim, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.
Meu coração afundou. Eu sabia o que isso significava. Mais uma noite em que ele se jogaria na "vitrine", cercado por amigos e... outras mulheres. Mulheres que não o conheciam como eu conhecia, que não viam a dor por trás do sorriso confiante, mas que, ainda assim, conseguiam oferecer algo que eu, aparentemente, não podia.
— Você vai sair? — perguntei, tentando esconder o desapontamento que crescia em mim, mas falhando miseravelmente.
Ele deu de ombros.
— Só por algumas horas. É comemoração, Lis. O time inteiro vai.
Eu engoli em seco, sentindo o nó na garganta se formar. Comemorar. Claro, eles iriam comemorar. Mas ele não entendia que eu também queria fazer parte disso? Que eu também queria sentir que, de alguma forma, era importante para ele fora dessas paredes? Ao invés disso, eu ficava aqui, sozinha, enquanto ele ia viver sua vida, rodeado por gente que nem se importava de verdade com ele.
— Você poderia... ficar, talvez — sugeri, minha voz quase implorando, embora eu soubesse que isso só o afastaria mais.
Ele parou por um segundo, me olhando como se não entendesse o que eu estava pedindo. E talvez ele não entendesse mesmo. Para Gabriel, o que tínhamos era o suficiente. O sexo, a rotina, a presença física. Para ele, isso bastava. Mas para mim? Eu queria mais. Precisava de mais.
— Eu preciso sair um pouco — ele respondeu, desviando o olhar.
E foi aí que eu soube. O peso daquelas palavras me esmagou. Ele não ia ficar. Ele nunca ficava. E, no fundo, eu estava sozinha nessa relação. Não importava quantas vezes ele me tocasse, não importava o quanto eu quisesse que as coisas fossem diferentes, Gabriel estava sempre em outro lugar, em outra vida, e eu... eu era apenas o refúgio temporário, o consolo silencioso.
— Ok — sussurrei, virando o rosto para o lado, tentando esconder as lágrimas que já começavam a se formar.
Ele terminou de se vestir rapidamente e, antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, estava fora da porta. O silêncio tomou conta do quarto, e eu fiquei ali, sozinha, envolta no lençol, sentindo o vazio crescer.
O que eu estava fazendo comigo mesma? Eu queria tanto ser suficiente para ele, ser mais do que só um alívio depois dos jogos, mas a verdade era que eu nunca seria. Gabriel sempre encontraria algo lá fora que eu não podia oferecer. A adrenalina dos jogos, a euforia das vitórias, as festas, as mulheres que o cercavam, rindo e jogando charme. Eu era apenas a pausa entre esses momentos.
Fiquei deitada na cama por mais um tempo, tentando absorver tudo aquilo. O peso da solidão era insuportável, mas, ao mesmo tempo, me sentia incapaz de sair dessa situação. Por que eu continuava me permitindo ser tratada assim? Por que eu aceitava tão pouco quando, no fundo, sabia que merecia mais?
A resposta estava dentro de mim, em pedaços que eu tentava não encarar. Talvez fosse porque, como Gabriel, eu também carregava minhas cicatrizes. Meus traumas, as feridas que nunca cicatrizaram de verdade. Eu havia crescido em um lar onde o amor parecia ser algo inatingível, e agora, como adulta, me via presa nesse mesmo ciclo de buscar o impossível. Eu achava que, se o amasse o suficiente, se me entregasse o suficiente, ele iria me ver. Mas Gabriel nunca me veria de verdade. Ele estava preso no próprio mundo, cheio de pressões, expectativas e fantasmas.
Eu me sentei na cama, abraçando meus joelhos. Lágrimas silenciosas caíam no lençol, mas, como sempre, ninguém estava lá para vê-las. Gabriel estava em outra festa, em outra comemoração, cercado por gente que não sabia nada sobre ele. E eu? Eu ficava com o vazio, esperando o dia em que ele talvez percebesse o que estava perdendo.
Mas, naquele momento, eu duvidava que esse dia fosse chegar.
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Entre Cicatrizes e Silêncios-Gabigol
Fiksi PenggemarSinopse: "Você não vê que está me destruindo?" "Então, por que não me deixa aqui de uma vez?" "Porque eu me importo com você, mais do que deveria." Gabriel Barbosa, ex-camisa 10 do Flamengo, agora carrega o número 99, que simboliza o infinito - assi...