No caminho para casa enquanto eu olhava os carros passando do nosso lado, a vista das árvores balançando na sequência que o vento batia.
- Filha eu não consigo fingir que não está acontecendo nada. Você pode por favor falar comigo? Porque não quer fazer o tratamento?- suas mãos aperta o volante com força.
Ignoro sua fala e respiro fundo.
- quero passar um tempo na casa do meu pai- digo me virando para olhar seu rosto enquanto ela dirigi.
- não! Você não pode ficar longe de mim, ainda mas nesse momento.
- mãe, eu estou morrendo, não sei se a senhora está entendendo a situação. Eu tenho seis meses de vida! Preciso de espaço.
- Você é uma egoísta Mariana! Como pode querer ficar longe de mim, nem o tratamento você quer fazer!- ela ultrapassar outro carro fazendo todos eles buzinar.
-pense oque quiser de mim verônica!- ela me olha de relance após escutar seu nome sendo dito- vou hoje mesmo, não quero que conte para o meu pai sobre o diagnóstico.
- você não vai assim! Aquela favela é perigosa Mariana!- ela grita.
-eu vou morrer de qualquer jeito, me desculpa mãe, mas eu preciso fugir dos meus pensamentos- abro a porta do carro assim que chegamos em casa, deixando minha mãe falando sozinha
Subo até meu quarto e separo algumas roupas, coloco tudo dentro da mochila e vou até o banheiro tomar um banho.
...
Fazia anos que eu não subia o morro. Minha mãe sempre dizia que era perigoso, que eu não deveria ir lá. Mas hoje, eu precisava ver meu pai.
Com o coração acelerado, fui subindo as ruas estreitas e cheias de vida. O cheiro da comida que vinha das casas e as risadas das crianças trouxeram lembranças de um tempo que eu tentava esquecer.
Quando cheguei à casa do meu pai, bati na porta. Ele abriu rapidamente, e um sorriso meio cansado apareceu em seu rosto.
Atrás dele, vi um homem sentado de costas, com tatuagens que deixavam claro que ele não era alguém comum.
- Oi meu amor, entra. Estou terminando uma reunião com um cliente- disse meu pai, sem perceber que eu estava nervosa.
Entrei e me sentei em uma cadeira, tentando me manter discreta. O ambiente estava carregado, e eu ouvia só ouvia a conversa.
-Está tudo certo, doutor? Consegue ir nesda audiência?- perguntou, com uma voz firme, mas tranquila.
-Sim, eu cuido disso. Pode deixar- respondeu meu pai, ainda concentrado nos documentos.
Eu fiquei ali, observando, me lembrando de como era bom estar ali, mesmo com a tensão no ar.
O homem se levantou e, antes que eu pudesse pensar, ele saiu sem olhar para mim. Era a primeira vez que eu o via, mas parecia que eu conhecia aquela figura de algum lugar.
Depois que ele foi embora, meu pai finalmente se virou para mim. O sorriso dele não mudou, mas eu sabia que ele não via o quanto eu estava diferente depois de todos esses anos.
-Oi, filha! Como você está?- ele perguntou.
-Estou bem, pai- respondi, mas dentro de mim havia um turbilhão de emoções. Eu queria contar sobre tudo, mas ainda não era o momento. Apenas sorri, guardando mais um segredo.
-Que bom! Faz tanto tempo que você não vem aqui. Vamos comer algo. Eu fiz um lanche rápido - ele disse, já se levantando e indo em direção à cozinha.
Senti meu estômago roncar. Apesar do nervosismo, a ideia de comer algo feito por ele me deixava um pouco mais tranquila. Levantei e o segui até a pequena cozinha.
-Você ainda faz aquele lanche com ovo e queijo que eu adoro?- perguntei, lembrando de como eu sempre pedia isso quando era mais nova.
-Claro! Sempre que você vem, eu faço. Se senta aí, vou preparar- ele respondeu, pegando os ingredientes. O movimento dele era familiar, como se o tempo não tivesse passado.
Enquanto ele começava a fritar os ovos, aproveitei para olhar ao redor.
A cozinha tinha o mesmo cheiro de sempre, mas agora parecia mais simples. Lembrei de todas as vezes que ele me contava histórias enquanto cozinhava.
-Como estão as coisas por aí? E os estudos? - meu pai perguntou, enquanto mexia na frigideira.
Ele nem sabia que eu já tinha terminado a escola a dois anos atrás...
- Bem. Eu não estudo mas pai- digo de forma tranquila e ele rir se lembrando
- verdade- ele sorrir- é tanta coisa na cabeça filha, você não tem ideia, mas se quisser fazer um curso ou faculdade só falar, que eu estou aqui para te apoiar no que precisar.
Eu sorri, mas por dentro, uma parte de mim queria gritar. Como eu poderia contar a ele sobre meu câncer? O que ele diria? Mas agora, ali, com ele me apoiando, eu me sentia um pouco mais forte.
- a mãe te falou algo?- pergunto me levantando indo em sua direção.
Seus olhos são confusos e ele puxa o celular do bolso, provavelmente vendo muitas mensagens da minha mãe.
- ela mandou várias mensagens, e também me ligou...- ele fala enquanto ler mas logo franze a sombrancelha. - que?
Permaneço séria vendo suas reações.
- pelo visto, ela não cumpriu promessa- digo ao ver seus olhos assustados.
-como assim câncer?- a voz dele era trêmula, um choque talvez.
-eu estou com câncer de pâncreas...- digo de uma vez- não quero fazer tratamento pai, eu sei que é difícil mas eu só tenho 6 meses de vida, não quero focar presa em um hospital tentando achar solução que não tem cura.- falo rápido colocando tudo para fora.
Mas meu pai invés de me julgar, ele me abraçou. Dessa vez eu chorei tudo que estava guardado, e eu nem sabia.
- filha... eu sinto muito- sua voz mostrava dor- eu vou sofrer muito com isso, mas respeito sua escolha.
-obrigada pai- digo ainda abraçada nele. Ele deixou um beijo na minha testa, me passando proteção, eu amava meu pai.
...
VOCÊ ESTÁ LENDO
ATÉ UM DIA
FanfictionMariana descobre que está com câncer, e decide viver seus últimos meses como nunca. Ela passa um tempo na casa do seu pai que mora na favela, vivendo várias experiências, até que ela encontra ele... 23/10/24