A loira sentiu o coração pesar ao ver seu filho mais velho sair da sala com um olhar sombrio, os passos firmes e decididos como se cada um deles carregasse toda a fúria que ele não conseguia expressar em palavras. Lorenzo, com o temperamento tão explosivo e imprevisível quanto o do pai, havia deixado escapar palavras que feriram profundamente. Mesmo para ela, sua mãe, aquelas palavras soaram como lâminas afiadas, cortando a harmonia que ela tanto tentava manter na família. Atrás dele, Enrico seguiu, ansioso para apaziguar o irmão, como sempre fazia, com sua paciência inabalável e desejo de proteger a todos.
Giorgia ficou em silêncio por um momento, observando a cena se desenrolar. Ela sabia que os filhos, no fundo, tinham uma ligação forte e poderiam se entender, mas seu coração materno não conseguia ignorar a inquietação que lhe corroía. Seu olhar voltou-se para Angel, e a encontrou subindo as escadas rapidamente, carregando no rosto a tristeza e o choque das palavras duras que ouvira. Antes disso, havia parado ao lado de Donnatela, e escutado algo que não agradou, mas a matriarca notou de imediato que Donnatela, cuja a presença nunca lhe agradara por completo, mantinha a expressão fria, como se não se importasse com a dor da garota.
─ Qual é o seu problema? Ela é sua irmã, deveria apoiá-la! ─ murmurou Giorgia, irritada com a indiferença de Donnatela, que a encarou com desdém antes de virar o rosto, aparentemente sem disposição para discutir.
Sentindo uma urgência crescente, Giorgia deixou Donnatela para trás e seguiu Angel. Apesar de não ser sua filha biológica, Angel havia se tornado uma parte da família ao longo do tempo que passará ali, e Gio sentia um profundo carinho por ela. Mais do que isso, ela prezava pela união entre os membros da casa e não tolerava desrespeito ou palavras desnecessariamente cruéis, ainda mais dentro de sua própria casa. O que Lorenzo havia dito, com seu temperamento explosivo, não fora apenas uma explosão de raiva havia algo mais profundo, uma mágoa que parecia enraizada, e Angelina acabara se tornando o alvo involuntário daquela tempestade.
A mais velha, subindo as escadas com passos firmes, refletia sobre o filho. Sabia que o temperamento tempestuoso de Lorenzo era reflexo direto do pai, e isso sempre fora um desafio. Lucy, com sua ternura e paciência infinitas, conseguira por um tempo suavizar o espírito rebelde do filho mais velho, mas desde a partida dela, Lorenzo parecia carregar novamente um peso, uma casca endurecida que afastava todos ao seu redor. Havia uma bondade latente nele, algo que Giorgia conhecia bem, mas que poucos conseguiam ver.
Ao chegar à porta do quarto de Angel, a mulher respirou fundo antes de bater, preparando-se para a conversa. Sabia que precisava encontrar o equilíbrio entre a dureza necessária para manter a ordem e o acolhimento que Angel tanto precisava. Não estava ali para defender as ações de Lorenzo, mas sim para ajudá-la a ver além da superfície. Por trás da figura dura e muitas vezes cruel de seu primogênito, havia um homem que, como todos ali, também carregava suas próprias feridas. Giorgia queria que Angel entendesse que não era algo pessoal ─ ao menos era o que ela achava ─, que aquele temperamento agressivo era apenas uma fachada que ele usava para esconder as próprias inseguranças e tristezas.
Giorgia sentou-se ao lado de Angel na cama, seu coração apertado ao ver as lágrimas deslizarem pelo rosto da garota, borrando a maquiagem que antes realçava sua beleza suave. Com delicadeza, afastou alguns fios de cabelo loiro que haviam caído sobre o rosto de Angel, deixando o caminho livre para enxergar a dor estampada em seus olhos. A garota tentava falar entre soluços, as palavras saindo entrecortadas pela tristeza que Lorenzo havia lhe causado. Cada palavra, cada lágrima, fazia o coração da mulher se despedaçar.
Gio tentava aliviar o peso no coração da menina, mas notou que suas palavras pareciam fazer pouco efeito. Ao contrário, a tristeza de Angel parecia se aprofundar, como se cada tentativa de consolo a lembrasse ainda mais da dor que sentia. Uma parte de Giorgia sentia uma vontade imensa de dar umas boas palmadas em Lorenzo, que aos 27 anos, ainda agia como uma criança birrenta, incapaz de conter seus impulsos.
Angel deu um leve sorriso, sentindo o apoio e o carinho genuíno de a mais velha. Ela se ajeitou na cama, agora ao lado da mulher que tanto a acolhera, e com as costas das mãos, tentou limpar as lágrimas, recuperando aos poucos a compostura. Então, como se uma dúvida inesperada a tivesse invadido, levantou o olhar para a matriarca e fez uma pergunta que a pegou completamente de surpresa. Uma pergunta que, em toda a sua vida ao lado de Donato, ela jamais imaginou ouvir de outra pessoa.
Giorgia suspirou, perdida nas lembranças, e um brilho suave iluminou seus olhos enquanto ela contava uma parte de sua própria história, algo íntimo que guardava no coração.
─ Eu também fui uma princesa da máfia, criada para casar com alguém desde que me entendo por gente... ─ murmurou com a voz embargada. ─ Minha vida inteira girou em torno desse destino, e no começo... no começo foi muito difícil. Tantos desafios, tantas renúncias. Mas, quando vi Donato pela primeira vez, senti algo que nunca havia sentido. Foi imediato, uma espécie de encanto que se transformou em amor nos meses seguintes, mesmo quando ele parecia não me retribuir da mesma forma.
Gio fez uma pausa, seu olhar se perdendo na memória de Donato. Cada momento ao lado dele era como um tesouro guardado, um pedaço de uma história que ela contava apenas para si mesma. Ela fechou os olhos por um instante, quase como se pudesse sentir a presença do marido ali ao seu lado, como nos dias em que seu amor havia se tornado o centro de tudo.
─ E então, nós construímos um casamento lindo. ─ continuou, voltando a realidade, mas com um sorriso leve e nostálgico nos lábios. ─ Nos amávamos profundamente, e era esse amor que nos unia, mesmo em meio aos maiores desafios. Não foi fácil, mas era real, era verdadeiro.
Giorgia virou-se novamente para Angel, percebendo o olhar atento da jovem, que parecia absorver cada palavra. A proximidade com a garota havia se tornado algo natural, quase como se ela fosse realmente parte da família.
─ Se sua preocupação é o amor, saiba que, se você e Enrico não estão nesse ponto ainda, dê tempo ao tempo. O que é mais importante vocês já têm... vocês se gostam, certo? ─ Ela sorriu, apertando de leve a mão de Angel. ─ Eu posso ver nos olhos do meu filho... ele está encantado por você.
Em um gesto maternal, Giorgia inclinou-se e beijou o topo da cabeça da garota, sua mão segurando com firmeza a dela, como se lhe desse forças para enfrentar o que estivesse por vir.
─ Meu conselho, minha querida, é que você siga seu coração. Estaremos sempre aqui para você, seja qual for sua escolha, porque somos sua família, mesmo que um dia você não se case com meu filho. Você já faz parte da família Mattioli, e isso não vai mudar.
Angel fechou os olhos, absorvendo aquelas palavras que, pela primeira vez, a fizeram sentir que pertencia de verdade a algum lugar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
𝗙𝗜𝗥𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗕𝗟𝗢𝗢𝗗 - @𝗅𝟢𝗌𝗍𝗋𝖾𝗂𝖽
Roman d'amour✦ 𝑆𝐼𝑁𝑂𝑃𝑆𝐸 Lorenzo Mattioli, o calculista e implacável líder da Cosa Nostra, carrega nos ombros o peso de um império herdado, erguido sobre o sacrifício do pai, consumido por uma longa e amarga doença. À frente da máfia mais temida da Itália...