Enrico observava cada detalhe na expressão encantada de Angelina enquanto ela caminhava ao seu lado. O brilho em seus olhos parecia se intensificar a cada nova paisagem da cidade que desvendavam juntos, como se ela visse algo que poucas pessoas eram capazes de enxergar. Havia uma sintonia entre eles, um entendimento mútuo e silencioso que transcendia o óbvio. Aquela cidade era mais do que simples ruas e construções; ela carregava histórias, memórias e sentimentos que o tempo havia impresso em cada pedra. Para o rapaz, era fascinante como Angelina parecia entender isso, como se sentisse a mesma conexão profunda que ele sentia.Ele não pôde evitar sorrir ao ouvir as palavras dela. Sabia que Angelina gostava de pintar, ela havia mencionado isso algumas vezes, mas naquele instante, em meio ao cenário encantador que os rodeava, parecia que essa paixão dela pela arte ganhava um sentido ainda mais vívido. Não era apenas o talento ou o desejo de capturar a beleza em telas havia uma intensidade, uma paixão genuína que resplandecia nela. Angelina não era apenas educada, bonita e encantadora; ela possuía uma sensibilidade rara, um olhar para o mundo que ia além da superfície. Era algo que Enri admirava profundamente, pois em cada gesto e palavra dela havia um toque de arte, um reflexo de alguém que vê beleza até nos detalhes mais sutis.
Em outra vida, talvez ele tivesse se apaixonado por Angelina. Ela era o tipo de pessoa que deixava marcas em quem a conhecia, como se cada sorriso, cada risada suave, cada expressão de encanto gravasse uma memória em quem estivesse ao seu redor. Em sua mente, Enrico divagava por um instante, imaginando como seria sortudo o homem que um dia conquistasse o coração dela, um homem que tivesse a sabedoria de reconhecer e preservar a preciosidade que ela era. Angelina era encantadora em cada célula de seu ser, e ele sabia que, se os caminhos deles fossem outros, ele poderia ter se permitido apaixonar por ela de forma inevitável.
- Você vai poder ter um estúdio de pintura na nossa casa - disse ele, sentindo uma ternura inesperada crescer em seu peito. - Decorar do jeito que quiser, colocar todas as suas obras nas paredes. Nossa casa vai ser um espaço para você expressar toda essa arte que carrega dentro de si.
Por um momento, Angelina o encarou com os olhos brilhando, como se aquelas palavras a tivessem tocado profundamente. Era raro encontrar alguém que valorizasse tanto sua paixão, e o olhar que ela lançava para Enrico era de gratidão, de surpresa e de algo mais difícil de definir, uma conexão que nascia ali, simples e sincera. O simples gesto dele oferecer um espaço só para ela, onde poderia ser quem era e criar livremente, fazia algo se aquecer dentro da garota.
Enquanto caminhavam lado a lado, Enrico se deu conta de que, apesar de Lorenzo ser seu confidente e a pessoa que conhecia todas as suas camadas, ao lado de Angelina ele começava a experimentar um tipo diferente de proximidade. Havia nela uma doçura, uma delicadeza quase escondida, mas que se revelava a cada palavra, a cada sorriso tímido. Era como se, com cada passo que davam juntos, ele descobrisse uma nova faceta dela, algo único e encantador. E ele gostava disso, gostava de saber que, mesmo que não houvesse espaço para um romance, havia ali o potencial de uma amizade verdadeira, algo que não precisaria de palavras para ser compreendido.
- Eu gosto de vir para cá, comer o melhor cannoli de todos, com pistache. Mio Dio! é tão bom!
Os dois se aproximaram de uma das barraquinhas decoradas com tecidos vibrantes e aromas doces. A senhora atrás do balcão, uma figura envelhecida pelo tempo, com os olhos vivazes e um sorriso acolhedor, começou a falar animadamente em sua língua natal. Enrico inclinou-se com delicadeza, e num gesto de afeto e respeito, beijou a curva da mão da senhora. Ela sorriu de volta, e seus dentes, amarelados pelos anos, brilhavam com simpatia genuína. Em um movimento rápido e carinhoso, a senhora pegou dois cannolis fresquinhos, colocando-os nas mãos de Enri, que agradeceu com um aceno, antes de entregar um deles para Angelina.
- Venho aqui tantas vezes que ela quase já me chama de neto. - ele comentou, com um sorriso divertido nos lábios, os olhos brilhando enquanto observava Angelina experimentar o doce.
O rapaz deu um suspiro, hesitando por um instante, talvez imaginando o que Angelina pensaria de tudo aquilo. Ele podia sentir a curiosidade dela, aquela dúvida sobre até que ponto aquelas pessoas sabiam quem ele realmente era. Como se quisesse acalmá-la, continuou, com uma doçura inesperada na voz:
- Todos aqui me conhecem, a Lorenzo, minha mãe... Eles não se importam com o que somos, porque sabem que são protegidos e cuidados por nós. Meu irmão... ele tem essa imagem de leão feroz, mas no fundo é só um gatinho manhoso.
A sinceridade de Enrico pegou Angelina de surpresa, e ela soltou uma risada espontânea, contagiando-o. Ele percebeu o que acabara de dizer e riu também, imaginando como Leo reagiria se soubesse daquilo. A imagem do irmão o repreendendo por aquela pequena traição quase o fez rir mais alto, mas ele conteve o riso, voltando-se para Angelina com um ar divertido e cúmplice.
- Por favor, não conte isso a ele - ele implorou, em tom de brincadeira. - Quero ter a chance de me casar com você antes de morrer.
As palavras flutuaram no ar, cheias de uma mistura de humor e de algo mais profundo, algo que fazia o coração de Angelina acelerar. Ali, no meio da feira simples, cercados por aromas e vozes, aquele pequeno instante parecia capturar algo precioso.
Enquanto saboreava o cannoli, Enrico voltou a refletir sobre a pergunta de Angelina, se perguntando, no fundo, o que realmente lhe trazia alegria. Ele mordeu o doce lentamente, como se cada pedaço ajudasse a clarear os próprios pensamentos. Imediatamente, sua mente o levou ao sorriso de Louis, à forma como o menino iluminava qualquer ambiente apenas sendo ele mesmo. No entanto, Enri sabia que a verdade completa não podia ser dita naquele momento. Então, respirando fundo, decidiu pela meia-verdade, optando por revelar apenas uma parte de seu coração.
- Bom... - ele começou, com um sorriso quase melancólico. - Gosto bastante de festas, de certa forma elas têm um jeito de fazer o tempo passar mais rápido, como se por algumas horas eu pudesse esquecer o resto. E gosto de jogar golfe com o Leo. - ele riu, lembrando-se das disputas com o irmão e de como aquele tempo juntos sempre parecia ser um momento de reconexão. - Mas, quando eu realmente quero paz... ir até a casa de Giorgia é o que me traz isso. Pode parecer infantil, eu sei, mas o colo de mãe é uma das coisas mais preciosas que temos.
Ele fez uma pausa, observando o rosto de Angelina enquanto sentia o peso das palavras que ainda precisava expressar. Seus olhos brilharam suavemente, e ele prosseguiu, com um tom mais íntimo, quase um sussurro.
- Um almoço de família... Aquela sensação de pertencimento, de saber que, ao final de tudo, existe um lugar onde você é simplesmente você. E, quando nos casarmos, você será isso para mim. Esse refúgio, esse lar.
Angelina o olhava com um brilho surpreso nos olhos, talvez pela sinceridade inesperada dele. Era um vislumbre do que Enrico realmente guardava no coração, algo além das aparências e do papel que ele representava para o mundo. Mas, mesmo enquanto ele pronunciava aquelas palavras, cada pensamento seu era invadido pela lembrança de Louis. A imagem do menino alegre, os olhos brilhando de felicidade, a maneira como sua presença parecia colorir até os dias mais cinzentos.
Aquela era uma verdade que ele não poderia compartilhar abertamente, mas que, de alguma forma, ele tentava traduzir em suas palavras. E, ainda que Angelina não soubesse da profundidade daquele sentimento, Enrico sabia que ele jamais deixaria de carregar Louis em seu coração. Ele respirou fundo, tentando afastar a dor doce daquela lembrança, enquanto continuava a sorrir para Angelina, mantendo aquela parte de si em silêncio, mas ainda assim presente, em cada palavra não dita.
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𝗙𝗜𝗥𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗕𝗟𝗢𝗢𝗗 - @𝗅𝟢𝗌𝗍𝗋𝖾𝗂𝖽
Romance✦ 𝑆𝐼𝑁𝑂𝑃𝑆𝐸 Lorenzo Mattioli, o calculista e implacável líder da Cosa Nostra, carrega nos ombros o peso de um império herdado, erguido sobre o sacrifício do pai, consumido por uma longa e amarga doença. À frente da máfia mais temida da Itália...