𝗙𝗜𝗥𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗕𝗟𝗢𝗢𝗗 - @𝗅𝟢𝗌𝗍𝗋𝖾𝗂𝖽

𝟐𝟎 ⌁ 𓈒 ֹ ANGELINA CORVETTI ˳ׄ ⬞

- Eu tenho certeza! Quero me casar com você, Enrico. Quero ser feliz ao seu lado.

Quando nos sentimos mal, é o cérebro sussurrando que há algo fora do lugar, uma ferida escondida, uma tensão não resolvida. Em outras palavras, esses sentimentos pesados são convites à ação. Da mesma forma, os sentimentos bons são como uma recompensa sutil, uma carícia invisível que nos faz lembrar que estamos no caminho certo, que alguma escolha nossa encontrou eco no que há de harmonioso no mundo.

Então por que Angelina não se sentia bem com a decisão que acabara de tomar?

A pergunta é outra.

Até onde você pode seguir pelo caminho errado antes que seja tarde demais para voltar para o certo?

Os olhos da loira vagavam pelo quarto, como quem busca uma saída invisível, um escape no próprio ar. Angelina não queria fugir de Enrico, seu desejo era escapar de si mesma. Havia uma urgência em poder sair do próprio corpo, nem que fosse por breves segundos. Gostaria de ver a situação de fora, buscar conselhos nos ecos do silêncio, olhar tudo com uma perspectiva alheia e, quem sabe, encontrar no reflexo uma voz amiga capaz de guiá-la. Decidir por si mesma parecia agora algo inalcançável; o medo de errar enraizava-se fundo, imobilizando-a.

Antes que o silêncio se transformasse em pergunta, Enrico rompeu com a resposta que apertava seu peito, ansiosa e temida.

Lorenzo não estava bem.

As palavras cortaram o ar ao redor de Angelina. Ela abriu a boca, mas o fôlego a abandonou; sentiu-se desamparada, perdida num vácuo onde até a força parecia lhe escapar.

Muitas pessoas aprendem a reprimir suas emoções, seja por razões pessoais, pressões sociais ou normas culturais - especialmente as emoções ditas negativas. Mas, ao sufocar essas reações naturais, elas também bloqueiam os mecanismos de resposta que, paradoxalmente, poderiam ajudá-las a enfrentar as dificuldades. E assim, acabam incapazes de lidar com os próprios dilemas ao longo da vida. Se não conseguem resolver seus conflitos internos, como podem aspirar à felicidade? Toda dor tem seu propósito. E Angelina já se acostumara com a sua, como se fosse uma parte de si mesma, uma pele que a revestia. Até que, inesperadamente, surgiram novas razões para lhe trazer sofrimento.

Diante de Enrico, que desmoronava lenta e irremediavelmente em sua frente, a jovem tentou manter-se firme, mesmo que seu mundo interior estivesse em ruínas. As lágrimas dele escorriam pelo rosto, expondo a vulnerabilidade que ele guardava como um segredo, como algo que nem ele se permitia sentir.

Angelina Corvetti nasceu no coração da máfia. Desde sempre, viu e ouviu de perto os homens mais cruéis que uma alma poderia presenciar. Aprendeu cedo que, nesse universo, dor e maldade são leis, que ali não existe espaço para misericórdia, tampouco para fraquezas. Na máfia, moldam-se rochas no peito dos homens - ao menos, era o que ela sempre acreditara ser verdade.

Mas estava errada.

Angelina presenciou duas vezes algo raro, quase impensável: os dois homens da família mais temida da Cosa Nostra, o Don e seu Subchefe, desnudos em sua dor. Homens que tantas vezes carregaram o peso do sangue alheio nas mãos, agora deixavam transbordar lágrimas silenciosas. Choravam porque sentiam dor; porque, por trás da couraça, existia medo - sentiam tudo pois, afinal, eram humanos.

O choro contido de Enrico rasgava o coração de Angelina, que desejava, num impulso insano, tomar para si o peso daquela angústia que o esmagava. Mas, mesmo que pudesse, antes precisaria se libertar de suas próprias dores, do medo que também lhe paralisava - o mesmo medo que assombrava Enrico. O medo de enfrentar um mundo sem Lorenzo.

- Ele vai ficar bem, Enri. - A voz dela soou suave, mas havia uma força secreta ali, assim como em sua mão, que apertava firme a dele. - Ele é o homem mais forte que você conhece, não é? Já enfrentou tanta coisa, é temido por tantos... - Angelina exalou o ar lentamente, esboçando um sorriso que tentava ser um raio de esperança. - É o nosso Don. E continuará sendo. E você, meu bem, é o braço direito dele.