Ele havia caído no chão com o peso que Sarah havia exercido assim que Harry puxou o gatilho; os olhos se abriram com dificuldade, tentando a todo custo ter cuidado com o corpo que havia sido jogado sobre si. Ergueu o pescoço, notando a respiração frenética da morena bater contra a sua cintura, os olhos castanhos estavam acesos como dois faróis iluminando uma pista escura, algumas lágrimas brotavam enquanto um sorriso perdido desenhava seus lábios secos. Resgatando a pouca força que ainda possuía, John desvencilhou-se lentamente da mulher e assim que virou-a no chão, notou a mancha vermelha que se formara em seu peito. Prendeu a respiração, sentindo uma dor aguda percorrer sua espinha, como se tivesse sido o alvo daquele tiro; e teria sido a sua vida em jogo, caso ela não entrasse em sua frente. Tentou sentir remorso, tristeza, agradecimento, buscou em seu interior qualquer vestígio de sentimento bom para poder encarar aquela cena com menos frieza, mas não conseguiu. Apenas trocaram olhares, como se despedissem, como se soubessem que toda aquela tortura finalmente havia chegado ao fim. John ficou de pé, afastando-se pouco a pouco daquela que um dia amou... Daquela a quem tinha devotado toda sua confiança e respeito.
— John... — ouviu seu nome ser chamado num sussurro.
Naquele instante, no momento em que ultrapassou o corpo deitado no chão, pôde sentir a corrente que ligava toda sua vida a Sarah ser quebrada. Enfim, sentiu-se livre e notou que todo o seu futuro estava ao lado da loira ainda desacordada no sofá. Agachou-se rapidamente, deslizando sua mão pela face machucada da companheira.
— Aguente firme — murmurou, tentando evitar o cheiro de sangue fresco.
— Você sempre teve tudo o que desejou — ouviu a voz de Harry quebrar o silêncio. — John Cowen, o primeiro da turma no colegial. John Cowen, o primeiro a ter o nome gravado na porta do Departamento. John Cowen, premiado por não fazer absolutamente merda nenhuma! — alteou a voz, suas mãos tremiam. O revólver ainda suspenso no ar, possuindo um endereço certo caso ele atirasse. — Quando encontramos a Sarah naquele beco... Eu tinha plenas condições para salvá-la, mas você com essa pose ridícula de herói fez questão de entrar em meu caminho. Você sempre fodeu com minha vida. Sempre.
— Harry, está tudo acabado — o agente disse, as sobrancelhas unidas. Suas expressões nunca estiveram tão cansadas. — Esqueça essa história, esqueça essa maldita raiva! Nós éramos amigos, cara.
— Nunca — retrucou imediatamente, um sorriso forçado desenhando os lábios finos. — Não me chame de amigo, pois nunca o considerei dessa forma. E agora, veja... Você matou a Sarah.
— Tudo bem — John deu de ombros, ignorando a última frase. Voltou seu olhar para Ashley. — Não tenho tempo para suas crises existenciais.
— Você nunca tem tempo para ninguém — aproximou-se. — Só existe tempo para a porra da sua vida medíocre.
— Vida medíocre? Não sou eu quem está com uma arma na mão tentando tirar a vida de mais alguém.
John inspirou profundamente, controlando a raiva que surgia em seu interior; em outras circunstâncias partiria para cima dele, proferindo todos os piores tipos de palavras que tinha guardado em seu arsenal. Mas, todo aquele tempo e as situações que havia vivenciado, só lhe mostravam o quanto não possuía mais horas de sua vida para gastar. Encaixou o corpo de Ashley em seus braços, erguendo-a com facilidade e ao se virar para dizer algumas últimas palavras para o homem atrás de si, ouviu disparos. Subitamente, o corpo de Harry foi de encontro ao chão, caindo exatamente ao lado de Sarah. John sentiu o estômago embrulhando, um gosto cítrico lhe atingindo a boca, uma onda de náuseas percorrendo sua estrutura; Harry estava morto. Assim como Sarah. As duas informações ainda estavam sendo processadas, quando escutou a porta abrindo-se atrás de si. Estaria sendo desumano demais por não demonstrar nenhum interesse nas duas criaturas que, um dia ele pensara fazer parte de sua vida? Seus olhos ardiam, não por sofrimento, talvez por pena. Sentiu alguém tocar-lhe o ombro e tudo começou a acontecer de forma lenta, um progresso que parecia não ter fim.
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AGENTE 027
Romance[book one] Dono de casos bem-sucedidos e medalhas de honraria, o agente especial do FBI, John Cowen, carrega consigo uma lista de qualidades - e outra de defeitos. Precisa administrar sua vida secreta com a responsabilidade de criar um filho sozinh...