Capítulo três.

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O enterro ocorreu de forma rápida, com poucas pessoas, e com expressões frias. Passei o enterro inteiro segurando a mão de Maya. Ela não chorou em momento algum, mas eu sei que ela fazia um esforço absurda para segurar as lágrimas. A menina era forte. Forte de uma maneira que eu não fui quando minha mãe morreu. Lembro de ter chorado muito no enterro dela. Chorei sentado no chão, com a cabeça encostada no joelho da minha outra avó, mãe da minha mãe. Ela foi outra muito forte. Lembro de ver seu rosto vermelho e seus olhos inchados, prendendo lágrimas. Ela não queria me assustar, por isso passou o enterro inteiro acariciando meu cabelo e sussurrando que estava tudo bem. Meu avô chorou... chorou muito, junto comigo. Em algum momento do enterro da minha mãe, ele sentou no chão, ao meu lado, pegou em minha mão e chorou, com os ombros curvados e o corpo tremendo. E mesmo que naquele momento eu me sentia fraco por estar chorando, ao olhar meu avô, eu não vi fraqueza alguma naquele homem. Ele era forte, foi um ótimo pai, e eu tinha muito orgulho dele.

Meus avós maternos hoje moravam em Los Angeles, e sempre que dá, eu os visito. Ainda admiro muito eles, e essa parte da família é a única que faz eu me sentir bem. Minha família materna é a única que eu considero família.

E bom, tem a Maya. Ela não é da minha família materna, e é da parte que eu não considero família, mas mesmo assim eu faria tudo por ela. Ela é do meu sangue, ela é da minha família. Sem partes distintas, ela pertencia ao meu clã.

Quando o enterro chegou ao fim, tive que cumprimentar as poucas pessoas que ali compareceram. Todos me davam abraços apertados, como se eu realmente sentisse. Já com Maya, que permanecia ao meu lado, todos apenas lhe beijavam a testa e a olhavam com compaixão. É compreensível...

Assim que voltamos para casa, a empregada levou Maya para o quarto e eu fui para a cozinha, tomar um copo d'água. Quando cheguei lá, minha avó estava encostada no balcão do centro, enchendo um copo com Whisky. Ela me olhou, com a superioridade e o desprezo de sempre, e suspirou, revirando os olhos e tomando um longo gole da bebida.

- Não conte ao seu avô. –ela murmurou e eu quase sorri-

- Ele já está dormindo. –eu murmurei e me aproximei, passando por ela e pegando em um copo, caminhando até a geladeira e pegando uma jarra de água-

- O quão irônico é isso... –a ouvi murmurar e a olhei- Eu, uma senhora de setenta anos, bebendo whisky, e você... bebendo água. –eu revirei os olhos ao ouvir o desdém de sua voz-

- Não vejo qual o problema. –murmurei e ela riu, já mais bêbada do que eu imaginava-

- Ainda lembro de você chegando em todos os eventos da família, embriagado, Joseph. Tropeçando em seus próprios pés, rindo à toa e debochando de sua família. –ela falou e eu ri, balançando a cabeça-

- Minha família. –eu murmurei debochado e ela suspirou- Irônico é você dizer isso, vovó, sendo que quando eu mais precisei, a minha amada "família", não me deu a mão. –eu murmurei agora mais amargo-

- Claro que não demos a mão. –ela falou indignada- Tentamos ajudar, Joseph, mas você apenas foi ingrato e não aceitou nossa ajuda. –ela falou e eu fechei meu sorriso debochado-

- Vocês tentaram me internar. –eu lembrei com uma careta de desprezo-

- Sim, você estava fora de si. Inventando coisas, brigando com todos, bebendo todos os dias. –ela falou e eu joguei o copo dentro da pia, vendo o vidro se quebrar em pedacinhos-

- Nunca inventei porra nenhuma. –eu falei e ela ergueu a sobrancelha, debochada- Você sabe o que o meu pai fez. Não seja hipócrita. –eu falei e vi seu rosto se transformar em pura raiva-

- Seu pai não está mais aqui para se defender de suas mentiras descabiveis, Joseph! –ela gritou e eu revirei os olhos-

- Nem no passado ele estava, não é mesmo? Ocupado demais com o trabalho dele. –eu debochei e senti a lateral do rosto arder, pelo tapa que recebi da minha avó-

- Eu tenho nojo de você, moleque. –ela murmurou e eu ri, passando a mão pelo rosto-

- É reciproco, vovó. –eu falei e me virei, para sair da cozinha, mas dei de cara com meu avô-

Dele sim eu sentia falta. Meu avô paterno sempre foi um bom homem, apenas manipulado pelas tramas do meu pai e de minha avó. E ele estava sofrendo, isso era nítido.

- Foi um longo dia. –ele murmurou e eu assenti- Vocês podem, por favor, não brigar? –ele pediu e eu suspirei, pousando a mão no meu ombro-

- Desculpa, vô. –eu murmurei e ele assentiu, segurando meu rosto com as duas mãos-

- Joseph... –ele murmurou e eu forcei um sorriso- Tudo ficará bem. –ele falou e eu assenti-

- Claro que vai. –eu falei e ele me soltou-

Ele passou por mim, e eu permaneci na ombreira da porta da cozinha. Da porta mesmo, eu olhei o pé da escada e vi Maya, com os olhos arregalados, o semblante assustado e os cabelos bagunçados.

Eu assenti brevemente para ela, lhe lançando um sorriso fraco enquanto me virava brevemente, para olhar para minha avó amuada, já sem seu copo de whisky que meu avô havia tirado dela.

-Maya vai para Nova York comigo. –eu decretei, e nada, nem ninguém, mudariaisso-    

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