capítulo 31

30 4 7
                                    

- Isso é uma mera questão de perspectiva - salientou Matthew. - De qualquer maneira, em um hotel, as únicas pessoas que entram e saem são os funcionários, e eles batem à porta antes de entrar e não trazem "cachorrinhos" consigo. - Aproximando-se apertou o queixo dela com cari­nho.

- Mas vou deixar que cozinhe para mim, irmãzinha.

- Você é o melhor irmão do mundo, Matthew.

- Já comeu o rocambole de frango que ela faz, Uckermann?

- Acho que ainda não.

- Não sabe o que está perdendo - completou Matthew, com um sorriso. Voltando-se para Dulce, acrescentou: - Esse pode ser nosso cardápio para hoje, irmãzinha?

Ela revirou os olhos.

Não deixava de ser uma maneira interessante de passar á noite, pensou Christopher algum tempo depois, observando Dulce conversar com o irmão. Lembrava-se de que o relacionamento que tinha com sua irmã era mais ou menos como aquele. Pelo menos até Pamela aparecer em sua vida.

Depois disso, evidentemente que continuara a haver afeição entre eles, mas a descontração de­saparecera. Com freqüência, passara a se sentir pouco à vontade na presença da própria irmã, coi­sa que nunca acontecera antes.

Mas ficar pouco à vontade era algo que estava longe da atmosfera familiar que envolvia os Saviñon. Dulce e Matthew contavam histórias embaraçosas a respeito um do outro com a mesma facilidade com que contavam piadas, caindo na gargalhada como se aquilo fosse a coisa mais na­tural do mundo.

Algumas horas depois, ao deixar o apartamento de Dulce, pensou na possibilidade de trabalhar algumas características dos dois em seus perso­nagens, no segundo ato de sua peça, para dar ao texto um ar mais leve e cômico.

Trabalhar seria seu melhor consolo pelo resto da noite, já que, pelo visto, Dulce ficaria algum tempo ocupada com assuntos familiares.

- Gostei do seu amigo - falou Matthew, sen­tando-se no sofá e esticando as pernas, enquanto saboreava o conhaque que Dulce havia aberto em sua homenagem.

- Que bom, porque eu também gostei de Christopher.

- Ele pareceu um pouco sério demais para você.

- Ah, bem... - Dulce sentou-se ao lado dele. - Mudar um pouco de estilo de vez em quando não faz mal a ninguém.

- É só isso que ele representa para você? - Matthew deu-lhe um carinhoso puxão de orelha. - Notei que vocês não perderam tempo em aproveitar ao máximo o momento em que os deixei sozinhos, quando fui dar um telefonema lá em cima.

- Se estava dando um telefonema, como pode saber o que eu e Christopher estávamos fazendo? A menos que tenha ficado nos espiando...

Ela sorriu e pestanejou, não tardando a levar outro puxão de orelha.

- Eu não estava espiando. Apenas olhei por acaso para o andar de baixo, em um momento bastante estratégico. Além disso, também notei o detalhe de Christopher haver olhado para você, por várias vezes durante o jantar, como se estivesse considerando-a mais apetitosa do que o prato prin­cipal. Então somei dois mais dois e tirei minhas próprias conclusões.

- Você sempre foi brilhante, Matthew. Portan­to, acho melhor eu confessar a verdade de uma vez, já que está sendo intrometido: Christopher e eu estamos juntos.

- Você está dormindo com ele.

Dulce arregalou os olhos deliberadamente.

- Matthew! - exclamou, fingindo estar escan­dalizada. - Claro que não! Nós decidimos trocar apenas alguns beijinhos e tentar lidar com o resto apenas como bons amigos.

Matthew estreitou o olhar.

- Você sempre foi muito engraçadinha.

- Foi assim que conquistei minha fama e mi­nha fortuna, meu caro.

- E agora está mantendo a "fortuna" transfor­mando Uckermann no amigo muito sério e carran­cudo de Emily.

- Como eu poderia resistir?

Matthew tamborilou os dedos sobre o braço do sofá. - Emily acha que está apaixonada por ele. Dulce não disse nada por um momento, então balançou a cabeça negativamente.

- Emily é uma personagem de quadrinhos que faz o que eu digo para ela fazer, Matthew. Ela não sou eu.

- Mas tem características suas, e algumas das mais provocantes e inusitadas.

- É verdade - admitiu Dulce. - Por isso gosto dela.

Matthew deixou escapar um suspiro e tomou outro gole de conhaque.

- Ouça, Dul, não quero me intrometer na sua vida pessoal, mas continuo sendo seu irmão mais velho.

- E você cumpre tão bem esse papel, Matthew. - Ela o beijou no rosto. - Não precisa se preo­cupar comigo. Christopher não está se aproveitando, e nem vai se aproveitar de sua irmãzinha. - Ela provou um gole da bebida dele. - Na verdade, eu me aproveitei dele. Preparei biscoitos de cho­colate para ele e, desde então, Christopher se tornou meu escravo e amante.

- Lá vem você com essa língua solta de novo - ralhou ele, parecendo tomado por um raro mo­mento de embaraço. Ficando de pé, deu alguns passos pela sala.

- Tudo bem, não quero saber os detalhes, mas...

- Oh, mas eu estava tão ansiosa para contar tudo a você... Principalmente sobre a parte dos vídeos caseiros...

- Chega, Dulce. - Matthew passou a mão pelos cabelos, dessa vez parecendo realmente embara­çado. - Sei que é uma mulher adulta e que é incrivelmente bonita, apesar desse nariz.

- Ei! Meu nariz é muito bonito, ouviu?

- Trabalhamos duro na terapia familiar para fazê-la acreditar nisso. Ainda bem que você con­seguiu superar tão bem essa deformidade.

Dulce não conteve o riso.

- Oh, cale essa boca, Matthew.

- Mas, voltando a falar sério, tudo que eu quero lhe pedir é que tome cuidado. Entendeu? Cuide-se.

Um Vizinho PerfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora