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A L I S S A

Amar você me deixa tão confusa.

(Fallin' Alicia Keys)


A minha história deu uma guinada brusca depois que eu conheci Daniel Clarke.

Algumas pessoas costumam dizer que nossa vida ganha um sentido maior quando nos apaixonamos. Acho que isso pode ser outra descrição para quando o amor e a paixão reviram seu estômago, te provocam inúmeros calafrios, sorrisos bobos e até mesmo algumas lágrimas quando você começa a se preocupar com outra pessoa o tanto que você se preocupa consigo mesmo, talvez até mais do que o considerado saudável. E foi isso mesmo que aconteceu comigo.

Eu fiz novas amizades, conheci melhor o mundo e a mim mesma, descobri que posso ir mais longe do que achei que pudesse, me tornei livre, mas também me senti sem saídas ou caminhos para seguir. Porque o amor sempre traz acompanhamentos. Coisas que vão além do riso e dos frios na barriga.

No meu caso, o amor também trouxe a dor.

É tudo questão de dosagem. Você tem que saber a proporção que está doando de si mesmo. Você tem que saber até onde a outra pessoa suporta, o quanto ela realmente precisa, o quanto você tem a oferecer. Tem que saber quando começar e quando parar. Tem que saber se essa pausa é provisória ou definitiva. Tem que saber se está aplicando seu amor da melhor forma.

Eu não estava ciente de todas essas regras, resolvi não prestar atenção nos vários poréns e observações. Afinal, o amor não vem com bula, livro explicativo, não tem receita exata. Ele é diferente para cada um. E, para mim, ele estava sendo construtivo e destrutivo na mesma medida.

Pensamos que é só chegar, beijar e ficar por ali. Talvez cair fora se os beijos não forem tão bons.

E estou usando metáforas, porque aprendi um pouco sobre elas com o meu amor.

Ele mesmo, Daniel Clarke. O garoto dos meus sonhos que agora faz parte da minha realidade. Mas por quanto tempo? Uma das piores coisas que a paixão pode te trazer é isso, a dúvida. É por isso que tem que saber dosar. Amor e paixão, diferentes e necessários. Com quanto de cada podemos ser felizes?

Me apaixonar por Daniel me fez abrir portas que estiveram trancadas por tanto tempo que acabei esquecendo que existiam. E eu amei poder abrir cada uma delas até descobrir o que elas escondiam.

Talvez eu esteja misturando demais as coisas e complicando tudo até para mim mesma, mas a verdade é que está tudo misturado, confuso, quebrado, se desmanchando.

Meu irmão foi embora, minha mãe está dura feito uma pedra e meu pai toma remédios para dormir. Thomas está num acampamento esquisito e Anna foi para Paris com Victor. Meu namorado procurou ajuda: foi até a esquina, olhou para os lados, achou o tráfego cansativo e problemático, então voltou para casa.

Viu? Estou ficando realmente boa com as metáforas.

Dançar sozinha no meu quarto enquanto ouço música em som ambiente não faz mais sentido. Meu vizinho não põe mais canções no volume máximo para tocar em sua casa até acordar a rua inteira. Meus irmãos mais novos não berram e incomodam mais com o barulho de suas risadas. Meu pai parou de perguntar como vai a escola. Minha mãe não me enche mais o saco para cumprir os afazeres domésticos. Meus amigos não me chamam para sair. Meu namorado pouco se levanta de sua cama. Meu irmão mais velho foi embora.

– Eu estou com você, mas você precisa continuar comigo. – eu disse ao meu amor na praia, quando prometemos ficar ali um pelo outro, não importa o que acontecesse.

E ele respondeu:

– Eu vou.

Mas ele não estava olhando nos meus olhos.

E se tivesse olhado, eu teria enxergado que aquele olhar não possuía mais brilho?

Eu tentei. Eu estou tentando. Ele também está. O problema é, mais uma vez, a dosagem, a proporção. Essa balança não pode tender para um lado só.

Então eu arranco pedaços de mim para igualar este peso, mas a cada grama perdida do meu lado, outra se perde no lado oposto. Aí nos tornamos mais leves. Apesar de que, por mais vazios que estejamos, ainda podemos voar.

É lancinante, prazeroso, viciante.

É assim que eu sou, apaixonada, encantada, decidada, esperançosa. Eu me dou de presente a quem eu amo mesmo sem receber nada de volta. Não precisa. É como diz aquela música: porque eu sei que é amor e eu não peço nada em troca. 

Então eu disse isso. Eu disse, afirmei com todas as letras, palavra por palavra, o que é a mais pura verdade.

– Eu amo você.

– Por quanto tempo? – ele perguntou.

Eu não esperava esse tipo de resposta. Amor não é algo temporário, nunca foi. E, para mim, ele sempre esteve lá.

Talvez não quando esbarramos no supermercado pela primeira vez, mas quando pegamos ônibus juntos e ele me ensinou a voltar para casa sozinha; quando fui flagrada dançando em meu quarto por olhos castanhos e curiosos que me fitavam através da janela da casa ao lado; quando eu parei no meio do corredor e o abraçei, para então darmos as mãos pela primeira vez; quando nossos olhares se encontraram durante a conversa numa mesa redonda entre amigos; quando eu o desenhei e ele escreveu um poema sobre mim; quando eu fiquei no corredor escuro de sua casa, esperando que ele me deixasse entrar - e ele deixou; quando caminhamos pela praia, enterrando nossos pés na areia e molhando um ao outro de água salgada; quando demos nosso primeiro beijo, tão intenso e carregado de sentimentos; e também naquele exato momento, quando eu repeti o que já havia dito mais de uma vez e agora prometia que não teria fim.

– Para sempre. – eu disse. Soou tão firme, convincente. Como um juramento. Uma garantia de que eu estaria ali para o que desse e viesse, que o meu amor resistiria a tudo, sustentaria a tudo. Até mesmo nós dois, se fosse preciso.

Amor é a única coisa que me move, mesmo que cada movimento esteja doendo até a alma. Não deveria machucar tanto assim, às vezes eu penso. Mas, se isso é tudo o que tenho agora, é em tudo que irei me agarrar.

Até onde o que vivemos com outra pessoa é algo cru e real, e não parte de uma projeção ilusória daquilo que desejamos ter? Quando descobrimos que o que vemos em alguém é apenas algo que nós queremos enxergar ao invés do que esse alguém realmente é?

AfogadosOnde histórias criam vida. Descubra agora