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NOTA DA AUTORA: eu só queria dizer que este capítulo tem conteúdo que pode provocar algum gatilho, então não leia se estiver num momento muito sensível. Obrigada por estar acompanhando e se gostar, me deixe saber!! ♡ 


DANIEL

Eu estou tentando esquecer como eu vim parar nessa estrada. Me pego no meio do que eu desejo e do que eu sei.

(The Other Lauv)


Nós voltamos para casa logo que o sol começou a nascer, pegamos o primeiro ônibus que passou com destino ao nosso bairro. Alissa levou um esporro. Está de castigo por tempo indeterminado e não pode mais sair de casa para nada, nem para pôr o lixo para fora. Ela me contou tudo por mensagem, pois seus pais a deixaram com o celular temendo que ela se rebelasse e fizesse algo pior.

Meu pai não discutiu comigo. Não sei bem a razão, mas isso me surpreendeu um pouco. Eu já vi todas suas faces, desde as mais calmas até as mais explosivas, como quando ele e minha mãe brigavam. Lembro do seu rosto triste no amanhecer depois de uma longa noite de discussões, sua postura cansada e desanimada na cozinha, enquanto ele tomava o café para garantir a força de um novo dia.

A última vez que que brigamos foi no jantar em que eu descobri sobre Sarah. Vi seu olho esquerdo tremer de raiva, como costuma acontecer quando ele está muito bravo. Desde então ele vem sendo mais severo comigo, firmando o tom da voz ao ordenar as coisas em vez de pedir, que é o mais típico de sua parte.

Talvez ele queira mostrar autoridade perto da nova namorada, talvez ele ache que esse é o tipo de demonstração de masculinidade que Sarah precisa para continuar perto dele, porque minha mãe costumava dizer que ele nunca foi homem o suficiente, que sempre foi fraco na hora de tomar decisões e baixava a cabeça para todas as questões problemáticas que nos envolviam.

Hoje, quando cheguei em casa, ele estava acordado e sentado na mesa da cozinha, tomando uma xícara de café. Sarah comia mingau de aveia com sementes de chia ao seu lado, ela tem essas manias de comida saudável e de aparência estranha. Eu abri a porta da frente e entrei sem nenhum alarde. Passaria direto para o meu quarto, mas avistei os dois na cozinha e eles também me viram, então eu parei e esperei.

Esperei que ele gritasse comigo, que perdesse a paciência e dissesse que não sabia mais o que fazer, que estava de saco cheio do meu comportamento imprevisível. Ao contrário disso, ele perguntou se eu estava com fome.

Eu estava, mas não senti vontade de comer. É mais como saber que a necessidade está ali, mas não conseguir provê-la. Eu sabia como o gosto da comida iria parecer, sabia da dificuldade que seria engolir tudo até o final. Fiz que não, mas ele insistiu que eu tomasse ao menos um copo de leite, então eu entrei na cozinha e fui até a geladeira, ainda esperando que ele começasse a falar alguma coisa a respeito do meu sumiço durante a madrugada.

Peguei a caixa de leite contando os segundos para que ele abrisse a boca, já imaginando qual seria sua forma de abordagem. "E então, está satisfeito com o que anda fazendo?", ou "Eu não vou mais admitir esse tipo de situação, Daniel".

– Onde você estava? – foi o que ele perguntou depois que eu enchi um copo de vidro com o leite e me sentei na ponta da mesa.

Não era exatamente medo o que eu estava sentindo, era mais como uma espécie de apreensão. Meu peito estava pesado, minha respiração estava profunda e curta, minha cabeça explodia em mil direções. Eu sabia o que estava por vir, o que a reação do meu pai poderia trazer à tona. Tentei caminhar pelo território menos perigoso, o das poucas palavras, das respostas curtas. Este é o caminho que melhor funciona para mim, então foi por ele que optei seguir naquele momento.

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