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D A N I E L

Você nunca vai entender, eu sou um perigo para mim mesmo.

(We Don't Have To Dance Andy Black)


É fim de tarde, nós estamos sentados na varanda da minha casa, num sofá de fibra sintética que foi colocado lá por Sarah há pouco tempo. Estou deitado com a cabeça no colo de Alissa e ela faz carinho no meu cabelo enquanto mexe no celular.

É reconfortante ouvir sua risada toda vez que ela lê alguma postagem engraçada no Facebook, mas ainda assim me sinto meio desanimado. Estou com um pequeno vazio no meu peito que conheço bem, então já começo a pensar em formas de afastá-lo.

Tenho lutado duro esses dias para ficar são, mas tem se tornado cada vez mais difícil. Tanto que às vezes eu apenas sinto vontade de largar o barco de uma vez por todas e simplesmente afundar. É a opção mais fácil.

– Escuta isso – Alissa chama minha atenção, parando de mexer em meu cabelo.

Deixo meus devaneios de lado e espero.

– Um e-mail de Anna – ela começa a falar com empolgação. – Ela mandou ontem a noite e diz o seguinte: "querida Alissa, bonjour. A França é maravilhosa. Eu sabia que amava Paris antes mesmo de vir até aqui e agora tenho certeza: estou tão apaixonada por essa cidade que acho que preciso terminar com Victor para dedicar minha atenção total ao meu novo amor." – Alissa ri nessa parte, mas eu continuo sério escutando. – "A família de Victor é linda. Todo mundo mesmo. Apesar de um pouco frios, eles até que são simpáticos e foram bem receptivos comigo. Vou te mandar algumas fotos além das que já postei no facebook e no Instagram. Espero que você esteja se divertindo aí no Brasil também. Te amo e estou com saudades. Mande um beijo meu para todo mundo, até mesmo para seu namorado chatinho. Te ligarei em breve. Gros bisous à vous." Não sei como se pronuncia isso. – Não sei se ela ainda está lendo ou falando por si mesma nessa última parte, mas não digo nada que possa evidenciar minha dúvida.

Alissa não se incomoda com meu silêncio e continua a falar sozinha sobre as fotos que Anna me enviou. Ela vira a tela do celular para mim para que eu possa ver algumas das fotos, mas eu não me mostro tão interessado e ela dá um muxoxo, deixando o assunto para lá.

Estou distraído olhando para o teto e contando os riscos na tintura de gesso que está descascando quando alguém se aproxima de nós. É Sarah. Mesmo com ela ali de pé nos encarando, continuo imóvel em meu canto.

Ela não parece se importar com o fato de eu estar deitado em seu sofá novo e eu não sei se me incomodo ou fico grato por isso. Sinto um sutil desejo de encontrar formas de irritá-la, mas ao mesmo tempo não quero perder meu tempo e esforço com isso.

– Olá, queridos – ela nos cumprimenta exatamente como costumava fazer na escola, o que deixa um clima estranho no ar.

Alissa põe o celular de lado e se volta para Sarah, mas eu fecho os olhos porque, seja lá o que ela queira nos dizer, não quero ouvir.

Ontem a noite tive que aguentar ela e meu pai falando sobre minha grande irresponsabilidade ao levar Alissa para sair a noite sem avisar a seus pais. Inadmissível, eles disseram. Obviamente eu fui direto para o meu quarto, mas ainda consegui ouvi-los comentando o incidente até cansarem e irem dormir.

Alissa também teve que enfrentar um clima chato em sua casa e me deu detalhes disso, apesar de eu não lembrar de tudo o que ela disse agora, mas foi algo envolvendo seu pai furioso e sua mãe decepcionada.

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