A L I S S A
Eu nunca precisei de você como preciso agora. Eu nunca te odiei como odeio agora.
(Make Me (Cry) – Noah Cyrus feat Labrinth)
O dia não havia começado bem.
Minha mãe gostaria de ter tido tempo de ralhar comigo às quatro da manhã quando a liguei completamente bêbada pedindo para vir nos buscar. Sim, ela adoraria.
O problema é que assim que colocamos os pés dentro de casa e estávamos prestes a começar a sessão de julgamento na sala, alguém bateu na porta. É. Bateu. Mesmo tendo campainha. Às quatro da manhã.
Metade do álcool em meu sangue evaporou com o susto. Meu pai foi acordado para ver o que poderia ser. Armado (e também sem receber bronca por portar arma em casa escondido de mamãe), ele abriu a porta da frente e se deparou com uma folha de caderno no chão da entrada.
Palavras escritas em vermelho sangue e letras garrafais questionavam: CADÊ O GAROTO?
O suficiente para fazer a metade restante de álcool evaporar também.
Meus irmãos acordaram com o alvoroço. A polícia chegou na minha casa junto com o nascer do sol. Eu quis correr imediatamente até Daniel, mas minha mãe tentou me impedir.
– Acabamos de deixar ele em casa. Ele não tem nada a ver com isso.
Mas eu me desvencilhei dela com brutalidade. Estava tomada pelo terror. Era óbvio que aquele bilhete se referia a Nathan. Eu precisava de alguém para me abraçar e dizer que tudo ficaria bem e meus pais não eram os melhores indicados.
Sarah abriu a porta para mim, ela havia acabado de acordar.
– Credo, o que aconteceu? – ela perguntou quando viu meu semblante assustado.
– Polícia – respondi com uma só palavra e a driblei para subir as escadas correndo, sem checar se ela daria uma espiada entre as janelas ou sairia para ver de perto como alguns vizinhos já estavam fazendo.
Não bati a porta do quarto de Daniel, apenas entrei.
Ele, milagrosamente, estava dormindo. Tão lindo que não quis perturbá-lo. Tentei sem sucesso me aconchegar junto a ele em sua cama sem acordá-lo, mas ele abriu os olhos, murmurando, logo que me sentiu deitar ao seu lado:
– O que aconteceu?
– Shh.. Volte a dormir.
– Eu não estava dormindo – ele confessou, em voz baixa. – A gritaria ao lado me acordou.
– Gritaria? – perguntei, confusa.
– Não era você gritando para que te largassem?
Eu não havia me tocado que havia gritado até ele mencionar. Senti vergonha, depois raiva, por fim, mais uma vez, temor.
– Eu queria ficar com você.
Ele passou os braços ao meu redor, mas não forte o bastante. Abracei-o de volta e respirei contra seu peito. Daniel ficou imóvel e não se mexeu mais, enquanto eu permaneci também imóvel, porém reflexiva.
Não sei quanto tempo se passou desde que tudo aconteceu e eu corri para cá, mas ainda estamos na mesma posição, as respirações sincronizadas. Não sei se ele está dormindo, mas eu estou acordada, apesar de cansada.
As palavras da minha mãe ecoam em minha cabeça: ele não tem nada a ver com isso. E não tem mesmo. Mas eu também não tenho nada a ver com sua dor e ainda assim me importo. Por que então ele parece tão indiferente a tudo que está acontecendo?
Com medo das minhas próprias respostas e com raiva do que elas podem sugerir, fecho os olhos, apertando-os com força, e decido que continuarei me importando por nós dois. No fim, acho que estou tão perplexa com tudo o que vem acontecendo que não consigo processar nada como deveria. Caio no sono permitindo que um único pensamento circule em minha mente: o dia não havia começado bem.

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Afogados
Ficção Adolescente‣ LIVRO 2 DA SÉRIE SUBMERSOS. Daniel e Alissa já ouviram canções melhores e navegaram por mares mais calmos. Calmos porque, se pensam que o barco em que estavam passou pelo pior, estão enganados. A tempestade mal começou e com ela vem grandes estrag...