Assim que ouviu os primeiros tripulantes levantarem, Elisabeth tratou de acordar para ajuda-los no que fosse necessário. Mas quando subiu até a parte superior do navio percebeu que aqueles homens não faziam nada mais do que beber e dançar. O pouco trabalho que faziam, era feito nos primeiros dias da viajem, provavelmente para deixar tudo pronto para desembarcar as mercadorias.
Viu de longe o capitão acenar para que alguns marinheiros se juntassem à roda de homens que festejavam. Na intenção de não participar daquele grupo, ela seguiu até a proa. Esse era o local mais longe que chegaria daqueles homens.
Sentiu a presença de alguém atrás de si, e pelos passos, soube no mesmo instante de quem se tratava.-O que foi Justine?! - indaga, sem ao menos dar meia volta para encara-la.
Lizzie poderia ficar ali a vida toda, só admirando a beleza das águas escuras atingidas pelo reflexo de luz do sol.
-Como sabe que sou eu?- questiona a jovem, surpresa.
-Ouvi seus passos.
-Poderia ser qualquer pessoa.
-Conheço o seus.
Ela se aproximou de Elisabeth e se escorou na lateral do navio, apoiando o peso em uma só perna.
-Veio dizer alguma coisa? - indaga Lizzie, casada das perseguições da garota.
-Sim, quero ir com você.
A francesa a encara com uma sobrancelha arqueada, e a garota sorri, sabendo que ganhara a atenção do "homem".
-Está louca? Você é só uma criança! não posso leva-la comigo!
-Não quero viver mais nesse lugar! Você tem que me levar!
Obviamente não poderia leva-la consigo, Elisabeth estava a caminho de uma base inimiga e que posteriormente teria que destruir! sem contar os conflitos e dificuldades em resgatar os reféns. Uma garota só atrapalharia ainda mais os seu planos. Mas é claro que ela não a deixaria naquele buraco, assim que chegasse a OSCU denunciaria as condições de vida das pessoas abordo, e então, o navio seria interceptado e a garota, provavelmente levada para um bom orfanato.
-Já disse que não, e nem pense em me seguir, deve saber que tenho uma arma! - ameaça.
Apesar dela lembrar sua irmã, Lizzie não sabia e muito menos queria, cuidar de uma pirralha.
-Prometo que não atrapalho! Eu faço de tudo, limpo casa, lavo roupa!
-Não é por isso garota, estou em uma missão, pela sua segurança é melhor que fique no barco.
Ela bufa frustada e se afasta de Elisabeth assim que ouve a cozinheira chama-la. Mais uma vez aquele aperto de saudades invade o coração de Becker, sua irmã vinha a sua mente através de milhões de memórias. Lembrava-se das noites de febre, em que elas dormiam juntas, ela sempre foi mais que uma irmã e uma responsabilidade, Lizzie a tratava como uma filha, pois tinha que suprir a falta do general na vida de Nicolette. Apesar disso, ambas tinham suas diferenças.
Por mais que gostasse daquela criança, a responsabilidade era tanta que Elisabeth precisava se sentir jovem, uma criança, não uma mãe. E aí nasceram suas rebeldias, embora grande parte do seu objetivo sempre fora atormentar o general. Lizzie amava confronta-lo em tudo, no princípio por puro capricho, mas depois, porque seus ideais já não eram os mesmos. Com o tempo Nicolette começou a seguir os seus passos, e o general oprimia ainda mais a filha mais velha, que segundo ele, deveria dar exemplo. Seu único arrependimento era ter deixado sua irmã para trás, inclusive na época sofreu muito com as saudades, entretanto não poderia continuar vivendo sobre o mesmo teto que o pai. Precisava lutar pelo que acreditava, por mais egoista que isso um dia pudesse parecer aos olhos da irmã.
Ela abana a cabeça, procurando esquecer essas imagem, estava muito emotiva nos últimos tempos, à anos não lembrava do seu passado, mas infelizmente ele parecia ter sido desenterrado assim que Allan invadiu o seu apartamento naquela noite.
Os enjôos de Elisabeth já haviam passado, pois provavelmente seu organismo se acostumou com o movimento das ondas e esse era o momento de aproveitar a paz e tranquilidade que aquela vista tinha a lhe oferecer, isso antes de embarcar em uma troca de tiros. Depois do almoço, as horas pareciam correr mais rápido a cada segundo.
No finalzinho da tarde, quando o sol já estava se pondo no horizonte, o navio atracou no porto. Aquele era mais movimentado do que os outros, pessoas andavam para todos os lados, carregando suas mercadorias nos navios para partir. Os marinheiros lançaram a escada de madeira para descer e, um a um saiu da embarcação. Elisabeth foi a primeira a sair, e se escondeu atrás de alguns barris, pronta para seguir o sequestrador.
Avistou Allan acompanhado do próprio capitão, o cientista carregava um casaco sobre as mãos juntas na altura do peito, provavelmente estavam presas, e a peça de roupa servia apenas para esconder as cordas e não chamar muita atenção.
Seguiu os dois em passos lentos, eles não estavam correndo. Pode notar que Matte a procurava com o olhar, provavelmente com medo de sua amiga tê-lo perdido de vista.
Mais a frente, num local um pouco mais afastado da movimentação, um grupo de homens armados esperavam pelos dois no início da estrada que levava ao porto. Elisabeth tomou a devida distância para não ser vista, mas continuou de olho nos dois. Eles conversaram com o grupo um tempo, e antes de sair, o capitão deixou Allan com um dos sujeitos, que estendeu uma mala em sua direção. Provavelmente aquele homem recebia uma boa quantidade de dinheiro para entregar essas pessoas.
Eles caminharam mais um pouco, e colocaram Allan no carro. Foi somente então que Elisabeth percebeu que precisava de algum automóvel para segui-los. Olhou ao seu redor, e avistou um carro da cor azul marinho estacionado à direta, não era muito discreto, mas se ficasse à uma boa distância, não seria vista.
Destravou a porta do carro com facilidade e localizou o buraco de ignição para retirar a tampa próxima a ele, descascou os fios negativos e positivos e juntou-os para esquentar a fiação do carro, escutando em seguida, o som do motor ligado.
Olhou pelo vidro do carro e notou que eles já estavam a uma distância consideravelmente boa, e que essa era a hora de segui-los. Enquanto dirigia, procurou no porta luvas algo descente para comer, na esperança de talvez achar algum pacote de bolacha. No navio as refeições se resumiam a peixe, pão, cerveja e polvo, coisa que o seu estômago não estava acostumado a digerir todos os dias. Suspirou frustada ao perceber que o compartimento estava vazio e concentrou-se na pista, eles estavam tão longe, que era possível ver apenas um pequeno ponto preto no horizonte. A estrada estava vazia, e por isso a distância entre ambos deveria ser maior do que o necessário.
Dobrou a velocidade quando percebeu que o carro escapava-lhe das vista, entretanto, por precaução, continuou mantendo-se distante. Seu carro rodou cerca de meia hora quando se deu conta de que o outro avançava por dentro da mata, dobrando à direita por meio de uma trilha de pedras, muito bem disfarçada pelas árvores que cobriam o caminho.
Estacionou o carro no meio das folhagens e cobriu-o com folhas e galhos secos. A partir dali teria que andar. Não sabia ao certo o que encontrar, talvez houvessem espiões naquelas árvores.
Procurou mais uma vez por comida dentro do carro, mas nada encontrou, e antes de seguir a trilha por dentro da mata, verificou o porta malas. Algo lhe tirou o sossego desde que saiu do porto e ela sabia muito bem o que era, mas não teve tempo de resolver e ao mesmo tempo seguir Allan, ou fazia um, ou outro. Elisabeth abriu o porta malas e revirou os olhos impaciente.-O que faz aqui garota?!
-Como sabe que eu...
-Senti você me seguindo desde o porto!- intervém. - Não disse que não era pra me seguir?!
-Me desculpe e ...
-E agora o que faço com você?! - murmura, retirando a arma da cintura para assusta-la.
A garota arregalou os olhos, e falou rapidamente:
-Escuta, não quero que cuide de mim! só quero que me leve até a cidade, de lá me viro! tenho família naquela região!
-E por que eles não foram te buscar?!questiona sarcástica.
-Bem... É que...
-Deixa de mentira, está mentindo para um policial garota!
-Por favor senhor, deixe-me ir com você.
Lizzie revira os olhos, aquilo estava ficando muito dramático.
-Já disse que não, não estou indo pra casa.
Elisabeth suspira irritada, coçando a peruca que incomodava-lhe a nuca e encarou a garota. Sabia que não poderia deixar aquela menina sozinha em um lugar como aquele, em primeiro lugar, se alguém a encontrasse, comprometeria o seu disfarce, e em segundo, a jovem estaria morta quando não tivesse mais utilidade para os capangas. E eles costumavam ser bem cruéis com prisioneiros.
-Está bem, você vem comigo, mas somente até a cidade. Preciso cumprir minha missão, e então, te levarei até lá!
Ela chacoalhou a cabeça, concordando freneticamente e saiu do porta malas.
-Pra onde vamos?
-Sul.
Sem mais palavras, Elisabeth começou a caminhar por dentro da mata, porém, perto o suficiente para ver a trilha e quem passasse por ela. Pelos estalos dos galhos, Lizzie sabia que Justine a seguia, portanto não se preocupou em olhar para atrás para dar uma conferida.
Sorriu feliz quando verificou o céu entre as folha e constatou que já escurecia, e que em pouco tempo estariam no total escuro. A escuridão poderia ajudá-las ou prejudica-las, se acaso estivessem perto da base, suas luzes iluminariam o caminho que deveriam seguir, mas se estivessem longe, aí sim elas teriam vários problemas.
Depois de meia hora, a noite chegou e a escuridão também. Seus planos de enchergar através das luzes foi por água abaixo, e achou melhor parar para descansar ao notar o som ofegante de Justine, a jovem talvez não estivesse acostumada a andar tanto.-Vamos acampar aqui? - questiona.
-Sim, quando o sol raiar partimos.
O ideal seria chegar a base durante o período noturno, sua camuflagem e infiltração seriam melhores, e mais fáceis de serem realizadas. Mas como não carregava consigo qualquer instrumento que iluminasse o caminho, ela teria de tomar cuidado com Justine.
-Tem algo pra comer? - indaga a moça, oferecendo-lhe um bolinho de peixe.Elisabeth aceitou a oferta, precisava estar bem disposta e alimentada para a manhã seguinte, e por mais que não aguentasse mais ouvir a palavra "peixe", tratou de comer com a respiração suspensa. Vendo a garota analisa-la sem muita descrição, sua melhor saída foi deitar em meio as folha secas, e lhe dar as costas.
*
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Agent Becker
ActionElisabeth, uma moça independente numa época totalmente machista que luta pelo reconhecimento do seu valor dentro de uma das mais secretas organizações do governo, a OSCU. Afastada da família após fugir aos Estados Unidos em busca da liberdade, aos p...