3 - Alma-de-mestre

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Por Ema Arantes

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Por Ema Arantes.

O comandante encontrou-me observando o mar, logo pela manhã. Eram sete horas. Ainda estávamos no estreito de Drake.

— Bom dia, comandante.

— Bom dia. Dormiu bem?

— Até onde foi possível, sim.

— Mas não havia com o que se preocupar. O Besnard é insubmergível. São os compartimentos estanques, sabe, que garantem isso.

Sorri:

— O Titanic também era insubmergível! E segundo consta, o capitão deles era tão confiante quanto o senhor.

Ribeiro retribuiu o sorriso:

— É, mas aqui temos botes suficientes para todos, isso eu garanto.

Sempre que podia, o comandante voltava ao assunto da reforma do navio, como uma criança empolgada com seu brinquedo novo:

— Diferentemente do Titanic, jamais estaremos sozinhos. Temos o que há de mais moderno por aqui. Podemos fazer e receber chamadas telefônicas, enviar e receber e-mails e muito mais. Além disso, o sistema de comunicação foi substituído e o casco reformado. Fizemos a substituição das placas de madeira apodrecidas por placas de metal. O sistema hidráulico e de guinchos também foi trocado.

Fingindo interesse, cruzei os braços, apertando-os contra o corpo. Um leve vento fez-me arrepiar, apesar de bem protegida. A temperatura era positiva, mas muito baixa. Um bando de aves antárticas voando em círculos a estibordo do navio chamou-me a atenção. As famosas andorinhas-das-tormentas, mais conhecidas por alma-de-mestre, assim denominadas pelos longos e sentidíssimos pios, os quais se dizia serem das almas dos capitães de navios que se perderam nos naufrágios. Observei-as com meu binóculo:

Petréis-das-tormentas. São aves procellariiformes. Pertencem à família Hydrobatidae. É a mais delicada de todas as aves antárticas. Do mesmo tamanho dos canários, mas pretas, com uma mancha branca sobre o dorso. São lindas.

— As almas dos grandes mestres — disse solenemente o capitão, em forma sentida.

Voltando-me para bombordo, admirei-me com o mar, muito diferente do dia anterior,  parecia a superfície de um espelho. O velho Drake estava calmo. O sol refletia sobre a superfície marítima, causando um brilho ofuscante.

— Quando esse navio foi construído? — perguntei, para puxar assunto.

O comandante colocou o braço sobre os olhos, para se proteger de um reflexo:

— Em 1967, na Noruega. O nome, Wladimir Besnard, como bem sabe, é uma homenagem ao cientista russo, fundador do Instituto Oceanográfico da USP.

— É, eu sei. Trabalho lá, esqueceu? Mas por falar em trabalho... Com o mar calmo, já podemos colher informações com o ecointegrador e saber se existem cardumes e outros animais marinhos nas proximidades.

Assassinato no Continente GeladoOnde histórias criam vida. Descubra agora