A chefe da estação era uma mulher muito atraente e que não passava despercebida. Estendeu-me a mão e passou-me um saco plástico transparente, contendo um cantil de metal, desses que se utiliza para colocar bebidas alcoólicas. Explicou:
— Foi encontrado a uns quinze metros, no lado externo da estação, entre a praia e a porta do final do corredor dos dormitórios, onde o senhor está alojado. Por sorte, ficou preso numa pedra saliente, que evitou que a neve o cobrisse totalmente. Não sei se isso pode interessar ao caso, mas é algo bem estranho, ter encontrado esse cantil. Além de ser expressamente proibido jogar lixo por aí, não pertence a ninguém aqui da estação.
Olhei atentamente. Era um cantil novo, prateado. Estava tampado e possuía, gravado na lateral, próximo do fundo, três letras: "CEA". Mais um enigma? Balancei-o e percebi que havia líquido nele. Comentei:
— Poderia solicitar ao capitão Cardoso para dar uma olhada no conteúdo? Diga a ele que pode despejar num copo, para examinar e depois retornar o líquido no cantil. Verificarei as digitais depois. Só uma pergunta: eu olhei do lado externo dessa porta e não vi o cantil...
Azevedo explicou:
— Da porta, não era possível vê-lo. A pedra o ocultava. Só foi possível visualizá-lo, quando desci abaixo da estação, a meio caminho da praia.
— Obrigado, capitã. Excelente trabalho.
A capitã retirou-se. O almirante, então, retomou a palavra:
— A neve agora pegou forte. Por pouco esse cantil não ficaria desaparecido...
— Acabaria sendo encontrado, quando o gelo derretesse, mas, sem dúvida, foi muito importante encontrá-lo agora. Tenho a impressão que será uma pista importante.
Concentrei-me profundamente, alisando meu bigode. Entrei em êxtase contemplativo e muitos sabiam, quando eu assim ficava, podiam me chamar que eu me tornava alheio a tudo...
— Basílio... Basílio!
Mais alguns segundos em silêncio, tendo sido necessária um pouco mais de energia, na voz:
— Basílio!!
— Oi, sim... Ah... Mil desculpas, almirante...
— Pensei que já estava dormindo...
— Não... Ainda não... Estava pensando no Humberto... Como ele recolocou a mesa no lugar, depois de sair pelo alçapão?
— Talvez, na verdade, como tu aventou, tenha mesmo saído pela porta, com a ajuda de alguém.
— É o que tudo indica.
Inês não acompanhara a investigação no quarto de Humberto, mas o ocorrido no alojamento do geólogo, já era notícia velha dentro da estação. Nisso, o cabo Gerson adentrou o refeitório, trazendo nas mãos uma corda. Bateu continência. O almirante perguntou:
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Assassinato no Continente Gelado
Mystery / Thriller🏆1º Lugar no Concurso Caneta de Ouro (Melhor Cenário) 🏆2º Lugar no Concurso Jane Austen 2022 (Romance) 🏆3º lugar no Prêmio UBE/Scortecci, 2005 (Romance). Estação Antártica Comandante Ferraz: uma nevasca e um crime! Dezoito pessoas incomunicá...