Dias depois, Theodoro já havia cansado de enviar mensagens para Artemísia, ou tentar ligar para ela, ou até mesmo esperar que ela chegasse no colégio. Nos dias que se passaram, ele esperou até o último segundo que podia na porta do prédio principal da escola, desejando que pudesse conversar com ela mas ela não aparecia. Nunca. Como se nunca tivesse existido.
Exceto pelo fato de que Theo sabia que ela estava por ali. Ele sentia o tempo todo que estava um segundo atrasado, que por pouco não havia esbarrado com ela no pátio, no recreio, ou em um dos corredores.
Aquela sexta-feira era provavelmente a última oportunidade de Theodoro de conversar com Arte antes que fosse tarde demais. Ele sabia que, quanto mais tempo passasse, os sentimentos entre eles ficariam nublados e então se tornaria cada vez mais difícil que ela encontrasse uma maneira de desculpar Theo por toda aquela situação. As aulas estavam acabando, o vestibular estava chegando e ele duvidava que Artemísia fosse aparecer no Interescolar depois que as aulas acabassem.
Era uma medida desesperada, sim, mas Theodoro entrou no vestiário masculino depois da aula de educação física de uma das turmas do terceiro ano. Ele chegaria atrasado para sua próxima aula, mas se aquela era a única maneira de alcançar Artemísia sem ser invasivo demais, valia a tentativa.
— Nicolas? — Theodoro chamou, evitando trocar olhares com qualquer um dos garotos no banheiro.
A nítida rivalidade entre as turmas de terceiro ano estava no seu ápice, já que era a última sexta-feira do ano letivo. A única turma a salvo de toda a situação era a turma especial de Artemísia, que era invejada durante o ano todo.
Theo viu o garoto de cabelos castanhos encará-lo enquanto vestia sua calça jeans. O cabelo de Nicolas já estava batia em seu ombro, alongado pelo peso da água. As gotas caiam do cabelo molhado de Nicolas, molhando seu tronco despido. Theo conteve um revirar de olhos para Nicolas, porque aquela era uma ação quase involuntária de seus olhos quando estavam juntos.
— Theodoro — Nicolas franziu o cenho. Não era todo dia que o menino de ouro andava por aí procurando por ele.
Bem, pra falar a verdade, Nico nem sabia se ainda podia dizer aquilo depois que a convivência com Theo se tornou um pouco mais frequente do que o desejado por conta da relação deles com Artemísia.
— Podemos conversar? — Theo perguntou, sentindo-se estranho no meio daquele vestiário, com os outros garotos olhando para ele rindo de uma piada. E, naquele caso, ele era a piada.
Era engraçado não ter o altar de Theo Roriz, o Melhor Jogador do Colégio, o Menino de Ouro dos Peppers, ou qualquer coisa assim. Era o último dia de aula. Ele era só mais um garoto se formando, e os outros garotos adoravam zoar outros garotos se formando.
Nicolas balançou a cabeça, torcendo o rosto para conter um sorriso idiota. Ele sabia o que Theo queria e, por mais que se sentisse mal pela Arte, sentia exatamente o contrário ao ver Theodoro de coração partido. Ou pelo menos era o que se obrigava a sentir.
Depois de enfiar todas as suas coisas na mochila e vestir seu uniforme, Nicolas acompanhou Theodoro para fora do banheiro.
Os dois pararam no corredor estreito que levava dos vestiários a quadra, evitando contato visual e tentando lidar com o constrangimento.
— Ela não me responde — Theo disse.
— Eu sei — Nicolas tentou ter o mínimo de respeito pela situação e pela amiga, portanto não fez qualquer piada sobre a aparência miserável de Theodoro. Era óbvio que Artemísia não respondeu nenhuma das mensagens de Theo, era a única explicação para aquela cara de cachorro abandonado que ele tinha.
— Eu preciso falar com ela. Quero explicar....
— Você não tem o que explicar. Você sabia que tinha sido Paula quem arruinou o Clube do Livro, numa vingança idiota por algo que Arte não fez, e você simplesmente não fez nada. Ou você tem uma versão diferente da história?
— Sabe, acho que você poderia dizer isso de uma maneira menos cruel — Theo revirou os olhos. A maneira como Nicolas falava o fazia parecer o vilão malvado de uma história de adolescentes inconsequentes que não tinha vilões.
— É o que é — Nicolas deu de ombros. — Escuta, Theodoro, eu posso tentar falar com ela, mas não acho que vá funcionar.
— Talvez eu devesse ir até a casa dela? — Theo se sentia um idiota mas, sim, estava pedindo conselhos ao Nicolas.
— Não. Cara, não — Nicolas riu. — Não é um filme. Ela não vai te beijar se você aparecer lá e aí termina em um final feliz. Ela está brava. Com você, com a Ana, com a Paula e acho que até comigo, um pouquinho. E eu sou ótimo.
Theo bufou.
— O que eu quero dizer... — Nicolas continuou, colocando uma de suas mãos nos ombros de Theodoro, o melhor gesto reconfortante que poderia oferecer ao outro — é que você já fez o suficiente. Já tentou falar com ela e ela claramente não quer falar com você, e esse é o momento em que você a deixa em paz. Quando ela quiser conversar, acho que ela vai procurar você.
Theodoro assentiu, sem um pingo de esperança, e encolheu os ombros. Aquele era um conselho que ele não queria ouvir, mas era o mais sensato a se fazer.
Os outros garotos deixaram o vestiário, lançando olhares curiosos ao contato entre Theo e Nico.
— Você pode ir, se quiser — Theo murmurou. — Ouvi dizer que sua turma vai fazer um "amigo oculto" de despedida, acho que você não deveria se atrasar.
Nicolas respirou fundo, encarando Theodoro. Era basicamente a situação pela qual ele esteve esperando durante três anos: um momento de vulnerabilidade de Theo, para que ele pudesse rir do garoto. No entanto, tudo que ele sentia era pena. E, bem, ele não podia passar a vida toda fingindo que se sentia assim só por causa de Artemísia.
No fim das contas, Nicolas sabia. Theodoro e ele tinham algo que podia ser chamado de amizade. Uma amizade muito conturbada, mas era a única maneira de chamar aqueles sentimentos, pois ele só era capaz de se sentir assim pelos amigos.
Nicolas se sentia estúpido, pois estava prestes a jogar três anos de antagonismo fora.
— Idiota — Nico praguejou e se aproximou de Theo, abraçando-o.
Por um momento, achou que Theodoro o afastaria e começaria a gritar com ele. No entanto, relaxou ao sentir Theo retribuir o abraço.
— Eu gosto mesmo dela — Theo disse.
— É, mas você foi um babaca. E agora precisa lidar com as consequências disso.
— Eu sei.
Nicolas se afastou, embaraçado pelo abraço. Era esquisito, eles não podiam negar.
— Vou fazer o meu melhor — Nicolas deu alguns tapinhas nas costas de Theodoro.
— Achei que tinha dito que me mataria se eu magoasse a Artemísia. Eu talvez mereça — Theo tentou dar um sorriso.
— Você merece. Eu até te mataria, mas você já está bem pior que isso. E você é o idiota que faz a minha melhor amiga feliz, então eu preciso ajudar. Eu acho.
Theo assentiu e sorriu. Nicolas acenou, afastando-se, e Theo suspirou.
Era legal contar com um amigo novo, para variar.

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Uncool
Teen FictionEm seu último ano de ensino médio, Artemísia só estava certa de três coisas: a primeira era que ela não fazia ideia do que faria em seguida. A segunda é que seu Clube do Livro era a única coisa que a mantinha feliz no colégio. E a última coisa era q...