Theo

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Theodoro olhou para a porta do apartamento de Arte, como se fosse um bicho de sete cabeças prestes a devorá-lo. Não que nunca tivesse conhecido a mãe de Arte, mas da última vez as circunstâncias eram completamente diferentes e ele sentia como se, magicamente, a mãe dela sabia sobre tudo que eles já tinham passado. Do sexo às brigas.

— Acho mesmo que eu posso ir para casa — tentou mais uma vez.

— Você está machucado e a minha casa está literalmente à nossa frente — Arte revirou os olhos, pegando a chave da mochila.

O chaveiro tilintou com as chaves e Theo respirou fundo. Viu Artemísia colocar a chave na fechadura e girá-la, fazendo a porta abrir, como se fosse simples.

Ele podia muito bem fugir. Não tinha tantos machucados assim. Tinha ralado as mãos e, para falar a verdade, Artemísia era quem tinha se machucado mais que ele, batendo os cotovelos, os joelhos e as mãos quando tropeçou. Mas ele sabia que para a parcela dele que queria fugir, havia uma equivalente que queria passar o máximo de tempo que pudesse com aquela garota, mesmo que aquilo incluísse uma mãe.

Arte entrou e puxou-o consigo. Theo continuava admirando aquela casa tanto quanto na vez anterior, com a decoração clara e aconchegante. Tudo lembrava Arte, e isso o deixava aconchegado.

— Mãe? — Arte chamou depois de fechar a porta.

A voz de Cristina ecoou em algum lugar da casa, e Arte foi em direção, com Theo logo atrás de si, e o nervosismo dele, quase que como uma terceira pessoa.

A mãe de Arte surgiu no corredor, arregalando os olhos com a surpresa de encontrar o garoto ali.

— Oi, filha — Cristina franziu o cenho. — Oi Theodoro, que tem aparecido muito.

— Ela está brincando — Arte se apressou em dizer. — Mãe, Theo e eu estávamos andando de bicicleta e caímos — mostrou-lhe as mãos.

— Não sabia que ia fazer algo depois da escola. É por isso que demorou?

— Mãe, para de tentar fazer Theo ter medo de você só porque acha que ele é meu namorado — e então Arte seguiu pelo corredor, como se fosse simples.

Mas Theodoro ainda estava ali, encarando Cristina, sem saber se podia seguir a garota.

— Você é?

— Não — Theo balançou a cabeça.

Arte e ele estavam andando na linha tênue entre amigos e casal, mas definitivamente não estavam namorando e não era algo que sequer estavam considerando, pelo menos não havia nenhuma conversa em torno do assunto. Além do mais, seria estranho tentar se encaixar em qualquer definições como aquela, uma vez que tinham voltado a se falar no dia anterior.

— Não sei se isso me faz mais feliz que a alternativa — Cristina deu de ombros. — Vá cuidar dessa hemorragia — piscou para ele.

Então a mãe dela estava brincando, o que significava que estava tudo bem.

Theo sorriu e fez os mesmos passos que Arte.

No fim do corredor havia um banheiro. Era pequeno e bem iluminado. Arte estava sentada na tampa do vaso, ocupada com gaze e água oxigenada em suas mãos.

— Eu posso fazer isso — Theo se ofereceu, vendo-a torcer o nariz por limpar os machucados. — Você é muito bruta.

Ajoelhou-se na frente da garota, pegando a gaze de suas mãos. Começou a tirar a terra das mãos dela com movimentos suaves e, em seguida, limpou seus cotovelos.

— Acha que machucou os joelhos? — Theo perguntou.

— Eu estou de calça — Arte deu de ombros, o que provavelmente significava que sim, seus joelhos estavam machucados.

— É, mas pode ter machucado com o impacto. Tira a calça — pediu e se esforçou para não rir, mas não pôde evitar.

— Theodoro! — Arte exclamou ao encarar o sorriso perverso do garoto. — Você é podre.

— Eu estou falando sério — fez uma careta, contendo o sorriso.

— Não vou tirar a calça — Arte não tinha tanta certeza quanto queria ter.

Theo levantou-se e fechou a porta do banheiro, trancando-a logo em seguida.

— Eu não conto para sua mãe se você não contar.

Arte levantou-se e desabotoou a calça jeans, duvidando do quão fraca era quando se tratava de suas decisões. Abaixou a calça até a altura dos calcanhares e tornou a se sentar na tampa do vaso.

Theo pôs-se de joelhos mais uma vez à sua frente e sorriu enquanto encarava a vermelhidão dos joelhos da garota.

— Você precisa confiar mais em mim.

— Olha quem está falando sobre confiança — Arte resmungou.

Theo limpou os joelhos dela também e, em seguida, beijou sua perna, bem acima do joelho.

— É para ajudar a sarar mais rápido — explicou.

— Tenho certeza de que não é assim que funciona — Arte revirou os olhos mas sorriu na mesma. Levantou-se e trocou de lugar com ele, depois de vestir a calça.

Permaneceram em silêncio durante os minutos em que Arte cuidava dos pequenos machucados de Theo.

Em seguida, Arte levantou-se do chão e guardou as coisas no armário sob a pia do banheiro.

Era desconfortável estar ali. Não faziam ideia do que estavam fazendo e de até onde queriam ir depois da briga, mas ao mesmo tempo o magnetismo de sempre os puxava para perto.

— Artemísia — Theo chamou, prendendo a respiração.

Arte virou-se para ele.

Era sufocante o quão bonita ela podia ser. Theo já havia beijado muitas meninas e, dentre elas, a variação de aparências era gritante. Só que, ao olhá-la, ele sabia que, desde que tinham se aproximado, ele sempre descreveria uma garota como ela quando se tratava da sua garota dos sonhos.

E aquilo não estava nas pernas finas dela, ou na curva sutil que sua cintura fazia. Também não se tratava dos seios pequenos dela, ou das sombras na sua clavícula. Tampouco era sobre a curva do pescoço dela — o lugar perfeito para enterrar o rosto —, ou da sua mandíbula marcada, ou dos seu sorriso divertido. O que fazia de Arte a garota dos sonhos de Theo estava, provavelmente, em seus olhos, ou no sentimento que eles passavam quando o garoto olhava para eles.

O castanho esverdeado dos olhos de Artemísia podia ser duro como pedra, e, no segundo seguinte, suave como seda.

Naquele momento, no entanto, Theo encontrou nos olhos dela o mesmo que certamente podia ser encontrado nos seus: ardência.

— Vem aqui — pediu.

Arte caminhou até ele e, depois, sentou-se sobre suas pernas.

— Eu senti sua falta nesses dias em que fui um idiota — Theo admitiu.

— Eu também senti sua falta — Arte respondeu, antes de beijá-lo.

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