Epílogo

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6 meses depois

A quantidade de alunos enfornados no bar tornava as leis da física questionáveis, mas as pessoas não paravam de chegar. Os fins de tarde da sexta-feira costumavam ser assim, os alunos deixavam o prédio da faculdade e ocupavam a mesa de bares do Centro, e aquele era o mais próximo, bem no caminho entre a faculdade e a Praça Tiradentes.

Aquele não era bem o tipo de programa de Artemísia. Ou não costumava ser, mas as coisas tinham mudado um pouco nas últimas semanas quando fez uma amiga, Laura, que estudava filosofia e não perdia uma sexta de bebedeira sequer.

Só que Laura também não perdia uma oportunidade de sumir, aparentemente. Arte tinha sido abandonada contra o balcão, segurando uma lata de cerveja de péssima qualidade e se perguntando quantas pessoas poderiam entrar naquele lugar antes que ele explodisse.

Estava tudo fedendo um pouco também. O lugar era sujo e tinha um banheiro único na lateral, com filas de pessoas apertadas para fazer usá-lo. Normalmente ficava sujo antes das oito, e Arte nunca tinha nem mesmo chegado perto daquela porta malcheirosa. Tinha medo de que segurar tanto para ir em casa a faria ter algum problema de saúde, mas aquela era apenas uma possibilidade. Usar aquele banheiro definitivamente a faria ter um problema de saúde.

Naqueles momentos Arte sentia falta de Nicolas. Ele tinha decidido tirar um ano sabático depois do ensino médio, e foi morar por uns meses na Argentina. Arte não conseguia pensar em um lugar que combinasse menos com Nicolas que a Argentina, mas ele mandava fotos sorrindo com muita frequência. Usando bandana na cabeça e bronzeado (ela não achava que Buenos Aires era o lugar ideal para se conseguir um bronzeado, mas era o Nicolas). Queria que ele estivesse com ela em muitos momentos, porque ele não era do tipo que daria passeios longos e abandonaria Arte no balcão de um bar fedido. Às vezes Arte queria o ensino médio de novo, sem bares fedidos e fichamentos para fazer.

— Oi — um garoto disse ao seu lado.

Arte olhou para ele.

— Oi.

Ele era um colega que Laura tentava empurrar para Arte desde o primeiro dia da amizade delas. O garoto estava convencido de que Arte correspondia seus flertes, mas ela nem mesmo lembrava seu nome.

— Aqui é meio quente, né? — o garoto sorriu.

Eles estavam suando. Era quase maio, mas o calor nunca diminuía naquela cidade. Nunca. E Arte tinha cometido o erro de usar calça jeans e uma blusa preta de manga. Seu cabelo estava colando na nuca e nas bochechas. Tinha que se lembrar de cortar bem curto novamente, do mesmo jeito que usava no ensino médio. O cabelo no ombro não combinava com ela, e ficava grudando com o suor. Ela conseguia imaginar sua aparência naquele momento, mas não estava bem tentando impressionar ninguém. Só queria que o garoto saísse e Laura voltasse.

— Aqui é mesmo quente — a resposta foi dita, mas não por Artemísia. Ela olhou acima do ombro para trás de si, e quase engasgou com a própria saliva.

Arte não tinha medo de assombrações ou filmes de terror, mas tinha certeza de que era assim que as pessoas se sentiam quando viam um fantasma. A garganta fechada e o corpo congelado.

Theodoro Roriz era mesmo uma assombração que Arte não esperava encontrar. O mundo podia ser pequeno, mas ela não pensava que podia acabar esbarrando nele num bar qualquer.

Ele era como uma versão melhor do Theo do seu passado. Ela não sabia se ele tinha mesmo ficado mais bonito, ou se era o tempo sem vê-lo que tinha aquele efeito sobre ela. Haviam se passado o quê? Seis meses? E ele estava ali, sorrindo para ela e falando casualmente sobre o tempo.

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