Desde que tinha virado um mero reserva dos Roses, Nicolas sentia que seus dias se arrastavam. Tão lentos quanto os grãos de areia trocavam de lados em ampulhetas e, quando um dia acabava, não havia nada de novo. Apenas outro dia ordinário.
A quantidade de pessoas que beijava não fazia nem cócegas no seu humor e, mesmo descobrindo recentemente que as garotas não eram o único gênero que despertavam seu interesse, não conseguia manter a eletricidade em seu corpo por mais que dez minutos.
Seus amigos estavam sendo eliminados do jogo, como peças de dominó caindo. Victória não era a mesma depois de ser exposta para toda a escola e ele sabia que o relacionamento dela e Paula estava respirando com ajuda de aparelhos.
Nicolas ainda sentia as pontadas de dor por conta de Paula e Victória. Era por isso que estava naquela banheira, na primeira vez que Arte e ele tiveram uma conversa decente. Porque ele sabia que estava perdendo algo que acontecia bem debaixo do seu nariz. E, quando a foto de sua melhor amiga e sua ex-namorada veio à tona, Nicolas tentou contornar o sentimento de insuficiência que lhe dava picadas vez ou outra.
Ele não era bom o suficiente no vôlei, mesmo que sonhasse com isso. Podia tentar até a morte, mas Theodoro sempre seria a estrela que brilharia mais. Afinal, Theo era como o sol e as outras pessoas apenas orbitavam ao seu redor. Inevitável.
E então, desde que Arte e Nicolas viraram amigos, ela parecia ter se tornado mais uma peça prestes a desmoronar. Nico e ela não falavam muito sobre o Theo enquanto ela lhe ajudava a estudar, mas ele sabia que ela estava cada vez mais inquieta com as coisas que envolviam aquele garoto. E, naquela tarde, depois de descobrir que o clube da Arte estava fechado, Nico sabia que Theo sabia algo sobre aquilo. Todos sabiam de tudo, menos ele. Era assim que se sentia desde que Paula o tinha traído, quando ainda namoravam no ano anterior.
— Não está prestando atenção nenhuma — Miguel, um dos membros dos Roses, cutucou Nicolas. Bem na costela, onde ele odiava.
Miguel estava sentado ao lado do Nicolas desde que os testes começaram. Os dois ocupavam um canto da quadra, sentados no chão, e, embora Nico soubesse que todos eles esperavam que ele tomasse uma decisão, ele não estava disposto. Depois de tudo, não via mais propósito naquilo se dentro de meses estaria na faculdade. Não via os próximos Roses como um legado e achava que, se a maior parte do time não iria se formar, eles deviam escolher quem jogaria com eles no próximo ano.
— A garota de jeans está completamente descartada — Nicolas comentou o primeiro erro grave que seu cérebro processou.
Eles tinham reunidos os interessados em entrar no time em quatro times para partidas rápidas. Primeiro eles eliminariam os dois times perdedores e, então, eles selecionariam os jogadores dos times restantes. E, por mais que não estivesse prestando atenção, eliminar a garota de calça jeans era uma escolha óbvia.
— É... — Miguel suspirou. — Algum problema?
Nicolas observou os olhos castanho claro de Miguel, e bufou ao perceber a preocupação neles. Não queria mais uma peça de dominó prestes a cair, então não tornaria Miguel seu amigo mais próximo àquela altura.
— Você vai fazer o vestibular?
— Vou treinar, sim.
Miguel ainda não estava em seu último ano, então podia se dar ao luxo de fazer aquelas provas sem qualquer compromisso. Mas Nicolas ficava se perguntando se estaria em uma universidade no ano seguinte, se teria um futuro brilhante como o de Arte.
— Acho que as provas estão se tornando estressantes demais.
— Pelo menos você pode ir à festa do terceiro ano — Miguel sorriu.
Nicolas precisou de alguns segundos para acompanhar Miguel. A festa do terceiro ano.
A turma de Theodoro organizando uma festa só para os alunos das turmas que iriam se formar, em um sítio caro e longe, e ele havia se esquecido completamente de quando aquilo aconteceria. Só lembrava de ter prometido que, sim, iria com toda certeza e sorrido quando as garotas levaram toda a manha embora, sentindo-se idiota porque as pessoas achavam que uma festa não podia acontecer sem ele, mas pelos motivos errados.
O garoto pegou seu celular e digitou uma mensagem rápida a Artemísia, perguntando se ela já tinha pagado
Não vou, foi a resposta que recebeu minutos depois.
Pq?
Nicolas levantou a cabeça e fingiu prestar atenção no jogo enquanto esperava pela resposta da amiga. Dois meses se passaram de maneira tão desconexa que ele nem se lembrava de que a festa estava tão perto e imaginava que Arte também não devia se lembrar daquilo.
Porque não fui convidada.
Nicolas revirou os olhos, certo de que poderia matar Theodoro.
Eu estou convidando, fez o melhor para digitar sem qualquer erro. Por favor.
Me passa o endereço e a data, e vou fazer meu melhor.
Nicolas sorriu e o apito do treinador o assustou, fazendo-o levantar os olhos para a quadra. Os jogadores estavam dando um intervalo de dez minutos e ele decidiu que aquele era o momento perfeito para sumir dali por algum tempo e recuperar sua disposição em algum lugar.
Atravessou a quadra de vôlei e viu os cachos ruivos de Victória alguns metros à sua frente.
— Vic? — gritou pelo nome da garota.
Victória hesitou por um segundo, mas continuou andando. Ele até acreditaria que ela não tinha ouvido, mas estava sentindo que ela o estava evitando naquele dia. Bom, ela o estava evitando desde que as fotos com Paula rodaram por todo colégio, mas aquela era a terceira vez no mesmo dia em que a garota fingia que Nicolas não estava bem ali.
Ele apressou o passo, determinado a alcança-la. Victória saiu da quadra e entrou no vestiário e Nico continuou seu caminho até lá. Encarou a porta do vestiário feminino e riu, porque poderia muito bem passar o resto da vida esperando por ela ali fora, mas achava engraçado que Victória tivesse esquecido que ele não tinha um pingo de juízo.
Nicolas entrou no vestiário, o que causou um alvoroço nas garotas sentadas ali. Algumas dela saíram na mesma hora, e as outras apenas se calaram. Era todas garotas do segundo ano e primeiro ano, que estavam fazendo o teste para os Roses, e ele tinha certeza de que elas sabiam quem ele era. Ele lembrava até de uns rostos conhecidos que o acompanharam ao bosque uma ou duas vezes.
— Victória — ele disse, ciente de que a própria garota estava escutando.
Uma menina apontou para a última cabine de vasos. Ele fez um gesto com as mãos, pedindo para que elas saíssem dali, e em seguida disse: — Não digam uma palavra ao treinador.
As meninas concordaram, de olhos arregalados, e saíram dali o mais rápido possível. Nico foi até a cabine indicada e bateu na porta.
— Victória, pelo amor de Deus — disse. — Eu sei que está aí dentro. Não é pique-esconde. Abra a porta.
A porta do vestiário abriu, revelando a garota sentada sobre a tampa do vaso branco, apertando as pernas contra o peito.
— Por que está se escondendo de mim? — perguntou.
O queixo da garota estava tremendo.
— Você não vai me desculpar — disse.
Nicolas ajoelhou-se à frente dela e segurou suas mãos, esforçando-se para passar confiança acima do seu desespero.
— O que é?
— Eu sei quem enviou as fotos.
— Que fotos? Suas e de Paula? — estava confuso. Por que ele não a desculparia por aquilo?
— Não — ela balançou a cabeça. — Sei quem enviou as fotos de Artemísia para a diretora.

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Uncool
Teen FictionEm seu último ano de ensino médio, Artemísia só estava certa de três coisas: a primeira era que ela não fazia ideia do que faria em seguida. A segunda é que seu Clube do Livro era a única coisa que a mantinha feliz no colégio. E a última coisa era q...