Theodoro quase caiu para trás quando encontrou Paula bem na entrada do vestiário, esperando por ele como se fosse um assassino. A única coisa que o tranquilizou naquela cena foi que, mesmo com a habitual postura de predadora prestes a atacar, os olhos da garota expressavam algo que Theo nunca havia encontrado antes.
— Oi? — ele arriscou.
Os outros já tinham ido embora. Na verdade, ele esteve enrolando no banheiro, porque não sabia o que fazer depois dali já que Artemísia obviamente não o estaria esperando com um sorriso no rosto. Ele tinha achado que Paula já teria partido também, mas ali estava ela.
Era estranho estar a sós com ela mais uma vez. Ele lembrava bem da quantidade de tempo que passavam sozinhos antigamente — antes de toda aquela bagunça com Arte começar — e a maneira como eles aproveitavam o tempo não escapava da sua memória Não que ele olhasse para Paula de maneira sexual, porque ele dificilmente faria isso com alguma garota a menos que a situação fosse propícia, mas os dois já se beijaram mais vezes do que ele poderia lembrar. E agora martelava na cabeça de Theo o por quê Paula teria ficado tantas vezes com ele, mesmo que não sentisse atração por garotos. Ele não a tinha pressionado nenhuma vez sequer e, mesmo assim, ela parecia querer aquilo tanto quanto ele. E, no entanto, estava ficando com Victoria, por quem realmente sentia atração, e nunca ocorrera a ela que ele era uma das pessoas pra quem ela não precisava mentir.
— Precisamos conversar — ela disse.
Theodoro seguiu Paula até a entrada do bosque, o que os rendeu alguns minutos de caminhada em silêncio. Ele sentia que aquilo era importante, e isso automaticamente o deixou em um estado elétrico, consciente de tudo que o rodeava. Sentia cada gota que pingava do seu cabelo molhado e encharcava a gola da sua camisa. Sentia o peso da mochila nas costas e imaginava os poucos funcionários que ainda estavam na escola, terminando suas tarefas para encerrar o dia.
Quando pararam perto das árvores, a iluminação fraca o incomodou. Ainda era cedo para ligarem as luzes externas da escola, mas já estava escurecendo o suficiente para que ele não pudesse enxergar muito bem o rosto de Paula com a penumbra
— Está tudo bem? — ele perguntou.
— Eu estava muito, muito irritada ontem e acabei fazendo uma coisa da qual não me orgulho. Estou te contando porque isso afeta você diretamente, mas eu nem pensei nisso na hora. Só pensei no quanto eu queria ferrar a Artemísia por ter tirado você dos Peppers.
— Ela não me tirou — foi a primeira reação dele. E, depois, as coisas que ela tinha dito começaram a ser processadas. O que Paula tinha feito?
— Não quero discutir isso agora. Ok, Theo — ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha, e sua voz tremia, como se estivesse realmente nervosa — já faz um tempo, mas uma vez eu vi você e a Arte se beijando na biblioteca. Acho que foi bem quando fizeram as pazes, eu não sei e pouco me importa, para ser sincera. Mas eu tirei uma foto, porque naquela altura eu ainda estava muito puta com as minhas fotos que ela espalhou por aí.
— Não foi ela — Theo interrompeu. Ele não sabia por quê sua primeira reação era defender Artemísia, mas era a única coisa que conseguia fazer enquanto ouvia Paula falar.
— Enfim, eu tirei uma foto. Vocês não estavam só beijando, estavam se agarrando na biblioteca. Na época que eu tirei, eu não fiz nada com a foto. Mas ontem você foi embora do treino e eu estava irritada, porque ela consegue tudo o que quer e ninguém liga para o fato de que ela esteve a um triz de foder com a minha vida. Então eu enviei a foto para a diretora.
— Você o quê? — a pergunta foi retórica, mas Paula suspirou e tornou a explicar.
— Eu enviei a foto de vocês dois se pegando na biblioteca para a diretora. Fiz um e-mail bem carregado, dizendo que não era a primeira vez que os via se agarrando pela escola, e disse coisas que provavelmente deixará a diretora bem irritada com vocês dois, mas eu estou te dizendo isso agora porque quero pedir desculpas.
Theodoro fechou os olhos. Não conseguia calcular o tamanho do problema que aquilo traria e não conseguia pensar em uma solução que não envolvesse gritar com Paula ali mesmo.
Ele estava prestes a jogar o seu último Interescolar do ensino médio. Daria adeus àquela diversão para seguir uma vida completamente diferente, e aquilo era realmente importante para ele. E mal podia pensar no que aconteceria com Artemísia porque, para começo de conversa, a diretora o colocou no Clube do Livro para salvá-lo, não para beijar a garota. Além de tudo, os alunos eram proibidos de fazer coisas como aquela na escola. Eles já deviam agradecer que os funcionários faziam vista grossa em relação ao bosque.
— Não posso retirar o que eu fiz porque não há maneira de fingir que a foto não era verdadeira. E também não posso ir até a diretora e conversar com ela sem que ela chame meus pais e toda a história das minhas fotos beijando a Victoria venha à tona — ela estava chorando. — Eu não sei o que fazer, Theo. Desculpa. Eu não queria ferrar com você, só estava com raiva.
— Shhhh — ele balançou as mãos, implorando pelo silêncio para que pudesse pensar em alguma coisa.
— Se contar que fui eu, as minhas fotos vão acabar com o meu pai. Ele vai me matar, Theo — ela continuou com suas desculpas e lágrimas mesmo depois do pedido de silêncio. — Desculpa. Eu queria poder retirar o que fiz, mas não posso.
— Eu desculpo você — Theo disse. E, de fato, desculpava. Ele havia feito o mesmo com Artemísia, não é? Não podia dizer não à Paula.
No entanto, ainda tinha um problema prestes a explodir nele e não fazia ideia de como se livrar daquilo sem machucar ninguém.
— Eu preciso pensar no que fazer — disse à Paula.
Saiu em passos rápidos dali e, em seguida, deixou a escola, quase que em piloto automático.
Não estava certo de contar à Arte, mas não podia mentir para ela. Quando sentiu seu celular vibrar em seu bolso, tinha a certeza de que era uma ligação da garota, provavelmente com a pretensão de fazer as pazes depois da discussão do dia anterior. E nada daquilo o fazia sentir melhor.
Estava tão envolvido com os próprios pensamentos que não foi nem capaz de ouvir Artemísia chamar seu nome, na rua, e não fazia ideia de que ela tinha ido da casa de Nico até ali apenas para tentar encontra-lo e dizer que o amava.

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Uncool
Fiksi RemajaEm seu último ano de ensino médio, Artemísia só estava certa de três coisas: a primeira era que ela não fazia ideia do que faria em seguida. A segunda é que seu Clube do Livro era a única coisa que a mantinha feliz no colégio. E a última coisa era q...