QUATRO | * HELLO! *

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PIETRO


ME APOIEI NA mesa de seu escritório e descansei o queixo na mão direita. Observei-o silenciosamente.

— O seu olhar está queimando a minha cabeça — Enzo se queixou, rabiscando os traços de alguém no papel.

Eu sabia a quem pertencia os ângulos do rosto feminino.

— Você não deveria ter feito aquilo. Kananda não merecia — rangi os dentes.

Lorenzo deu de ombros, inexpressível.

— Eu sei. Mas ela precisa ficar longe desse clube. De mim.

Eu gostaria de poder dizer o contrário. Para que aproveitasse a sua vida, enquanto ainda tinha uma. Porque a morte chega para qualquer um, sem avisar, mesmo ele sendo tão parecido com ela e carregando o seu nome no ringue.

Mas não pude. Lorenzo deveria enxergar com seus próprios olhos que o seu destino não era preto e branco. Que poderia haver luz em seu caminho. Uma luz acobreada, um fogo que iluminasse a escuridão que carregava dentro de si.

— Você poderia tê-la afastado daqui e de você sem mandar um delegado atrás dela — comentei. — Porque se Kananda for presa, não vai conseguir evitar contar toda a verdade.

O lápis parou sobre o queixo da mulher.

— Que verdade? Ela não possui prova de nada, Pietro. E se for para estragar um futuro, que seja o do Ruthless, colocando a culpa em Scott. O verdadeiro assassino de Patrick, caso tenha esquecido.

Não. Eu não havia esquecido.

Além do mais, os relatos do estado do corpo do rapaz chegaram até aqui. Eu sabia bem que para ter aquele nível de destreza, o moleque deve ter sido treinado por Sadrack. Mais um na fila.

Não falei nada, mas Lorenzo sentiu o peso dos meus pensamentos e da minha reprovação. Eu avisei que confiar em meu irmão seria tolice, mas ele não acreditou. Simplesmente fez uma aliança com Sadrack. E olha o que aconteceu? Mais de cem pessoas tinham morrido nesse clube.

O sangue banhou todos os azulejos e paredes. E quem foi o idiota que limpou tudo e enterrou-os atrás do clube, sem identidades? Claro que fui eu. Lorenzo não moveu um dedo. Por ele, os cadáveres iriam se decompor onde morreram.

Além do mais, tive que ter o cuidado de não ser visto por ninguém. E para que notícias não vazassem aos jornais, atiçando seus faros certeiros até aqui. Seria desastroso se começassem a nos investigar profundamente.

Mas para aquele delegado ter descoberto o que houve... Talvez estivesse ficando velho e esquecendo de alguns passos ao ser sutil.

— O que você vai fazer? — Perguntei.

Enzo deixou que a cabeça pendesse em direção à mesa de seu escritório.

Meu Deus. Onde estava o garoto comprometido e corajoso que conhecia?

Vendo-o agora, seu aspecto me dava nojo e tristeza. Os cabelos desalinhados, os olhos verde azulados perdidos. Ele não queria se ajudar e isso me irritava. Tudo porque Gabriel tinha perdido as memórias e estava longe de nós.

E com uma desconhecida para ele. Trixie.

Isso estava massacrando Lorenzo.

— Fazer sobre o quê? — Passou os dedos longos pelo rosto cansado.

— Acho que sobre tudo.

Lorenzo levantou e seguiu meu olhar. Tudo, completamente tudo estava de pernas para o ar. Mesmo assim, ele não se preocupou em arrumá-lo. Não queria saber o que Dharck pensou ao ver o escritório daquela forma desorganizada.

— Bem — Lorenzo mordeu o lábio, ficando momentaneamente pálido. — Tenho que matá-los.

— É mesmo? E como vai fazer isso? — Me irritei, vendo seu estado. — Sentando na cadeira e ficando bêbado?

Ele me lançou um olhar duro.

— Você já perdeu alguém nessas proporções? Sabe pelo que estou passando? Ver meu irmão não me reconhecer, olhar para mim completamente indiferente, me mata a cada dia, Pietro!

Você não faz ideia. Não me intimidei.

— Já perdi e sei sim pelo que está passando, imbecil. Aos seis anos de idade, comecei a ser criado por um bando de homens que nos torturavam. Perdi os amores da minha vida duas vezes, uma para Sadrack e outro para a morte. Perdi meu irmão e estou perdendo você também. Todos temos problemas, Lorenzo, e cabe a nós enfrentá-los ou deixá-los nos carregar para o fundo do poço.

Ele engoliu em seco e baixou os olhos, envergonhado.

— Tudo bem — murmurou. — Grande lição de vida. Obrigado.

— Seu sarcasmo não me incomoda — rosnei. — Levante essa cabeça e tome um banho enquanto limpo essa bagunça. Depois... quero mostrar algo a você.

Lorenzo assentiu, resignado, se dirigindo para o banheiro infiltrado no escritório.

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Se não desse certo a minha vida de lutador, assassino ou sócio do Perverse, poderia virar faxineiro. O escritório estava um brinco quando Enzo saiu do banho, com os cabelos molhados e parecendo um pouco melhor.

Os olhos ainda estavam sem vida, mas a postura parecia mais decidida.

— Belo trabalho — elogiou.

— Não se acostume. — Sorri e cruzei os braços. — Agora venha comigo.

Ele assentiu e me seguiu. Descruzei os braços e abri uma das portas daquele corredor com sutileza, para não acordar o homem que estava deitado e dormindo, com bandagens na barriga, feitas por mim.

Lorenzo arregalou os olhos ao vê-lo.

Ele está vivo?

— Sim. Ele têm músculos fortes, não seria um tiro a derrubá-lo. Não lhe mostrei antes, porque... — hesitei, mas Lorenzo entendeu meu ponto e fez que sim, desconfortável.

— Mas no que ele vai servir a nós, Pietro? — Replicou. — Todos acham que ele morreu.

Antes que pudesse responder, o homem deitado na cama abriu os olhos castanho-escuros. Tão familiares.

E nos encarou friamente.

Death | Vol. IIOnde histórias criam vida. Descubra agora