Capítulo 18

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Baldes caídos, batidas com a cabeça nas portas, joelhos doloridos por sempre bater nos móveis, quedas constantes no chão, sempre alguém gritando: “Lia, cuidado!” e de repente, “bum!” algo quebrava, ou me machucava na mesma hora. O meu corpo estava coberto de hematomas.

Certa manhã, estava saindo do banheiro quando senti o beijo do meu dedo mindinho com a quina de um móvel. A dor me levou a profunda aflição. Eu quis gritar, mas, com muito esforço, segurei minha raiva.

"Não vou suportar isso por mais tempo", pensei.

— Lia! — Era a voz de Jamile vindo me socorrer. — Venha por aqui. — Ela me buscou de onde eu estava e me levou pra sentar no sofá.

Passei as mãos entre os cabelos e afundei a cabeça entre as palmas abertas. Estava farta de ter meus dias na escuridão e uma profunda angústia me dominava ainda que eu não desejasse.

— Jamile, eu quero morrer! — exclamei a dor do meu coração.

— Não fala assim, Lia. — Ela acariciou minhas costas, tentando me consolar. — Todas as dificuldades nos auxiliam em algo.

— Em que perder a visão poderia me ajudar? — questionei irritada. — Eu tenho tentado trazer à memória os motivos dos sofrimentos dos santos e saber que Deus rege cada um deles. Tem dias que meu coração se consola com isso e tem momentos que só quero me livrar desse fardo.

— Sabemos que nossa leve e momentânea tribulação está produzindo para nós um peso eterno de glória — ela disse.

— Hoje nada disso me consola. — Afundei mais minha cabeça entre as mãos abertas e me permiti chorar.

Ainda estava afundada na minha penúria quando ouvimos um som de música secular ressoar alto do lado de fora. Quem colocaria aquilo? Uma aflição maior tomou conta de mim.

Passou algum tempo, e Nicolas com os outros jovens chegaram, na casa só estava eu e a Jamile, que ficou para me auxiliar. Assim que os demais retornaram, eu falei.

— O que é isso, hein? — O som tinha ficado mais alto  e agora algo com muita gritaria tinha começado.

— Uns vizinhos parece que decidiram fazer uma festa. — Reconheci a voz de Tiago.

— E a balbúrdia está grande! — Mariana com seu timbre mais agudo declarou.

Eu fechei os olhos mais entristecida.

— Se sente bem, Lia? — Era Nicolas próximo de mim.

— Não mesmo! — Foi o que declarei. — Qual está sendo a nossa diferença aqui?

— Parece que nenhuma. — Jamile suspirou ao meu lado. — O mal prospera com rapidez, enquanto a palavra de Deus não — sua fala era penosa.

A dor da inutilidade invadiu do meu coração. Cadê a luz que deveríamos brilhar para esses ribeirinhos perdidos? Nós não avançamos tanto quanto o pecado naquele lugar. Em vez das pessoas buscarem em Cristo o alívio de suas cargas e a esperança para se reconstruir, eles iam ao pecado, esse que aparentemente tinha o conforto mais rápido. Porém, no fim, só contribuía com mais desgraças.

— Por isso que a bíblia em Romanos 3 que os homens não conhecem o caminho da paz. Não há ninguém que busque a Deus — declarei para todos que se encontravam na sala, seja quem fosse. Eu não podia ficar só lamentando a minha situação. — Só Deus pode convencer o coração do pecador e  iluminar a mente do ímpio.

— Nós só podemos levar a palavras aos ouvidos dos homens, quem faz descer ao coração é o Espírito Santo e por isso precisamos orar! Isso é vital em meio a essa grande seca tanto natural quanto dessas vidas. — Nicolas complementou minhas palavras.

— Quão falhos e imperfeitos somos — Jamile pronunciou. — Como Ele pode querer contar com a gente para anunciar o seu evangelho? Os anjos fariam o trabalho melhor.

— Mas é porque Ele quer que façamos parte da sua grande obra na terra. Pregar o evangelho é um privilégio, porém Deus ainda permite nossas fraquezas para sempre lembrarmos que a obra é dEle e só avança por Suas mãos — Tiago declarou com firmeza.

As palavras dele foram como golpe no meu coração "A obra dEle e avança por Suas mãos". Será que eu tinha esquecido isso? Será que todo esse tempo estava lutando com minhas forças?

— Cristo e o seu poder é a nossa única esperança disso tudo dar certo. Se ele não intervir não avançaremos — Mariana falou, nos levando a lembrar da graça do Senhor.

— Ele é a única arma que temos para tudo na vida. Em todas as coisas. —  Larissa, nossa enfermeira, entrou na conversa.

Cristo era mesmo a nossa esperança. Em tudo deveríamos esperar nele. Eu só podia crer no poder dele para me curar, para concluir aquela missão, resolver as indagações do meu coração. Eram tantas coisas e nós só podíamos esperar com confiança.

— Eita! — Uma voz feminina ressoou na sala, nos tirando do assunto que falávamos.

— O quê? — eu indiquei para a pessoa que tinha exclamado.

— Parece que com chegada dos militares as meninas se alvoroçaram mais!

— De quem está falando, Jeniffer? — Senti Nicolas sair de perto de mim para checar a situação.

— Nossa! Eu só espero que nenhum deles se deixem levar — Marina declarou um pouco distante.

Meu coração ficou aflito porque Artur podia ser um desses homens. Eu sabia que a Vivian desejava o conquistar e, com sinceridade, não podia confiar totalmente se ele resistiria por tanto tempo à tentação. Afinal, ele era um jovem viúvo cujo instintos masculinos estão em máxima.

"Preserve o Artur, Deus! Que ele tema mais a ti do que seus próprios anseios carnais" Essa foi minha breve oração.

— Olha que conseguiu atravessar o mar vermelho e chegar? — Era Jeniffer fazendo piada.

— Lia? — O timbre daquele belo tenente nunca podia ser confundido.

— Artur! — Senti meu estômago pegar fogo. Nem parecia que tinha falado com ele há poucos dias.

A situação era que cada vez mais estava me apegando a ele e ficar longe se tornava uma mini tortura. O que aconteceu com você, Lia? indaguei para mim mesma.

— Eu trouxe algo para você. — Ouvi seus passos se aproximando?

— É um presente? — questionei curiosa.

— Pode ver como um presente. — Ele estendeu para mim e assim que toquei no objeto meu coração se despedaçou de vez.

🪵

A margarida aqui apareceu, pretendo não mais sumir!

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