Capítulo 24

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Na manhã cedo do outro dia, Jamile me acordou. Ela me informou que Artur estava à espera. Estranhei que ele pudesse vir tão cedo, sendo que o horário que ela me informou quando perguntei ser às 6h da manhã.

— Ele pulou da cama, foi? — perguntei, levantando-me.

— Não faço ideia. — Ouvi sua risada. — Deixei ele na varanda para você ter tempo de fazer sua higiene matinal.

Eu agradeci e segui para o banheiro. Depois de uns 15 minutos estava pronta. Coloquei uma bermuda e camiseta, prendi o cabelo e cheguei até ele com minha bengala.

— Olá, Artur. — Saudei-o. — O que faz aqui tão cedo? Estava com tanta saudades de mim? — Brinquei com um sorriso travesso nos lábios.

— Bom dia, Lia. — Recebi de surpresa um beijo na bochecha. Aquilo aqueceu meu coração. — De certo modo, sim. — Ele se afastou.

— Tudo bem. Assim, eu o perdoo por me fazer levantar tão cedo! — disse, e ele pôs meu braço esquerdo em volta do seu, começando a me conduzir.

— Tenho dois motivos para isso — ele declarou-me enquanto descíamos os pouco degraus da casa. — O primeiro é que bem cedo o tempo está mais frio porque daqui a algumas horas o sol vai estar quase insuportável.

— Não posso negar essa verdade. — Eu concordei. — Esses dias a Jeniffer e Joabe estavam até passando mal com o calor e nada de chuva.

— Se você pudesse ver o quanto esses dias tudo ficou num tom mais marrom e o verde da mata se perdeu, doeria no peito. — As palavras de Artur me comoveram. Ver a linda floresta perder seu viço era triste.

— Precisamos orar pela chuva — declarei, fazendo uma anotação mental daquilo.

— Precisamos orar por tanta coisa. — O tom dele estava baixo, quase podia discernir uma tristeza. Mas não disse nada.

De ontem para hoje, depois da minha conversa, nada agradável com Nicolas, ponderei que as pessoas nem sempre querem expor o que pensam ou sentem quando são questionadas. Respeitar essa individualidade era um tanto difícil para mim porque estava acostumada a sempre achar que os outros deveriam processar tudo como eu. Mas, com duras penas, tenho compreendido que não. Se ele quisesse falar, assim seria.

Ele me guiou por uma trilha e passamos um tempo em silêncio. Depois de mais uns minutos, Artur me sentou no chão, mas tinha um pano abaixo.

— Isso é um piquenique? — falei um tanto surpresa.

— É mais um café da manhã ao ar livre. — Ele riu. — Acho que precisaríamos de um pano listrado vermelho e comidas típicas de piquenique.

— O que seria comidas típicas de piquenique? — questionei curiosa.

— Ah, não sei! Talvez sanduíches com atum, salgados, sucos, biscoitos, tortas e bolos. Esses tipos de coisas. — Artur suspirou. — Aqui só temos um tecido azul, pão com tucumã, tapioca, café e jambo.

— Mas isso é um banquete amazonense! — Eu sorri com a barriga faminta. — E eu jambo, por favor, me dê logo um. — Estendi a mão para ele, que me deu a fruta cor de vinho e logo dei uma grande mordida. — Obrigada por isso.

— É bom saber que gostou.

— Você, Artur, é o homem mais cuidadoso que já conheci. Sério mesmo! — falei com sinceridade. — Realmente se importa com o próximo e zela por ele. Saiba que aprendi muito com você nesses tempos.

— É gentileza sua, Lia! — Seu tom grave ficou mais sério. — Sei que tem passado por tempos difíceis com a perda da sua visão, com o desânimo da missão e a crise que essas mulheres do bar estão fazendo. Tudo isso pesa.

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