Capítulo 8

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Durante o fim da tarde de uma quinta-feira, após ter distribuído todos os kits que estavam comigo, caminhei sozinha pela trilha da comunidade — as meninas que me acompanhavam já haviam voltado com Nicolas — usei daquele momento para me perder nos pensamentos.

Um leve desespero tentou assolar meu coração, ao ponderar o quanto as pessoas ali ainda eram fechadas, mas eu não podia perder a fé. Deus tinha me enviado para aquele lugar. Ele usaria a minha vida ali. E eu não tinha opção de me deixar abater. A obra precisava continuar firme. Respirei fundo e continuei andando, até que senti uma pessoa se aproximar.

— As pessoas ficam bem depois que você fala com elas — Era Artur.

Observei-o e ele andava com as mãos descansando nas costas e olhando para frente. Suas palavras foram poucas, mas certeiras.

— Obrigada. — Sorri e ele retribuiu, contudo, seu sorriso não chegava aos olhos. — Como me encontrou?

— Eu estava por perto. — Não deu mais muitas explicações. — Você como sempre sozinha.

Soltei uma risada baixa e assenti.

— Eu gosto de ter momentos de solitude.

— Lia — ele se virou para mim apesar de continuarmos andando —, lembre-se que você não está na cidade. Por aqui, acontecem crimes também.

Aquela fala dele pesou em meu coração.

— Mas, eu entendo seu querer de fazer bem ao próximo. — Ele teceu um elogio, mas o tom de preocupação ainda estava presente.

— Eu sempre pedi isso a Deus — declarei. — Que me fizesse uma benção na vida das pessoas. — Apertei os lábios e parei de andar. Ele também parou.

Naquele momento, seu olhar sobre mim foi profundo .

— Ele ouviu suas orações. — Sua voz era calma e grave.

Eu corei um pouco.

— Talvez nem tanto. — Suspirei um pouco e voltei a caminhar, atentando-me para o chão barrento.

— Por que diz isso?

— As pessoas aqui são difíceis. — Abri os braços. —Já fiz missões em vários lugares complicados, contudo, os outros corações pareciam mais dispostos a ouvir o evangelho.

– As pessoas são pecadores, Lia. Elas naturalmente sabem ser indispostas e indiferentes ao evangelho. — Me exortou.

— Eu sei... Eu sei...  — Balancei a cabeça um pouco confusa. Não esperava aquelas palavras dele.

— Todo evangelista tem que ser como o “Bom Semeador” — ele continuou: — Sabendo que ele só pode lançar a semente, mas não pode prever em qual terra vai cair, mas confiando que chegue numa frutífera. Tem que ter fé!

— Eu tenho fé — respondi, de imediato. Não queria que ele tivesse uma visão de que eu não soubesse o que estava fazendo ali. — Mas a gente tem que se esforçar. Tem que falar até que eles possam crer e confiar. Se nós não fizermos, as pedras clamarão.

Artur apertou os olhos em minha direção e assentiu. Nada mais pronunciou.

Ele, com todo seu cavalheirismo, me acompanhou até em casa. Não demorou para se despedir depois de me ver sã e salva. Fiquei parada na porta o vendo se afastar, eu gostaria de poder conhecê-lo melhor, mas notei que havia algo nele que não o permitia se abrir. O que seria?

Deixei aqueles pensamentos de lado, e ao chegar à cozinha, percebi que Davi brincava com Jamile e Nicolas e os três se divertiam juntos. De repente, passou pela minha mente a possibilidade deles serem uma família. Nicolas seria um excelente pai e esposo. Jamile também haveria de ser uma boa mãe e esposa. Ela tinha somente 24 anos, contudo, possuía sabedoria, bondade e gentileza. Além de sua aparência ser agradável, ela possuía cabelos longos, castanhos e ondulados; olhos amendoados, sorriso gentil, rosto meigo. Eles juntos seriam felizes, no Senhor.

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