Capítulo 35

622 130 42
                                    

ARTUR DANTAS:

Eu me encontrava muito melhor. A recuperação estava sendo rápida conforme Chelsea havia dito, nos tornamos bons colegas. Minhas memórias ainda falhavam, contudo comecei a esforçar minha mente para lembrar. Enquanto exercitava minha mente, Steve, o médico, entrou para conversar comigo. Ele era diferente da esposa, mais calmo e centrado. Chelsea era espontânea e muito divertida. Mas, os dois juntos se amavam e se completavam de modo único.

— Está na hora de você sair dessa oca — Steve falou, sentando ao meu lado. — Precisamos fazer com que seu corpo se mova. Ele pode atrofiar por ficar tanto tempo parado — explicou-me a situação.

— Tudo bem. — Soltei o ar em desespero e esperança ao mesmo tempo.

Primeiramente, Steve me ajudou a sentar. Não podia negar certo temor ao pensar que minhas pernas poderiam não querer mais funcionar, porém precisava confiar no Senhor. Após alguns minutos, ele esticou meu corpo pra cima. Me esforcei para firmar os pés no chão. Enquanto tentava ficar de pé, Chelsea entrou e ao ver a minha tentativa começou a me incentivar.

— Você consegue! — Ela batia as mãos uma na outra em demonstração de confiança.

Agradeci pelo incentivo dela.

Orei internamente pedindo a Deus forças para fazer aquilo. Firmei novamente os pés no chão, levantei o corpo sobre as pernas, Steve vendo minha disposição pegou duas muletas feitas para mim feitas de madeira.

— Pode-se apoiar nelas. — Arrumou as muletas debaixo dos meus braços.
Me apoiei e dei os meus dois primeiros passos, mas o cansaço físico logo predominou. Steve colocou o banco para que eu sentasse. A minha respiração estava ofegante com aquele movimento, mas ao mesmo tempo fiquei feliz por minhas pernas funcionarem.

— Você logo andará — assegurou o médico com um sorriso confiante. Ele guardou as muletas no canto da parede. — Amanhã praticaremos mais, um dia de cada vez.

Assenti com a cabeça.

— Parabéns, você é um guerreiro. — Chelsea falou, se aproximando de nós dois.  — Não é todo mundo que sai dessa de uma forma tão forte assim, Artur. — Ainda expressava suas considerações para com meu esforço quando uma menininha entrou na oca.

— Mamãe? Mamãe? — A garotinha tinha olhos azuis e cabelos loiros, uma cópia fiel de Chelsea.

— Oh, minha querida! — Chelsea pegou a garotinha no colo. — Este é Artur. Diga: oi. — Ela acenava para mim no intuito da filha repetir o gesto.

— Oi — falou com a voz doce de criança.
Eu acenei para a criança tão encantadora.

Quando olhei no profundo azul dos olhos da menina, lembrei de uma criança vindo em minha direção. Minha mente estava confusa e uma dor começou a pulsar forte. Eu apertei meus olhos, querendo que as memórias voltassem.

— Papai, papai — a voz da menina disparou dentro da oca e aquele timbre rompeu a bolha em que eu parecia estar preso.

A visão da criança retornou com violência e desde seu nascimento até os primeiros passos em minha direção, voltaram em minha consciência. Sim, minha pequena Mila. Os olhos azuis e loiros como de Ângela. Mais uma vez e, com uma alegria radiante, mirei a filha dos missionários e sorri com lágrimas nos olhos e pedi para abraçar a criança a minha frente. Chelsea a colocou em meu colo.

— Qual o seu nome? — perguntei com a voz embargada ao relembrar de minha filha. Quantas saudades eu sentia dela. 
— Emma — respondeu a pequenina com sua voz aguda.

— Você se parece com minha filha. — Minhas lágrimas não resistiram em meus olhos e se manifestaram a todos, descendo em minha face.

— É? — Emma indagou não se dando conta de quanta emoções ela me despertava.

Eu a abracei fortemente.

— Você se lembrou — Unindo as mãos frente a face e percebi seus olhos marejados diante do milagre que se desenrolava bem ali diante de nós. 

— Se lembra de mais alguém, Artur? — perguntou Steve, olhando fixamente para mim enquanto se apoiava na cadeira à minha frente.

Eu observava Emma e lembrava de Mila, minha esposa e minha família no Brasil. Tudo o passado voltou como uma onda em minha mente.

— Consegue se lembrar? — Ele insistiu na pergunta.

Por mais que eu me esforçasse, não conseguia ir além ou mesmo recordar de alguém.

— Eu não me recordo de mais nada. — Olhei para o casal que me observava com indagação.

— Tudo bem. Esse processo é mesmo lento e aos poucos você vai conseguir ter de volta tudo que foi tirado com esse acidente.

— Deus queira.

Eles saíram da oca e eu voltei a me deitar, com as mãos para trás da cabeça, eu visitava as memórias da minha família. Minha esposa e a minha filha e como tudo aquilo havia sido tirado de mim de maneira tão brusca.

— Senhor, acho que nunca fui tão honesto contigo. Admito que o odiei por muito tempo quando foi arrancado de mim aquilo que eu tinha de mais precioso. — Suspirei cansado. — Eu não esperava que o seu amor se manifestasse na dor mais profunda. E eu merecia a morte, mas estou aqui vivo. É mais do que mereço. Obrigado por tuas ternas misericórdias.

Será que haveria um recomeço em algum lugar?

Ao meditar sobre todas as suas questões, percebeu a entrada na sua oca de uma mulher morena. Ela tinha os cabelos castanhos e cumpridos e falou algumas palavras para si mesma e saiu. Aquele tom de cabelo me lembrou... e uma voz rompeu em meu consciente e era como se tivesse sussurrando nos meus ouvidos.

— Eu orarei por você. E clamarei por sua vida até você voltar. — Tocou em minha face, como se quisesse guardar minhas afeições. — Nunca o esquecerei.

O sorriso dela brilhou em minhas memórias, e uma agitação e euforia começaram a dominar meus sentimentos e motivações. Eu precisava me recuperar, precisava voltar para minha filha e para a mulher que havia conseguido ter meu coração em suas mãos.

— Lia! — Sorri completamente apaixonado.

🪵

Quem é viva sempre aparece, não é? E eu aqui chego novamente. Gente, são tantas coisas acontecendo, mas pretendo sim terminar essa história e não mais deixar tanto tempo parada. Vamos lá!

Uma Porta de EsperançaOnde histórias criam vida. Descubra agora