Capítulo 16
Já passava das 11 da noite, quem poderia estar naquela casa àquela hora? Caminhei sorrateiramente até a sala e levei um dos maiores sustos de minha vida ao me deparar com um homem alto, forte e grisalho, que fazia sinal de silêncio, levando um dedo à frente da boca.
Era Zane Pickford. Ele estava de pé bem na minha frente. Sua camisa social estava desabotoada até a metade, revelando os pelos em seu peito. Também notei que ele estava de meias, mas sem sapatos nos pés.
— O que diabos você está fazendo aqui a essa hora? — vociferei.
— Shhh! Sua mãe está dormindo — respondeu tranquilamente. — Foi difícil convencê-la a vir descansar um pouco. Não queremos que ela acorde.
Olhei para o lado e vi minha mãe dormindo serenamente no sofá da sala. A TV estava ligada, mas o som estava tão baixo que era quase inaudível. Havia uma taça vazia no chão, ao lado de uma garrafa de vinho que já estava pela metade.
— Ela não deveria estar no hospital com Megan?
— Claro. Mas estamos a menos de 5 minutos de lá, e Meggie também já estava dormindo quando saímos. Deixei todas as enfermeiras sob aviso. Se ela precisar de nós, estaremos lá em questão de segundos.
— Você me assustou! — levei a mão ao peito e respirei fundo.
— Me desculpe. Mas e você, rapaz? O que o traz aqui a esta hora?
— Só vim buscar uma coisa. Já estou de saída.
Senti raiva por vê-lo ali tão tarde, somente com minha mãe naquela casa. Mas minha busca por alívio às dores era mais importante do que uma briga com ele naquele momento.
Dei as costas para Pickford e subi as escadas, desesperado. Corri para meu novo quarto, abri a gaveta e tive mais um susto na mesma noite: os remédios que eu estava procurando de fato estavam ali, mas eles não eram os únicos. Lá estava também o frasco de OxyContin que eu já deveria ter jogado fora há semanas.
Eu sabia dos riscos. Sabia que não devia tomar aquele medicamento outra vez. Não podia! Mas, por outro lado, ele estava bem ali, ao alcance das mãos; um alívio fácil para uma dor dilacerante. Eu podia acabar com tudo aquilo em um instante. Era só engolir alguns comprimidos de oxicodona e a dor teria ido embora.
Comecei realmente a considerar a possibilidade de voltar a utilizar aquela perigosa droga. Minha boca parecia ainda mais seca agora que eu observava o frasco repousando sobre a palma de minha mão. Levei a língua entre os lábios na tentativa de umedecê-los, e notei que ela estava trêmula, como estava todo o restante de meu corpo.
Fechei a mão em que tinha o frasco e a sacudi, me certificando de que ali ainda havia comprimidos. A tarja preta no rótulo já não me parecia mais ameaçadora, mas sim convidativa. Retirei a tampa da pequena embalagem e coloquei uma única cápsula na ponta de um dedo. Meu desejo naquele momento era simplesmente engolir aquilo e me ver livre daquele sofrimento. Mas não tive coragem.
Guardei o remédio de volta no frasco e o enfiei no bolso. Tomei um tablete de Ibuprofeno e outro de Naproxeno. Fiz o que era certo naquele momento. Quase tudo certo. Exceto pelo fato de ter saído da casa levando comigo aquele frasco de OxyContin que agora carregava no bolso.
Quando voltei ao dormitório, Liam já estava dormindo. Entrei sem fazer barulho e me sentei na cama, esperando que os medicamentos que eu havia tomado fizessem seu devido efeito. Nada aconteceu. Eu continuava com dores, cansaço, calafrios e vários outros sintomas que eu sabia serem de abstinência.
Me peguei novamente encarando o pequeno frasco em minhas mãos. Parecia tão simples, tão fácil! Era só tomar um ou dois, e todos aqueles problemas iriam embora quase que instantaneamente.
Fechei os olhos e tentei imaginar as consequências. Recordei-me das noites sombrias que passei no hospital, lutando contra aquele vício; do sofrimento que causei não só a mim mesmo, mas aos que estavam a minha volta. Concluí que não valeria a pena. Atirei o frasco no chão e o barulho acordou Liam.
— O que está acontecendo? — perguntou, atordoado. — Você está bem?
— Não! Quem receitou Ibuprofeno para abstinência em opióides só podia ser um idiota! — desabafei.
— O quê?
— Nada. Você pode me ajudar?
— O que foi? — ele se levantou num pulo.
— Preciso que jogue isso fora por mim — apanhei do chão o remédio e o lancei na direção de Liam. Ele o pegou no ar.
— Mas... agora?
— Não. Tudo bem se for amanhã. Só quero que mantenha isso longe do meu alcance e se livre disso o quanto antes! Por favor.
— Claro. Farei o que puder.
Liam enfiou o frasco debaixo de seu travesseiro, deitou-se e voltou a dormir tão rápido que até me deixou impressionado. Já eu continuei me revirando na cama até ser vencido pela exaustão, quando finalmente adormeci.
No outro dia, Liam não fez nenhum comentário sequer sobre o que havia acontecido naquela noite. Eu não sabia se ele estava mesmo se lembrando, ou se podia estar achando que tudo não passava de um sonho. A dúvida permaneceu comigo o dia inteiro, enquanto eu me esforçava ao máximo para assistir às aulas, a despeito da dor. Somente a noite, quando nos preparávamos para dormir, foi que Liam quebrou o silêncio e desfez o mistério:
— Joguei fora aquela parada. Você não vai ter que se preocupar ver aquilo nem mais um dia.
— Valeu, parceiro! — agradeci aliviado.
Pouco depois de nosso diálogo, o quadro piorou. As náuseas que eu vinha sentindo chegaram a um ponto insuportável e eu voltei a vomitar. Vomitei até já não ter mais absolutamente nada no estômago, mas continuava enjoado. Tentava não fazer muito barulho, com medo de que Liam percebesse minha situação.
Mais tarde, durante minha ligação com Jessie, pensei em contar a ela pelo que eu estava passando.
— Jessie, eu...
— O que foi? — ela perguntou do outro lado da linha.
— Eu sinto tanto a sua falta! — conclui, sem coragem de dizer a ela o que de fato estava acontecendo.
— Também sinto a sua, Sammy. Vem cá, chega o seu rosto bem perto da tela para eu poder te dar um beijinho.
Aproximei meu rosto da câmera e ouvi o som característico de um beijo, vindo do celular. Nos despedimos depois disso.
Dormir foi novamente um desafio. Os remédios adjacentes já não faziam mais qualquer efeito. Eu só podia esperar que aquela crise passasse logo. Mas ela não passou.
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SOB O MESMO CÉU
RomanceLivro 2. A sequência da história de Sob a Luz do Sol. Este é o segundo livro da trilogia.