Capítulo 70

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Capítulo 70

Passados alguns dias, eu ainda não conseguia tirar da minha cabeça aquele pensamento que Jessie havia posto ali: seria legal morar em Nova York, perto dela.

Estava tomando café da manhã, Becca estava no meio de um monólogo sobre seu trabalho no restaurante, eu estava lutando para prestar atenção, mas Jessie estava dominando meus pensamentos.

— No quê você está pensando? — Becca enfim perguntou.

— Jessie me falou que queria que eu fosse morar em Nova York — falei com sinceridade.

— E você vai?

— Não dá. Meu emprego exige que eu more aqui, também tenho minha família aqui, e nada lá além de Jessie.

— E você não pode arranjar um emprego lá?

— Não é tão fácil.

— Humm... — Ela deu de ombros.

— O que você estava dizendo? — perguntei, e ela então continuou. Desta vez eu prestei atenção.

Acontece que Becca agora estava se encontrando em uma nova paixão: a confeitaria. Ela estava empenhada em fazer doces e eu era sua única cobaia para experimentar, já que Liam não comia mais doces, seguindo uma dieta estrita alinhada ao crossfit. Naquela manhã comíamos muffins de blueberry com cream cheese, que ela havia feito. Estavam deliciosos.

Em geral, suas receitas eram muito saborosas, mas eu não era um grande fã de doces e já estava ficando enjoado de provar tantos todos os dias. Becca exagerava na frequência com a qual testava novas receitas.

Certa vez eu estava tomando banho  tranquilamente em meu banheiro privativo. Não achei que precisasse trancar a porta, afinal o banheiro ficava dentro de meu quarto, e só eu usava. Eu nunca trancava a porta, até aquele dia.

Becca bateu na porta que estava fechada, mas não trancada.

— Tem gente — eu gritei lá de dentro. Ela entrou mesmo assim.

— Sam, experimenta esse crème brûlée e me diz o que achou. Mas preciso da sua opinião sincera.

Eu puxei instintivamente as cortinas do box, que já estavam fechadas, somente para me certificar de que ela não podia me ver ali, nu, debaixo do chuveiro.

— Becca, eu estou tomando banho. Isso não pode esperar um pouco?

— Anda logo, por favor — ela disse, e eu pensei que ela fosse sair e me esperar lá fora. Porém ela colocou as mãos por cima do suporte das cortinas, segurando um ramekin e uma colher de sobremesa. — Vai, experimenta.

— Rebecca, eu estou pelado!

— Meus parabéns, mas eu não vim aqui ver isso. Só preciso da sua opinião. Vamos!

Contrariado, peguei o ramekin e provei o tal crème brûlée. O chuveiro ainda ligado, as gotas de água quente batiam em meus ombros e respingavam sobre o creme.

— Está gostoso — avaliei.

— Seja específico. Você achou que está doce o suficiente, muito doce, ou que ainda falta açúcar?

— Bem, eu não sou a melhor pessoa para avaliar sobremesas. Talvez eu não comeria tudo, está um pouco doce demais para mim.

— Droga! — ela exclamou, e apesar de estar do outro lado da cortina, eu ainda podia sentir sua frustração. — Vou fazer tudo de novo.

Becca saiu do banheiro e bateu a porta, me deixando com um ramekin e uma colher nas mãos, debaixo do chuveiro. A partir daquele dia passei a trancar as portas.

SOB O MESMO CÉUOnde histórias criam vida. Descubra agora