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Me olhei no espelho e achei melhor esconder as marcas da minha dor atrás de óculos escuros, ou pelo menos o que dava para cobrir com eles

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Me olhei no espelho e achei melhor esconder as marcas da minha dor atrás de óculos escuros, ou pelo menos o que dava para cobrir com eles. Para cobrir outras, usei meu próprio cabelo e um pouco de maquiagem.

Mesmo eu tendo tomado a frente e decidido que a Kássia me acompanharia no depoimento, meus pais insistiram em vir e eu não protestei. Gosto de saber que eles vão estar por perto, só não quero que saibam de todos os detalhes do que aconteceu.

No caminho, ligamos para o nosso advogado e pedimos para que nos encontrasse aqui na delegacia. Apesar das cadeiras da recepção serem até um pouco aconchegantes, não há posição em que eu consiga me sentir confortável. Não é o que eu queria fazer hoje, ou em qualquer dia da minha vida.

Vejo algumas silhuetas ao fim do corredor com o canto dos olhos e ao olhar com atenção, noto que o Dr. Wagno chegou. Parece que a temperatura da recepção caiu uns cinco graus e sinto uma pressão no peito como se tivesse mergulhado em águas frias e profundas.

Meu pai se levanta mesmo faltando muitos passos para que o Dr. Wagno chegue até nós e vai de encontro a ele, cumprimentando-o com um aperto de mão. O eco que o lugar produz, me faz entender algumas palavras que eles pensam estar sussurrando.

— Eu tentei impedí-la, Wagno — justifica meu pai. — Mas a Karen é muito teimosa.

— Tudo bem — o advogado responde. — Talvez seja até interessante ver como ele vai dirigir esse depoimento.

Alguns segundos após meu pai e o Dr. Wagno irem até o balcão da recepção, uma policial faz um aceno de cabeça indicando que já podemos ir. Mamãe segura em minha mão antes que eu me levante.

— Vou estar aqui se precisar de mim, filha — ela diz e me abraça forte enquanto eu tento conter meu medo e as lágrimas presas em mim.

Retribuo o abraço da minha mãe sem dizer uma palavra e em seguida, sigo a policial que conduz a Kássia e meu advogado por um corredor. O mesmo corredor que há uma semana, eu estava caminhando com o Douglas. Naquele dia, eu achei que estava tomando uma decisão que seria capaz de nos proteger e dar tranquilidade até o dia em que aquele pesadelo teria fim, mas foi a primeira decisão que fez nossas vidas declinarem.

Ao chegar da porta, me deparo com o Delegado Da Matta de pé me aguardando. Ele dá espaço para que nós entremos e após me sentar em meu lugar, de frente para o seu posto, ele pronuncia suas primeiras palavras.

— Dra. Karen, antes de mais nada, eu gostaria de dizer que lamento muito pelo que aconteceu. O Douglas trabalhava comigo há muitos anos... — ele diz em um suspiro profundo que não me comove, mas traz à minha superfície uma revolta que eu me esforço para conter. — Enfim, é uma grande perda para a nossa corporação também.

— Obrigada — falo sem mudar meu semblante.

— Algumas das perguntas que eu farei, a senhora e o Douglas já me responderam, mas será necessário refazê-las para termos um depoimento mais completo e conclusivo. Tudo bem?

O que restou de um coração Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora