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Existem momentos em nossas vidas que parecem que vão ser os últimos

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Existem momentos em nossas vidas que parecem que vão ser os últimos. Não só parecem, mas pedem por isso. Nosso corpo e nossa alma, parecem não ter espaço para acomodar mais um momento ruim. Eu passei por um momento desses. Foi ontem à noite quando vi todas aquelas barbaridades sendo exibidas na TV. Eu não deveria ter assumido a clínica ou lugar da minha mãe lá. As consequências das minhas péssimas escolhas mancharam o patrimônio construído e cultivado desde antes da minha existência. Eu destruí o legado médico deles e transformei a conquista de tantos anos em um fracasso total. Me senti um lixo, sozinha, um peso. Um estorvo até para mim mesma e isso se uniu a todo o resto. À culpa, à tristeza, à saudade insaciável do Douglas. Me senti sufocada, submersa em lembranças de momentos que jamais voltarão.

Em meio a tudo isso, todos estavam esperando que eu seguisse em frente. Mas como? Sempre que estava sozinha, uma melodia triste tocava no fundo da minha alma e uma dança imaginária se iniciava. Eu dava um passo para frente e minhas lembranças me faziam dar dois para trás. Metade de mim parou no caminho e me senti dividida entre insistir e desistir. Então, olhei para a pedra solitária em meu dedo e me lembrei que em alguns meses, Douglas e eu teríamos nos casado. Teríamos trocado nossos votos e jurado nos amar até que a morte nos separasse. Teria sido um juramento em vão, pois a morte nos separou e eu continuo amando-o.

Nos breves momentos em que eu conseguia dormir, tinha flashes do sorriso dele e eles iluminavam as minhas noites. Vê-lo em meus sonhos era o que alimentava minha vontade de fechar os olhos e encontrá-lo do outro lado.

Mas e se não houver outro lado? — pensei por um instante, mas eu já havia tomado alguns comprimidos. Eu poderia ter parado, tentado regorgitar, mas algo me impulsionou; a possibilidade, o talvez. Eu revivi toda a minha vida em cinco minutos. Ri de todas as coisas engraçadas que já me aconteceram e chorei por tudo o que a vida me tirou, que o Alejandro me tirou. Eu decidi não viver mais, mas ainda existo.

Faz algumas horas que o Daniel foi embora. Daquele momento até agora, eu fiquei me colocando no lugar dos meus pais quando receberam a notícia de como fui encontrada no apartamento deles. Isso foi cruel demais. São cerca de sete da manhã e imagino que eles mal dormiram durante essa noite.

— Karen — meu pai começa a falar atraindo os olhares da minha mãe e dos meus amigos —, talvez não seja o melhor momento para falar sobre isso, mas acho que a amiga de um amigo pode te ajudar nesse momento.

— Ah, não, pai — digo sem paciência.

— Olivier — mamãe intervém —, depois vocês conversam sobre isso.

— Tudo bem, mas acho que você vai gostar. O nome dela é Juliana Godoy e...

— Pai, acho que você e a mamãe também precisam descansar — falo ignorando sua sugestão de ir até essa "amiga de um amigo", psicóloga, acredito eu. Ele respira fundo esfregando as palmas das mãos na calça jeans. Mamãe parece intrigada com o que acabei de dizer.

O que restou de um coração Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora