Ver aquele cômodo vazio virar o quartinho da minha filha teve até um clima de festa. No final, estávamos todos exaustos, tanto pelo trabalho na montagem e arrumação dos móveis, como pela quantidade de pizza que comemos. Nem preciso dizer o quanto o meu joelho doeu e latejou no meio da madrugada. Ainda quero voltar às compras durante a semana porque preciso comprar mais roupinhas, fraldas e acessórios, só não comentei com a Paola, senão ela vai querer abusar do poder de madrinha e pagar tudo mais uma vez.
Apesar da dor no joelho, foi uma noite bem dormida. Uma parte daquelas preocupações ainda ronda minha mente, pois eu não sou de ferro. Seria até egoísmo eu não pensar na Dona Ana, só não tenho o que fazer a não ser pedir a Deus que seus dias sejam prolongados para que ela aguente firme até a volta do Douglas, ou que ele volte a qualquer momento, por ela, pelo menos.Esbarrar nos móveis é algo da minha rotina agora. Uma casa diferente, com coisas em lugares que ainda não me acostumei. Não é muito diferente de antes, já que meu equilíbrio nasceu e morreu num estúdio de ballet. Fora do estúdio, eu sempre tive dois pés esquerdos, o que eu não entendo até hoje. Minha falta de coordenação nos pés já me colocou em muitas enrascadas, porém, minha meta agora é correr de tombos. Bom, não ao pé da letra, senão vou cair de qualquer jeito.
Esses últimos três dias têm sido um pouco solitários para mim. Eu estava acostumada a estar sempre na companhia da minha mãe e do meu pai, então agora, mesmo que minha mãe, a Paola ou o Wesley me visitem, eu sinto falta de uma companhia, pois em um determinado momento todos vão embora e eu fico sozinha de novo. Eu queria dizer que não sei bem o porquê de eu me sentir assim, mas eu sei. Não é porque eu fiquei um bom tempo sem morar sozinha, é porque eu estou gerando uma vida sozinha. Nunca passou pela minha cabeça que eu seria mãe solteira; que seria deixada; que teria que enfrentar isso sozinha. Era para sermos uma família. Mas tudo bem, eu vou conseguir. Quem tem amigos e família, tem tudo.
Minha mãe ligou ontem à noite perguntando se poderia passar o domingo comigo. Ela nem precisaria perguntar. Dei uma bronca pela pergunta e exigi ser surpreendida pela presença dela várias vezes na semana, desde que não traga meu pai. Ela bufou de forma bem evidente ao telefone me lembrando de que nem ela quer mais a presença dele. Isso chegou a doer no meu peito. São trinta e oito anos de casamento para serem rompidos desta forma. Porém, a culpa é dele.
A passos lentos, caminho em direção à porta quando ouço a campainha tocar. Ainda são 10h da manhã e isso é ótimo. Terei ajuda da minha mãe para cozinhar. Abro a porta e perco o fôlego quando vejo não só minha mãe, mas a Kássia também.
— Você tá gerando um novo planeta? — minha irmã pergunta e solta uma gargalhada que eu abafo com um abraço apertado.
— Surpresa!!! — diz mamãe sorrindo.
— Quando você chegou, sua doida? — questiono em êxtase pela presença dela.
— Ontem à noite, mas já era bem tarde.
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O que restou de um coração Livro 2
ChickLitMuitas coisas poderiam ter sido evitadas. Karen poderia não ter revelado tudo o que descobriu à polícia; poderia ter fugido enquanto havia tempo; poderia não ter saído sozinha e ser surpreendida pelo seu pior pesadelo, mas ela tomou as piores decisõ...