Capítulo XXI - Apócrifos

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"1. E aconteceu depois que os filhos dos homens se multiplicaram naqueles dias, nasceram-lhe filhas, elegantes e belas.

2. E quando os anjos, os filhos dos céus, viram-nas, enamoraram-se delas, dizendo uns para os outros: Vinde, selecionemos para nós mesmos esposas da progênie dos homens, e geremos filhos.

10. Então eles tomaram esposas, cada um escolhendo por si mesmo; as quais eles começaram a abordar, e com as quais eles coabitaram, ensinando-lhes sortilégios, encantamentos, e a divisão de raízes e árvores.

11. E as mulheres conceberam e geraram gigantes.

12. Cuja estatura era de trezentos cúbitos".

Olhei o senhor Lucien com estranheza, não entendia direito o que significava aquela história. Então existiram gigantes de verdade? Homens e mulheres bem grandes?

— É verdade o que está escrito aqui senhor Lucien? — Perguntei, colocando o livro em cima da bancada e balançando os pés suspensos enquanto estava sentado na poltrona vermelha.

— Sobre o que pequeno? — O senhor Lucien estava tentando pegar um velho livro numa das estantes da sua gigante sala de livros.

O corredor era estreito e o corpo fofinho do homem de barba branca e óculos redondos tinha dificuldades de acessar.

— Sobre os gigantes — Falei, correndo e passando por baixo de suas pernas, pegando o livro que ele procurava — Eles existem?

— O que está lendo desta vez pequeno? João e o pé de feijão?

— Esse é livro para crianças senhor Lucien, estou vendo este — Virei a capa para o barrigudo.
— Ahh, então o nosso pequeno homem está falando dos nefilins do livro apócrifo de Enoque — Ele sentou na poltrona em frente à minha, ela rangeu, acho que pelo peso.

— Apócrifo? — Fiquei confuso, nunca escutei aquela palavra antes — O que significa?

— Deixe me ver — O velhinho fez uma careta — Digamos que é quando alguém escreve alguma coisa que outras não reconhecem como verdade.

— Uma mentira? — Mamãe disse que mentir é feio.

— Não necessariamente, as pessoas tem dificuldades em entender algumas coisas, e talvez por isso achem mais fácil dizer que é uma mentira do que assumir que não sabem.

— Então os gigantes são uma mentira? Por que alguém escreveria uma mentira? O padre disse que a única verdade está na bíblia e que eu tenho que parar de ler essas coisas do demônio.

— Tudo depende do que você acredita pequeno, se acreditar que gigantes existem, então eles existem. Só me promete uma coisa, não conte ao padre que você leu este livro.

— Por que? Por que é uma mentira? Para mim parece muita verdade.

O senhor Lucien voltou a fazer caretas.

— Só prometa — Disse.

— Prometo! — Coloquei as mãos para trás.

— Sem dedos cruzados — Falou o gordinho.

— Está bem! — Mostrei as palmas das mãos — Prometo!

Fiquei por um tempo pensando, então veio outra dúvida.

— Você acredita em gigantes senhor Lucien? Acredita na pessoa que escreveu este livro?

— É justamente neste ponto que os livros são tão fantásticos pequenino. Não existem verdades ou mentiras quando falamos deste universo, são simplesmente histórias, e quando digo "simplesmente" não é no sentido de torná-las inferiores, mas sim, de dizer que um conto, um mito, um romance, uma aventura contada nestas páginas de papéis estão acima de qualquer verdade ou mentira. Desde o início da civilização, os homens são contadores de histórias, foi, e é o meio mais fácil e prático de transferir o conhecimento e as experiências ao longo dos séculos. Um livro é um mundo ainda não descoberto, e ele se torna cada vez mais real quando quem lê acredita nele. Por isso, jamais julgue as crenças de uma pessoa, lobisomens, vampiros e gigantes existirão enquanto você acreditar neles.

— Então eu posso acreditar no apócrifo?

— Claro que sim! E no que mais você quiser.

Me levantei e corri até uma das prateleiras de livros, procurei, procurei e procurei.
— Está atrás do que rapazinho?

Continuei procurando.

— Estou aqui a muito tempo, e conheço cada parte desta sala, sei exatamente onde está cada história, cada autor e talvez até em que parte o livro está separado. Acho que posso ajudá-lo se estiver procurando algo em especial — O senhor Lucien se levantou e caminhou a passos bem lentos até onde eu estava.

— Você falou que os livros não mentem, nem falam a verdade, e que podemos acreditar em qualquer coisa — Falei.

— Exato!

— Então quero saber tudo que já viram e escreveram, se houve gigantes, acho que tem outros seres ainda mais legais — Estava empolgado em descobrir mais seres.

— E o que acha de anões, elfos, dragões e hobbits? — Sugeriu o dono da casa, indo até uma estante, agachando-se e puxando um livro.

— Hobb... o que?

— Hobbits! Acho que vai gostar deles, são pequenos igual você, e bem corajosos e espertos também.

Peguei na mão um livro bem grande e pesado, tinha uma capa apagada, com um círculo amarelo no meio.

O senhor dos anéis. 

Apócrifos - A porta dos onze fechosOnde histórias criam vida. Descubra agora