Capítulo XIII - Destino

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Desde que fui pego por este filho da puta, esperei por um longo período de tempo, muitas coisas ruins aconteceram, e ainda acontecem às vezes, mas jamais perdi a esperança.

Voltar na igreja em que fui criado passados oito anos e ver o memorial de todas as vítimas do incêndio foi um dos piores momentos da minha vida. A história da pequena igreja de Riverside logo se espalhou por toda a cidade, a imagem arruinada do merda do padre John foi a única coisa que pude aproveitar em tudo aquilo, algumas mulheres fugiram e foram presas pelos seus crimes passados, mas minha mãe nunca pôde me acompanhar em nossa nova "casa".

Os sorvetes e chocolates juntos com o final feliz não se concretizaram, pelo contrário, encontrei outros "presentes" com o maldito Andrew.

Mas eu era uma criança, o que poderia fazer?

Lembro da primeira vez que o encontrei, a mesma descrição e características que minha mãe havia falado, após dizer seu nome, simplesmente entramos no carro e fomos para algum lugar muito longe da comunidade.

De início, fiquei impressionado com a imensidão de livros que havia na casa, uma quantidade ainda maior que a do senhor Lucien, demorei um tempo até entender que o conteúdo daquelas obras era bem diferente das que tive acesso até então.

De todos os livros, um se destacava em cima de uma mesa reforçada quadrada de madeira, ficava no meio da biblioteca, uma capa preta, aparentando ser muito antigo, com as folhas bem amareladas, intitulado Nigrum, foi o primeiro objeto que toquei na casa.

Em seguida, fui logo advertido pelo homem barbudo que deu um tapa em minha mão, falando que aquilo não era uma simples história, era a evolução do ser humano, então não deveria ser tocada de forma despretensiosa.

O senso de curiosidade me fez querer ainda mais ler o conteúdo, porém, não tive muito tempo para fazê-lo, muito menos para perguntar sobre o sorvete que minha mãe havia prometido.
O desgraçado me virou para ele, segurando minha mão, olhos negros, vidrados em mim, e disse:

— Vamos nos divertir muito.

Abaixou suas calças e deixou lá bem na minha frente, a porra daquele pau murcho, queria que eu o tocasse.

Tentei correr.

Não consegui ir muito longe.

Logo, estava sendo forçado a manter aquela bosta na minha boca.

Claro que não parou por ali.

Não satisfeito, ainda teve que comer o cú de uma criança de sete anos.

Maldito pedófilo filho da puta.

O que eu podia fazer?

Não tinha forças para nada.

Apenas chorar.

Lamentar.

Por que mamãe?

Nos anos iniciais, apenas chorei por muitos dias, esperando o momento que ela chegaria e seriamos felizes de novo.

Sempre tive esperanças de vê-la atravessar a porta, correndo para me dar um abraço.

Isso não aconteceu.

Pensei diversas vezes em fugir para qualquer lugar, mas e se ela voltasse? A esperança superava o medo e a dor, eu prometi que ia fazer exatamente o que ela pediu, iria esperá-la.

Iria esperá-la para sempre se fosse necessário.

Com isso, resolvi aproveitar meu tempo da melhor maneira possível, me desenvolvendo, aprendendo com toda literatura que estivesse disponível.

Seria o escritor que prometi a ela.

Tornando-a eterna em minhas histórias.

Já mais velho, descobri os fundamentos ocultistas de Andrew, que aos poucos foi me ensinando suas vertentes.

Alquimia.

Astrologia.

Cabala.

Telepatia.

Me envolvi com muitos de seus conteúdos, usando aquela realidade, para sobrepor as marcas que a vida tinha me deixado. Comecei a escrever meus primeiros textos com personagens fantásticos, seres com habilidades não explicadas pela ciência.

Anjos, demônios e pessoas dispostas a ajudar no fim do mundo, não ficou tão bom quanto esperava, o batizei de "Seven Skies", e dedicava meu tempo a construi-lo.

Havia apenas um tema que Andrew não compartilhava com ninguém.

O Nigrum.

Se esquivava ou repreendia com fervor todas as perguntas que fazia sobre o misterioso livro de capa preta.

Passou-se anos até o dia de hoje.

Ele estava sentado na velha cadeira de balanço, em frente a lareira, se sacudindo para frente e para trás, com o olhar fixo no fogo, como se procurasse sua alma em meio as labaredas e faíscas.

O vi se tornar possesso pela escritura, a ponto de abandonar todos seus hábitos higiênicos, desejos e aspirações. Ficava pelos cantos da casa repetindo palavras, frases sussurradas, passou a conversar com seres que dizia ver em outra frequência.

Não demorou muito até que o livro o corrompesse por inteiro.

Cada vez mais decadente, vi o fim de uma criatura desprezível.

— Edgar? Você ainda está aí? — Ele me chamou, não movendo a cabeça para trás a fim de me procurar. Continuou observando o fogo a sua frente.

Me aproximei, ficando em pé ao seu lado, também olhando a lareira.

— Não sou uma pessoa que você deveria ouvir, fiz mal a você, coisas de que não me orgulho. Demorei para entender que nossos atos intrínsecos na existência são o que impedem de transcender, mas você é diferente. Sua mãe havia me dito que não era qualquer menino, hoje já um jovem, continua a surpreender com sua inteligência.

Aproveitei seu aparente últimos momentos de vida, para perguntar algo que guardei muito tempo.

— Por que ela me entregou a você?

— Por que Geórgia não teve outra opção. Eu era a única pessoa que ela podia pedir ajuda, mesmo contrariada, imaginou que essa fosse sua melhor chance, e talvez tenha acreditado que conseguiria escapar da morte e da prisão para chegar até você.

Lembrar dela fazia lágrimas caírem involuntariamente, mesmo minha mãe dizendo que homens não devem chorar.

— Quem é você?

— Seu pai.

Mesmo desconfiando, e não querendo acreditar, sabia no fundo que aquilo era verdade.

Meus punhos se cerraram, as unhas furando a palma das mãos, abaixei a cabeça e virei para o lado oposto de seu rosto, enquanto não conseguia conter o choro, tentando engoli-lo para não demonstrar fraqueza.

— Sei o quão desprezível isto parece Edgar, mas não se apegue a este exemplo de vida, o destino muitas vezes é injusto conosco, nos fazendo cometer erros para concluir nossa caminhada arrependidos do que passamos. Sua mãe poderia ter inúmeros defeitos, mas sei que ela te amava muito.

Permaneci em silêncio.

— Se me permitir lhe dar um único conselho antes de partir, por que sei que não tenho muito tempo neste plano, gostaria de adverti-lo sobre o Nigrum.
Voltei minha face ainda úmida para ele, a íris dos olhos dele já estavam embranquecidas e dilatadas, não tinha mais visão.

O livro estava em suas mãos.

— Jamais o abra, jamais o toque e muito menos o leia. A humanidade não está preparada para as revelações desta escritura. E ela irá acabar com tudo se descoberta.

As mãos cansadas que antes apertavam o livro, agora se afrouxaram e foi quase possível ver a alma saindo do corpo.

— Não leia Edg...

Morto. 

Apócrifos - A porta dos onze fechosOnde histórias criam vida. Descubra agora