Capítulo XV - Entrevista

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A sala do entrevistador e dono do lugar era muito luxuosa, cinco estantes preenchidas por completo com livros, alguns de medicina e muito outros de literatura clássica e ficção. Um diploma emoldurado e objetos de ouro postos sob a mesa, eram figuras de personagens de histórias. A mobília impecável, limpa e com materiais de primeira qualidade.

— Por favor, Edgar, sente-se — Disse, tomando seu lugar na cadeira do outro lado da mesa.

Sentei, tentando esboçar um sorriso, não sei se parecia muito convincente.

— Como foi o passeio até aqui? — Perguntou.

— Tranquilo Sr. Brown — Afirmei.

— Por favor, pode me chamar de Harold.

— Foi bem interessante Harold — Disse, reforçando seu pedido.

— Deixe-me apresentar antes que continuemos com nossa prazerosa conversa. Sou o doutor Harold Brown, especialista em psiquiatria evolutiva e proprietário deste lugar, que foi fundado setenta anos atrás pelo meu falecido pai para ajudar pessoas com distúrbios mentais a se recuperar, reabilitando-as e permitindo que retornem a suas vidas normalmente.

Balancei a cabeça e ergui as sobrancelhas em admiração.

— Como deve ter lido, estamos precisando de ajudantes para auxiliar-nos nas operações diárias do complexo, muitas vezes por falta de conhecimento, as pessoas temem o ambiente deste tipo de lugar, o que dificulta a contratação de alguém. Você tem algum tipo de problema com hospícios? Como algumas pessoas erroneamente nomeiam esta casa.

— Não Sr. Brow... quero dizer, não Harold. Não tenho problemas com nenhum tipo de ambiente, sou muito flexível com relação a isto.

— Excelente! Parece um jovem muito especial, conte-me um pouco sobre você.

— É... sou Edgar, tenho 22 anos e moro numa residência próxima, onde não sei se conheceu, morava o falecido Andrew. Trabalhei em alguns comércios da região também auxiliando em suas atividades do dia-a-dia, seja limpando, controlando estoque ou o que mais fosse necessário.

Não sabia muito bem o que dizer, nunca participei de uma entrevista antes, nos trabalhos anteriores, era simplesmente responder com sim quando alguém oferecia um trabalho.
Ele passou a mão no cabelo bem penteado, e ajustou os óculos redondos antes de prosseguir.
Imitei o gesto para gerar empatia, li que essa é uma linguagem corporal forte quando quer que alguém se simpatize.

— Legal, e o que gosta de fazer no tempo livre Edgar?

— Sou uma pessoa bem reservada, então geralmente estou em casa lendo ou escrevendo. Gosto muito de literatura.

— Sério? Isso é ótimo! Fico feliz em ver jovens que ainda admiram e praticam hábitos tão saudáveis como este. Você diz que escreve? Sobre o que gosta de escrever?

— Ainda é apenas um hobby, sou um completo amador, não sei nem se posso dizer que escrevo mesmo, mas a maioria são histórias que envolvem suspense, mistério, drama e às vezes um pouco de fantasia.

— Adoraria ler qualquer uma delas uma hora. São meus generos favoritos.

— Não disponibilizei para ninguém, sabe, não estão revisadas e são apenas ideias.

— Não seja tímido! Talvez eu possa ajudá-lo com sugestões.

— Seria ótimo — Falei, me perguntando se estava indo bem na "entrevista", que parecia mais uma conversa normal.

— Bom, com relação ao salário, tem algum valor em mente?

— Sendo honesto senhor Harold, preciso muito do emprego, e não tenho muita ambição com relação ao quanto pretendem me pagar, preciso do dinheiro apenas para me manter basicamente, como disse, gosto de ler e escrever, e fico feliz em minha vida apenas fazendo isto, praticando, para se tornar alguém respeitável um dia.

— Vejo que fala com muito afinco sobre a escrita, parece que defende este seu sonho e desejo, isto é muito bom. Pessoas com essa característica chegam longe em suas vidas, há algum motivo especifico para ter optado pela carreira de escritor? Se a pergunta for muito particular, não se sinta pressionado a responder.

— Fiz uma promessa a minha mãe de que escreveria uma história bonita onde poderíamos viver como num conto de fadas. Com o tempo, ela faleceu, a vontade de criar algo notável aumentou, e vi que precisaria contar uma história que atingisse as portas do céu para que ela pudesse ver onde o filho dela chegou.

Só depois que estufei o peito para falar sobre minha mãe que pude perceber o quanto curvado estava na poltrona.

— Me parece uma causa muito nobre e louvável, se concordar com o salário de R$ 1500,00, e a carga horária de segunda a sexta das 07:30 h às 17:30 h, não vejo o porquê não o contratar.
— Estou de acordo senhor, seria ótimo e um prazer trabalhar aqui — Respondi, tentando conter a euforia.

— Então está combinado, você pode começar na próxima segunda — Ele estendeu a mão para selarmos o acordo.

A apertei com muito orgulho.

— Muito obrigado senhor.

— Há mais uma coisa que gostaria de dizer antes de ir. Como um grande fã de literatura, admiro seu sonho, e gostaria de colaborar com ele. Se quiser, fique à vontade para usar a biblioteca do complexo, que é muito rica, o momento que desejar, seja durante o expediente ou após ele.

Tudo parecia ir tão bem, que era difícil acreditar.

— Seria incrível senhor Harold.

— E se conseguir criar coragem para me mostrar suas histórias, sabe onde me encontrar.

— Sim! Agradeço novamente.

Quando cruzei a porta não consegui esconder o sorriso que dava para ser visto de costas.

Eu tinha conseguido o emprego no Harold Brown Asylum. 

Apócrifos - A porta dos onze fechosOnde histórias criam vida. Descubra agora