Capítulo 1

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Paulo

Despertador tocando é sinal que minha mãe ainda não levantou. Ótimo! Não sei porque ela sempre se levanta junto comigo. Ela já não tem a mesma idade de antes, ainda mais depois que o filho da puta do meu pai nos deixou.

Saio devagar da cama e me arrumo. Meu irmão ainda dorme na cama ao lado, para variar, preciso acorda-lo. Nunca vi, o Henrique tem sério problemas em acordar cedo.

Chamo três vezes e ele acorda. Aviso que a mãe está dormindo e que ele precisa se arrumar para a escola. O Henrique tem 17 anos, dois a menos que eu. Mas, ainda estuda. Não o deixei largar a escola como fiz. Não era o certo.

Henrique me olha meio torto, como todo adolescente ele é meio rebelde. E já falei com ele muitas vezes que a maior revolução do pobre é estudar. Mas, ele sempre quer ter tudo. Meu maior medo é que ele se envolva com o tráfico. Na escola pública onde ele estuda e eu estudei, muitos colegas estão saindo de lá para isso.

Além de ser revoltado sem causa, ele me culpa pelo fim do casamento dos nossos pais. Tudo isso, porque o cretino do nosso pai, traia a nossa mãe, mas alegou quando ela o pegou na rua de cima com a piranha da Dolores que tudo era culpa minha. Mais especificamente culpa da minha sexualidade.

Sim, meus digníssimo pai nunca aceitou o fato que eu sou gay. E quando eu contei para a família, ele fez um escândalo e nunca mais me olhou.

Na época, eu tinha 15 anos e o Henrique 13. A traição do meu pai foi em menos de um ano. Claramente, minha mãe sabia que era mentira, pois, o senhor Adolfo já há tinha traído antes.

Henrique termina de se arrumar e saímos, sei que ele não gosta de quando o levo até a escola. Mas, não vou deixá-lo ir sozinho. Ainda mais porque precisamos passar pela rua da quebrada para ele ir para escola. E de manhã, ainda tem alguns estranhos.

Nunca mexeram com nenhum de nós, somos nascidos e crescidos do bairro. Porém, melhor ficar de olho. O Henrique tem uma cabeça foi avoada.

O deixo na porta da escola e ele me olha com cara feia, o vejo correr para os seus amigos, o Marcinho e o Joca. Conheço ambos desde pequenos. Eles me dão um tchau e eu retribuo.

Sigo para meu trabalho. Trabalho no centro do Rio de Janeiro numa livraria. Admito que amo meu trabalho, pois vivo rodeado de livros. Mas, pegar dois metros até lá é tenso.

Depois de muita bagunça, horas em pé no metro, finalmente chego a livraria. Amo aquele lugar. Além da livraria tem um lanchonete onde servimos café, ou seja, um local agradável.

Entro correndo, a Jessica já está no balcão. Ela é a dona do local, mas sempre a primeira a chegar. Além de minha chefe é minha amiga. Foi a única que me deu uma chance quando comecei a trabalhar quando tinha feito 17 anos.

Sem pai em casa para ajudar e com minha mãe doente e sem forças para poder trabalhar, não tinha como, eu precisei ajudar.

_ Chegou no horário hoje, caiu da cama foi?

_ Ah Jessica, hoje o despertador tocou. Aquele relógio é doido.

_ Já falei que você precisa arrumar outro despertador. Mas fica usando aquele, isso tudo porque foi presente daquele idiota do Marcos ne?

Ihh sabia que ela ia falar do Marcos, o Marcos foi meu melhor amigo e também o menino que eu amei. Claramente, quando ele soube que eu sou gay me deu um soco e me mandou sumir da vida dele. Ironicamente, ele que sumiu, a última notícia que tive dele foi que ele foi preso em uma batida.

_ Aí, ainda é 8 da manhã, vamos parar de falar coisa chata.

_ Tudo bem, mas você precisa me prometer que vai seguir sua vida e encontrar um garoto lindo, gostoso e que dê preferência transe bem.

Morro de vergonha, a Jessica sempre fala na lata o que pensa. Eu amo, mas fico que nem um pimentão.

_ Ah, e Paulo, você viu que hoje de tarde vai ter aquela amostra de profissão na PUC. Bem que você podia ir. Não é você que vive dizendo que quer fazer Direito?

Realmente, eu tinha visto o anúncio nos folhetos que deixaram na livraria, mas como eu iria? A PUC ficava há uma hora da livraria e se eu fosse teria que gastar o que não tinha.

_ Seria legal, mas eu vou dobrar hoje. Esqueceu que semana passada tive que sair mais cedo porque mãe teve outra consulta e também não teria como ir. Só estou com dinheiro para a volta para casa.

Jessica me olha por um instante, ela sabe a dificuldade que é manter as coisas lá em casa e por mais de uma vez já ofereceu ajuda. Só que recuso, aceitei apenas uma vez quando não tínhamos o que comer.

_ Eu sei que você não gosta, mas hoje de tarde a Janaina vem trabalhar também, ela vai adiantar porque sábado irá encontrar com o amor dela, então você pode ir. E quanto a como ir, acontece que fui convidado para dar uma palestra na turma de serviço social. Você vai comigo.

Eu sabia que ela tinha planejado tudo, mas como eu realmente quero ir. Aceitei. O que podia acontecer de novo naquela amostra? Pelo menos veria e entenderia mais sobre o curso de Direito.

Duas Metades (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora